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quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Notícias STF

As seguintes notícias foram publicadas no sítio do STF na data de 27/02/2008, quarta-feira:
19:44 - STF mantém proibição à NKR Agropecuária de explorar imóveis em área de parque nacional à beira do Rio Paraná
19:44 - Agenda da presidente do STF, ministra Ellen Gracie, para quinta-feira
19:30 - Confira a pauta de julgamentos previstos para a sessão plenária desta quinta-feira (28)
19:34 - Plenário referenda liminar e mantém suspensa parte da Lei de Imprensa
18:32 - Ampliação da competência trabalhista em debate na Rádio Justiça
18:16 - STF mantém suspensa parte da Lei de Imprensa
17:42 - Ministro arquiva MS de empresário investigado pela CPI do Apagão Aéreo
17:34 - Liminar mantém promoções de servidores do judiciário no Piauí
16:58 - Candidato aponta irregularidade em regras de concurso público para juiz substituto no Piauí
15:12 - Novela da Rádio Justiça trata das relações de consumo
08:35 - Arquivado HC em que acusado de associação para o tráfico alegava ausência de ampla defesa
08:32 - Plenário analisa nesta quarta-feira liminar que suspendeu processos sobre a Lei de Imprensa

Informativo 345 STJ

Informativo Nº: 0345 Período: 18 a 22 de fevereiro de 2008.
As notas aqui divulgadas foram colhidas nas sessões de julgamento e elaboradas pela Assessoria das Comissões Permanentes de Ministros, não consistindo em repositórios oficiais da jurisprudência deste Tribunal.
Corte Especial
ANISTIA. CONFIGURAÇÃO. DISSÍDIO.
A Corte Especial negou provimento ao agravo regimental reiterando que o decisório embargado examinou caso submisso à Lei n. 9.140/1995, que reconheceu como mortas e desaparecidas, no período de 2/9/1961 a 5/10/1998, pessoas cujos nomes constavam de uma lista anexa à citada lei, bem como que, só com o reconhecimento oficial da morte dessas pessoas desaparecidas durante a ditadura militar, surgiu o direito de postular indenização, contando-se a prescrição a partir da citada lei. Por outro lado, o paradigma colacionado, a seu turno, examinou um caso de pensão por morte (não de indenização) à luz do art. 8º do ADCT, não cuidando, em nenhum momento, da Lei n. 9.140/1995, nem mesmo a agravante levantou a questão da prescrição. Assim, não há a divergência apontada. AgRg nos EREsp 651.512-GO, Rel. Min. José Delgado, julgado em 20/2/2008.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA ALIMENTAR.
A Corte Especial, ao prosseguir o julgamento, por maioria, acolheu os embargos, declarando a natureza alimentar dos honorários advocatícios, inclusive daqueles provenientes da sucumbência. EREsp 706.331-PR, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgados em 20/2/2008.
Segunda Turma
CORTE. ENERGIA ELÉTRICA. INADIMPLEMENTO. AGÊNCIAS. INSS.
A Turma entendeu que o corte no fornecimento de energia elétrica, quando se trata de pessoa jurídica de direito público, é indevido apenas nas unidades cujo funcionamento não pode ser interrompido, como hospitais, prontos-socorros, centros de saúde, escolas e creches. No caso, trata-se de agências do INSS localizadas no Estado do Rio de Janeiro, que estão com atraso no pagamento das contas de energia elétrica. Assim, a Turma deu provimento ao recurso para que a recorrente tenha possibilidade de cortar o fornecimento de energia elétrica em caso de inadimplemento do usuário. REsp 848.784-RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 9/2/2008.
COFINS. PRESCRIÇÃO. IMPUTAÇÃO. PAGAMENTO. COMPENSAÇÃO.
A Turma reiterou o entendimento de que, quando o tributo está sujeito ao “autolançamento”, o Fisco pode homologá-lo expressa ou tacitamente. Não estipulado pela lei um prazo para homologação, ela será de até cinco anos, tendo como termo a quo a ocorrência do fato gerador (art. 150, § 4º, CTN). A extinção do crédito tributário ocorrerá não com o pagamento antecipado, mas com a homologação e, a partir daí, fluirá o prazo de cinco anos para a prescrição (art. 168, I, CTN). Quanto à questão da imputação de pagamento, a Min. Relatora asseverou que essa não pode ser aplicada, pois é própria do Direito Civil e só poderia ser aplicada em matéria tributária se houvesse lei especial autorizadora. Os precedentes do STJ (REsp 951.608-SC, DJ 29/8/2007, e REsp 665.871-SC, DJ 19/12/2005) que afirmam ser pertinente imputar-se o pagamento conforme as regras do Código Civil aos precatórios não servem como paradigmas, pois não se confunde a imputação de pagamento para efeito de precatório com a imputação de pagamento em matéria de compensação, como é o caso abordado. Assim, a Turma determinou que se proceda à compensação, conforme o art. 74 da Lei n. 9.430/1996, com a redação dada pelas leis posteriores. Precedentes citados: REsp 206.503-SP, DJ 2/8/1999; EREsp 435.835-SC, DJ 26/10/2006; EREsp 644.736-PE, DJ 30/5/2005; REsp 905.337-SP, DJ 24/9/2007, e REsp 968.717-SP, DJ 22/10/2007. REsp 987.943-SC, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 19/2/2008.
Terceira Turma
ADMINISTRADOR. CONSTRIÇÃO ILEGAL. BENS.
O recorrente impetrou mandado de segurança contra a decisão do TJ-RS que determinou a indisponibilidade de bens do impetrante na qualidade de membro da administração da empresa falida. No mérito, pugnou pela inaplicabilidade do art. 36 da Lei n. 6.024/1974 ao argumento de que não era mais, ao tempo da quebra, administrador da falida. Inicialmente, a Min. Relatora verificou que o recorrente não era, à época da liquidação extrajudicial decretada pelo Bacen, administrador da empresa falida. Observou, também, que o recorrente não se enquadra na hipótese prevista no art. 36 da mencionada lei, que dispõe sobre a indisponibilidade dos bens dos administradores das instituições financeiras em intervenção, em liquidação extrajudicial ou em falência, tendo em vista que se retirou da sociedade no mês de novembro de 1998, e a liquidação foi decretada em 28/3/2001, evidenciando-se, assim, o lapso temporal de 28 meses. O § 1º do art. 36 da Lei n. 6.024/1974 estabelece que a indisponibilidade prevista no caput atinge apenas aqueles que estiveram no exercício de suas funções sob intervenção nos doze meses anteriores ao ato que decretou a intervenção, a liquidação ou a falência. Assim, cotejando-se os fatos apresentados aos comandos legais anteriormente declinados, vê-se a incongruência entre a hipótese legal e a moldura fática, o que desautoriza a constrição aplicada aos bens do recorrente. Acrescentou a Min. Relatora que o acórdão recorrido transbordou os limites legais impostos para a análise de mandado de segurança, ao adentrar na seara do direito material perquirido. Isso posto, a Turma, ao prosseguir na renovação do julgamento, por maioria, conheceu do recurso e lhe deu provimento para reformar o acórdão recorrido, concedendo a ordem para determinar o levantamento da constrição efetuada sobre os bens do recorrente. RMS 16.880-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/2/2008.

FRAUDE. EXECUÇÃO. CIÊNCIA. AÇÕES.
A questão consiste em saber se a pendência de ação de conhecimento da qual possa decorrer a insolvência do devedor é abrangida pela hipótese prevista no art. 593, II, do CPC. A Min. Relatora ressaltou que a incidência do disposto no mencionado artigo não é automática, isto é, decorrente apenas da alienação na pendência de demanda capaz de reduzir o alienante à insolvência. E, segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal, ficou esclarecido que, para existir fraude à execução, é preciso que a alienação do bem tenha ocorrido após registrada a citação válida do devedor ou, então, que o credor prove o conhecimento do adquirente sobre a existência da demanda pendente contra o alienante ao tempo da aquisição (precedente: AgRg no REsp 625.232-RJ, DJ 2/8/2004). Por outro lado, doutrina e jurisprudência têm exigido, nos casos em que inexiste o registro da citação ou da penhora, que ao credor cabe o ônus de provar que o terceiro tinha ciência da demanda em curso ou da constrição. Assim, para a caracterização da fraude de execução, é preciso que a alienação tenha ocorrido depois da citação válida, devendo este ato estar devidamente inscrito no registro, ou que fique provado que o adquirente sabia da existência da ação (precedente: REsp 218.290-SP, DJ 26/6/2000). Todavia, meditando melhor sobre a questão e, principalmente, considerando que esse entendimento acaba por privilegiar a fraude à execução por torná-la mais difícil de ser provada, a Min. Relatora diverge do entendimento acima transcrito quanto à questão relativa ao ônus da prova sobre a ciência pelo terceiro adquirente da demanda em curso ou da contrição. Isso porque o inciso II do art. 593 do CPC estabelece uma presunção relativa da fraude que beneficia o autor ou exeqüente. Portanto, em se tratando de presunção, é da parte contrária o ônus da prova da inocorrência dos pressupostos da fraude de execução (CPC, art. 334, IV), porque, a pessoa a quem a presunção desfavorece suporta o ônus de demonstrar o contrário, independentemente de sua posição processual, nada importando o fato de ser autor ou réu. Caberá ao terceiro adquirente, através dos embargos de terceiro (art. 1.046 e ss. do CPC), provar que, com a alienação ou oneração, não ficou o devedor reduzido à insolvência, ou demonstrar qualquer outra causa passível de ilidir a presunção de fraude disposta no art. 593, II, do CPC, inclusive a impossibilidade de ter conhecimento da existência da demanda. De fato, impossível desconhecer-se a publicidade do processo gerada pelo seu registro e pela distribuição da petição inicial (CPC, arts. 251 e 263), no caso de venda de imóvel de pessoa demandada judicialmente, ainda que não registrada a penhora ou mesmo a citação. A partir da vigência da Lei n. 7.433/1985, para a lavratura da escritura pública relativa a imóvel, o tabelião obrigatoriamente consigna no ato notarial, a apresentação do documento comprobatório dos feitos ajuizados. Não é crível que a pessoa que adquire imóvel (ou o recebe em dação em pagamento) desconheça a existência da ação distribuída (ou da penhora) em nome do proprietário do imóvel negociado. Diante disso, cabe ao comprador provar que desconhece a existência da ação em nome do vendedor, não apenas porque o art. 1º da mencionada lei exige a apresentação das certidões dos feitos ajuizados em nome do vendedor para lavratura da escritura pública de alienação de imóveis, mas, sobretudo, porque só se pode considerar, objetivamente, de boa-fé o comprador que toma mínimas cautelas para a segurança jurídica da sua aquisição (precedente: REsp 87.547-SP, DJ 22/3/1999). As pessoas precavidas são aquelas que subordinam os negócios de compra e venda de imóveis à apresentação das certidões negativas forenses. Portanto, tem o terceiro adquirente o ônus de provar, nos embargos de terceiro, que, mesmo constando da escritura de transferência de propriedade do imóvel a indicação da apresentação dos documentos comprobatórios dos feitos ajuizados em nome do proprietário do imóvel, não lhe foi possível tomar conhecimento desse fato. Na hipótese, observa-se que o acórdão recorrido é omisso em relação à existência da prova de que o adquirente, ora recorrente, não tinha conhecimento da ação de indenização ajuizada em face do proprietário do imóvel, ao tempo em que recebeu em dação em pagamento o imóvel em questão. E concluiu a Min. Relatora que, partindo-se da análise fática exposta no acórdão recorrido, a alegação de violação do art. 593, II, do CPC esbarra no teor da Súmula n. 7 deste Superior Tribunal. REsp 618.625-SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/2/2008.
VENDA. AÇÕES. BOLSA. VALORES. DENUNCIAÇÃO. LIDE. PROCURAÇÃO FALSA.
Cinge-se a questão em definir se a empresa responsável pela intermediação da venda de ações na bolsa de valores e a corretora que determina tal venda podem ser denunciadas à lide em ação ajuizada contra a instituição financeira depositária, pelo titular dessas ações, sob o argumento de que a negociação foi realizada sem o consentimento do proprietário, mediante falsificação de procuração. A Min. Relatora esclareceu que a denunciação da lide é determinada com base no art. 70 do CPC, mas, para que seja possível a aplicação do seu inciso III, deve haver lei ou contrato – no caso, o art. 521 do CC/1916 – que obrigue o denunciado a indenizar regressivamente o prejuízo daquele que perder a ação. Na venda de ações escriturais, cuja propriedade é caracterizada por extrato de conta de depósito do titular em instituição financeira depositária que for designada, a corretora deve, previamente ao depósito, obter o bloqueio dos títulos frente ao banco depositário, ato que garante a disponibilidade para negociação. Esse bloqueio é efetivado mediante apresentação, pela corretora, de uma ordem de transferência. Dessa forma, ainda que o banco, na qualidade de depositário das ações, tenha o dever de adotar todas as medidas de segurança para evitar fraudes, o que, a rigor, inclui a conferência de toda a documentação envolvida na venda, tal circunstância não exime a corretora da sua obrigação legal de responder pela legitimidade da procuração necessária à transferência de valores mobiliários, inclusive frente à instituição depositária, para quem apresenta a ordem de transferência e requer o bloqueio das ações a serem negociadas em nome do acionista depositante. A condenação da instituição financeira ré fundou-se no fato de que ela, na condição de depositária, tinha o dever de conferir a autenticidade da procuração supostamente outorgada pelo acionista. A negligência do banco, contudo, não afasta a obrigação da corretora, ora recorrente, de garantir a legitimidade da procuração por ela própria utilizada para requerer o bloqueio, depositar e vender as ações. Restando incontroverso nos autos que o instrumento de mandato era falso, bem como que, com base nesse documento, foi apresentada a ordem de transferência de ações escriturais, concretiza-se o direito de regresso da instituição depositária frente à corretora. Precedente citado: REsp 70.608-SP, DJ 18/12/1995. REsp 521.120-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/2/2008.
COMPETÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. JUIZADO ESPECIAL. CONTROLE.
A Turma entendeu que, não obstante ser possível o controle pelo juízo comum da competência dos juizados especiais via mandado de segurança, não é cabível o MS sem a observância das regras de competência de cada Tribunal para conhecimento de tais medidas. Outrossim, ainda que presente o interesse da CEF na causa a ponto de deslocar a competência para a Justiça Federal, não se altera aquela conclusão. Precedentes citados: CC 37.929-AL, DJ 22/2/2004; CC 67.330-MG, DJ 1º/2/2007; CC 73.000-RS, DJ 3/9/2007; CC 73.681-PR, DJ 16/8/2007, e CC 83.130-ES, DJ 4/10/2007. RMS 24.014-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 21/2/2008.
Quarta Turma
BUSCA E APREENSÃO. REVELIA. VISTA. DOCUMENTO.
Discute-se a aplicação da pena de revelia e a nulidade da sentença que se teria amparado em documento cuja vista não foi dada aos réus, ora recorrentes, em ação de busca e apreensão movida por instituição bancária. Explica o Min. Relator que a revelia foi corretamente aplicada; pois, segundo o acórdão recorrido, a contestação é intempestiva, uma vez que, após a citação, houve a retirada dos autos pelo advogado e, só após três meses e meio, eles foram devolvidos com a contestação. Essa demora, segundo o citado acórdão, obstruiu a marcha processual, não permitindo a juntada da carta precatória. Assim, para o Min. Relator, chegar-se à conclusão contrária demandaria reexame fático (Súm. n. 7-STJ). Observa o Min. Relator que o Tribunal a quo reconheceu que a parte, em tese, teve acesso aos autos em momento ulterior e nada alegou a respeito. Por outro lado, o documento a que se reportou a sentença, a cuja vista os recorrentes alegam que não tiveram acesso, é uma certidão do cartório atestando a retirada e a restituição desses autos de busca e apreensão pelo advogado dos recorrentes, informação de que já tinham ciência. Para o Min. Relator, afirmar que o causídico fê-lo em nome próprio e não dos recorrentes seria pueril e ele teria praticado a irregularidade de retirar autos de processo do qual não era advogado. Outrossim, não se alegou, em nenhum momento, que a certidão estaria errada ou era falsa; assim, não se configura a hipótese de nulidade da decisão. REsp 472.554-PR, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 19/2/2008.
PROTESTO INVÁLIDO. PEDIDO. QUEBRA. EXTINÇÃO. AÇÃO.
É invalido o protesto de título cuja intimação foi realizada no endereço da devedora, contudo sem a identificação de quem a recebeu, pois a intimação pessoal é essencial à higidez do pedido de quebra. Assim, com fundamento no art. 267, IV, do CPC, extingue-se o processo. Precedente citado: EREsp 248.143-PA, DJ 23/8/2007. REsp 472.801-SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 21/2/2008.
Quinta Turma
HABEAS CORPUS. SUSTENTAÇÃO ORAL. INTIMAÇÃO. NULIDADE.
Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário em que se alega, entre outras coisas, a falta de intimação do impetrante para a sustentação oral, embora o pedido se encontrasse expresso nos autos. Assim, deveria ser nulo o acórdão que manteve a instauração de ação penal em desfavor dos ora pacientes. A Turma concedeu a ordem ao entendimento de que, havendo o pedido de sustentação oral, é imprescindível seja dada ciência ao impetrante da data em que será colocado o feito em mesa para julgamento, ressaltando que a referida ciência pode ser feita até por meio de informação disponibilizada no sistema informatizado de acompanhamento processual. Precedentes citados do STF: HC 92.290-SP, DJ 30/11/2007; HC 93.101-SP, DJ 22/2/2008; do STJ: HC 88.869-MG, DJ 3/12/2007. HC 93.557-AM, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 19/2/2008.

SONEGAÇÃO FISCAL. ADESÃO. REFIS. CONSTRIÇÕES JUDICIAIS. LEVANTAMENTO.
Trata-se de recurso especial contra acórdão que determinou o levantamento de bens sob constrições judiciais ao argumento de que o denunciado encontrava-se amparado pela sua adesão ao Programa de Recuperação Fiscal (Refis), visto que a homologação dessa prescinde de garantias legalmente exigidas, o que ocorreu no caso. A Turma deu provimento ao recurso ao fundamento de que a adesão ao Refis implica a suspensão da pretensão punitiva, e não a extinção da punibilidade, que só ocorre com o pagamento integral dos tributos. Dessa forma, impossibilita-se o levantamento dos bens sob constrições judiciais. Ressalte-se que as garantias prestadas para a homologação da opção pelo Refis possuem natureza administrativa e não podem substituir as medidas judiciais assecuratórias. Precedente citado: REsp. 733.455-RS, DJ 7/11/2005. RESP 762.072-RS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 19/2/2008.

INTIMAÇÃO. SENTENÇA. DESEJO. RECURSO.
Não há qualquer preceito legal que exija, quando da intimação da sentença penal condenatória, que se indague o réu sobre seu desejo de recorrer. HC 77.964-SP, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 21/2/2008.
ECA. PRESCRIÇÃO. MAIORIDADE CIVIL.
É consabido que o instituto da prescrição é aplicável aos atos infracionais cometido por adolescentes, pois as medidas sócio-educativas têm caráter retributivo e repressivo, apesar de possuírem, também, natureza preventiva e reeducativa. Diante da ausência de fixação de um lapso temporal pela sentença, há que se valer do limite máximo de três anos, previsto no art. 121, § 3º, do ECA, bem como dos mesmos critérios necessários à decretação da prescrição da pretensão punitiva do Estado (arts. 109, IV, e 115 do CP). Anote-se que o prazo prescricional não se aperfeiçoou no caso. Obriga-se a considerar a idade do adolescente infrator na data do fato para efeito de aplicação das medidas sócio-educativas constantes do ECA, observado que a liberação obrigatória deve ocorrer não com a maioridade civil, mas apenas quando o menor completar 21 anos, pois o art. 121, § 5º, do ECA não foi revogado pelo CC/2002. Precedentes citados: HC 44.458-SP, DJ 13/2/2006; HC 33.473-RJ, DJ 6/2/2006; RHC 15.905-SC, DJ 3/11/2004; HC 45.567-SP, DJ 17/4/2006; HC 58.178-SP, DJ 25/9/2006; HC 44.168-RJ, DJ 10/9/2007, e HC 30.032-RJ, DJ 2/2/2004. HC 90.172-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 21/2/2008.
Sexta Turma
PROGRESSÃO. REGIME PRISIONAL. EXAME CRIMINOLÓGICO.
É certo que a novel redação do art. 112 da Lei de Execuções Penais (LEP), dada pela Lei n. 10.792/2003, não mais determina a submissão do apenado ao exame criminológico para fins de progressão prisional. Porém, isso não é empeço para que o juízo da execução, em decisão fundamentada, determine sua realização se entender necessário à formação de seu convencimento. No caso dos autos, houve a avaliação psicológica do ora paciente, que revelou ser frágil sua personalidade, com tendência à impulsividade, agressividade, hostilidade, o que demonstra ser ele vulnerável quanto ao retorno ao crime. Em sua avaliação social, vê-se ainda faltarem condições para que se beneficie da progressão de regime, pois há várias ocorrências no meio carcerário que desabonam sua conduta. Dessarte, constata-se que a cassação pelo Tribunal estadual do benefício concedido pelo juízo singular (que desprezou essas avaliações) não sofre a pecha de constrangimento ilegal, é decorrência da própria conduta inadequada do apenado, sopesado que a progressão não é dádiva decorrente do simples decurso do prazo legal, mas, sim, conquista feita diariamente em busca da liberdade definitiva. Precedente citado do STF: HC 88.052-DF, DJ 28/4/2006. HC 94.426-RS, Rel. Min. Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ/MG), julgado em 19/2/2008.
EXCESSO. PRAZO. PRISÃO CAUTELAR. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO.
A Turma, ao prosseguir o julgamento, entendeu não se aplicar a Súm. n. 21-STJ ao caso em que o recurso em sentido estrito interposto em favor do ora paciente, pronunciado em dezembro de 2005 e preso preventivamente há três anos, ainda aguarda apreciação. Mostra-se evidente o excesso de prazo, quanto mais se a defesa sequer deu causa ao atraso. Anote-se que o co-réu já se encontra em liberdade para aguardar o desenrolar da ação penal. HC 77.469-SP, Rel. Min. Nilson Naves, julgado em 19/2/2008.
FURTO QUALIFICADO. RELAÇÃO SUBJETIVA DE CONFIANÇA. QUALIFICADORA.
O furto praticado por agente diarista contratada em função de boas referências, a quem foram entregues as próprias chaves do imóvel enquanto viajavam os patrões, caracteriza, certamente, a forma qualificada prevista no artigo 155, § 4º, II, do CP. HC 82.828-MS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, julgado em 21/2/2008.
DESCAMINHO. CONTRABANDO. PRINCÍPIO. INSIGNIFICÂNCIA.
O paciente está sendo investigado pelo cometimento, em tese, do crime de contrabando ou descaminho (art. 334 do CP). Mas a Turma denegou a ordem ao argumento de que o princípio da insignificância invocado pela defesa não se aplica ao presente caso. Para a Min. Relatora, o valor de referência utilizado pela Fazenda Pública quanto aos débitos inscritos em dívida ativa da União são cem reais, conforme o art. 18, § 1º, da Lei n. 10.522/2002 e corresponde ao valor máximo de que o erário está disposto a abrir mão por meio do cancelamento. E, em seu art. 20, diz que, acima de cem reais até o limite de dez mil reais, serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais, porém com a ressalva do parágrafo primeiro de que os autos de execução a que se refere o artigo serão reativados quando os valores dos débitos ultrapassarem os limites indicados. O mencionado arquivamento não implica renúncia fiscal, mas, tão-somente, denota a política quanto à prioridade para efeito de cobrança imediata conferida aos montantes mais elevados. Logo, considerando-se que a lesividade da conduta no crime de descaminho deve ser aferida com base no valor do tributo incidente sobre as mercadorias apreendidas e que os montantes inicialmente apurados excedem em muito o valor de cem reais, não há que se falar em aplicação do princípio da insignificância. Entendeu a Min. Relatora que o trancamento do inquérito policial pela via do habeas corpus representa medida excepcional, admissível tão-somente quando evidenciada, de pronto, a atipicidade dos fatos investigados ou a impossibilidade de a autoria ser imputada ao indiciado, sendo que nenhuma dessas circunstâncias foi efetivamente demonstrada pela defesa. Precedente citado: HC 41.700-RS, DJ 20/6/2005. HC 66.308-SP, Rel. Min. Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ-MG), julgado em 21/2/2008.
ROUBO. ARMA. APREENSÃO. PERÍCIA.
O impetrante pretende o afastamento da qualificadora do emprego de arma visto não ter sido esta apreendida e periciada. Para a Min. Relatora, se a arma não é apreendida e periciada nos casos em que não se pode aferir a sua eficácia, não há como a acusação provar que ela poderia lesionar mais severamente o bem jurídico tutelado, caso em que se configura crime de roubo por inegável existência de ameaça, todavia não se justifica a incidência da causa de aumento, que se presta a reprimir, de forma mais gravosa, aquele que atenta gravemente contra o bem jurídico protegido. Nos casos em que não há apreensão, mas a vítima e demais testemunhas afirmam de forma coerente que houve disparo com a arma de fogo, especificamente nesse tipo de caso, não é necessária a apreensão e a perícia do objeto para constatar que a arma possuía potencialidade lesiva e não era de brinquedo, uma vez que sua eficácia mostra-se evidente. Contudo, nos demais casos, sua apreensão é necessária. Isso decorre, como afirma a Ministra Maria Thereza de Assis Moura, da mesma raiz hermenêutica que inspirou a revogação da Súmula n. 174 deste Superior Tribunal. A referida súmula que, anteriormente, autorizava a exasperação da pena quando do emprego de arma de brinquedo no roubo tinha como embasamento teoria de caráter subjetivo. Autorizava-se o aumento da pena em razão da maior intimidação que a imagem da arma de fogo causava na vítima. Então, em sintonia com o princípio da exclusiva tutela de bens jurídicos, imanente ao Direito Penal do fato, próprio do Estado democrático de direito, a tônica exegética passou a recair sobre a afetação do bem jurídico. Assim, reconheceu-se que o emprego de arma de brinquedo não representava maior risco para a integridade física da vítima; tão só gerava temor nesta, ou seja, revelava apenas fato ensejador da elementar "grave ameaça". Do mesmo modo, não se pode incrementar a pena de forma desconectada da tutela do bem jurídico ao se enfrentar a hipótese em exame. Afinal, sem a apreensão, como seria possível dizer que a arma do paciente não era de brinquedo ou se encontrava desmuniciada? Sem a perícia, como seria possível dizer que a arma do paciente não estava danificada? Logo, à luz do conceito fulcral de interpretação e aplicação do Direito Penal - o bem jurídico - não se pode majorar a pena pelo emprego de arma de fogo sem a apreensão e a realização de perícia para se determinar que o instrumento utilizado pelo paciente, de fato, era uma arma de fogo, circunstância apta a ensejar o maior rigor punitivo. Logo, o emprego de arma de fogo é circunstância objetiva e torna imperiosa a aferição da idoneidade do mecanismo lesivo, o que somente se viabiliza mediante sua apreensão e conseqüente elaboração do exame pericial, nos casos em que a eficácia da arma não exsurge incontroversa por outros meios de prova. Isso posto, a Turma concedeu a ordem para decotar a causa de aumento de pena referente ao uso de arma de fogo, aplicando sobre a pena-base a majorante do concurso de pessoas em um terço. Precedentes citados: HC 59.350-SP, DJ 28/5/2007, e HC 36.182-SP, DJ 21/3/2005. HC 89.518-SP, Rel. Min. Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ-MG, julgado em 21/2/2008.
HC. CONCESSÃO. ANULAÇÃO. PROCESSO. INQUIRIÇÃO.
O paciente foi condenado pelo Tribunal do Júri a 4 anos de reclusão pela prática dos delitos previstos no art. 121, c/c art. 14, II, do CP. Pede a anulação do feito; pois, segundo a tese da defesa, imbuído de violenta emoção, teria atentado contra a vida de seu ex-cônjuge e o seu então namorado, sendo que não foi feito o quesito relativo a tal versão, assim, não teve, durante todo o processo, a efetiva defesa garantida constitucionalmente e no art. 261 e parágrafo do CPP, esse acrescentado pela Lei n. 10.792/2003. A Min. Relatora entendeu assistir integral razão ao paciente quanto a ter ficado sem defesa efetiva durante todo o seu processo. A única testemunha ocular dos fatos não foi ouvida, tendo sido a ausência de sua oitiva o motivo pelo qual o defensor constituído desistiu de continuar a defesa do réu. O defensor nomeado não apresentou recurso em sentido estrito quando o pedido para inquirição de testemunha poderia ser reexaminado pelo Tribunal nem arrolou, na contrariedade, a referida testemunha, bem como, já em plenário, não cuidou de pedir a inclusão de quesito pertinente à defesa. Lembrou a Min. Relatora que, segundo o relato dos autos, a testemunha é imprescindível para o réu que alega que, antes de ele efetuar os disparos, por duas vezes, o namorado de sua ex-companheira tentou atropelá-lo com o veículo no qual se encontrava. Se confirmada sua versão pela testemunha, a pretensão de ver reconhecida a legítima defesa ficaria, em tese, possível de ser reconhecida. Entendeu a Min. Relatora que a omissão feriu o princípio da ampla defesa, constituindo nulidade absoluta, que pode ser reconhecida em qualquer fase do processo e até mesmo depois do trânsito em julgado da condenação. Dizer, como afirmou o Tribunal a quo, que as matérias argüidas foram atingidas pela preclusão é fazer tábula rasa do princípio constitucional do devido processo legal e da ampla defesa. Isso posto, a Turma concedeu a ordem de habeas corpus. HC 88.934-PB, Rel. Min. Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ-MG), julgado em 21/2/2008.

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Editora Plenum
Boletim Informativo Diário - 27/02/2008

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CARTA-CIRCULAR BACEN Nº 3.298 DE 22.02.2008 - DOU 25.02.2008 - RETIFICADA 27.02.2008
Esclarece sobre a remessa dos relatórios do diretor ou do administrador responsável pela Ouvidoria de que trata a Circular 3.370, de 2007.
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STF - 1ª Turma: carta rogatória deve ser formulada por autoridade judiciária
STF - 2ª Turma: entidade beneficente está isenta da cobrança de IPTU e ISS
STJ - Banco Central terá de indenizar empresas por intervenção na década de 70
STJ - Procon pode aplicar multa por prática de dumping
TST - Justiça do Trabalho reconhece vínculo de terceirizado com Itaipu Binacional
TST - Servidor celetista é reintegrado após ser dispensado no estágio probatório
TJRJ - Bradesco é condenado por não impedir desvio de dinheiro
TJRJ - Justiça determina que prefeita de São Gonçalo retire promoção pessoal de propagandas


As notícias publicadas neste boletim são oriundas dos sites oficiais dos tribunais.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Informativo 494 STF

Brasília, 1º a 15 de fevereiro de 2008 Nº 494
Data (páginas internas): 20 de fevereiro de 2008
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.
Sumário
Plenário
Desapropriação: Ecossistema da Floresta Amazônica e Intimação - 1
Desapropriação: Ecossistema da Floresta Amazônica e Intimação - 2
Reajuste de Proventos e EC 41/2003 - 2
Atividade Judicante e Crime contra a Honra
Direito de Recorrer em Liberdade
Serviços Notariais e de Registro e Imunidade - 3
ADI e Sufrágio Universal
Reclamação: Deferimento de Liminar em ADI e Efeito Vinculante - 3
Reclamação: Deferimento de Liminar em ADI e Efeito Vinculante - 4
ADI e Regime Jurídico de Servidores Públicos Militares
ADI e Vício Material - 1
ADI e Vício Material - 2
Preenchimento de Cargo de Desembargador e Critério de Merecimento - 1
Preenchimento de Cargo de Desembargador e Critério de Merecimento - 2
Preenchimento de Cargo de Desembargador e Critério de Merecimento - 3
Porte Ilegal de Arma e Ausência de Munição - 3
Porte Ilegal de Arma de Fogo sem Munição com Sinal de Identificação Suprimido - 3
Porte Ilegal de Arma de Fogo sem Munição com Sinal de Identificação Suprimido - 4
Suspensão de Liminar e Controle Abstrato de Constitucionalidade - 2
1ª Turma
Carta Rogatória: Custas e Ação Penal Pública - 3
Confissão Espontânea e “Reformatio in Pejus”
Devido Processo Legal e Negativa de Prestação Jurisdicional - 1
Devido Processo Legal e Negativa de Prestação Jurisdicional - 2
Lei 10.826/2003: Atipicidade Temporária e Posse de Arma de Fogo
Obrigação Tributária: Decisões Contraditórias e Coisa Julgada - 1
Obrigação Tributária: Decisões Contraditórias e Coisa Julgada - 2
Acordo de Delação Premiada e Sigilo - 3
2ª Turma
Competência Penal e Prevenção
Estabilidade Financeira e Cálculo de Gratificação de Pós-Graduação
Transcrições
Réu preso - Instrução processual - Direito de presença (HC 93503 MC/SP)
Persecução penal - Sigilo - Direito de acesso do advogado, quando constituído (HC 93767 MC/DF)

Plenário

Desapropriação: Ecossistema da Floresta Amazônica e Intimação - 1
O Tribunal iniciou julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente da República que, por decreto, declarara de interesse social, para fins de reforma agrária, imóvel rural. Os impetrantes sustentam a nulidade do procedimento administrativo realizado pelo INCRA, pelos seguintes fundamentos: a) invalidade da notificação para a vistoria prévia, dado que recebida por pessoa sem poderes de representação; b) inexistência de intimação sobre a atualização cadastral do imóvel, já que endereçada a local diverso da sede da empresa-autora; c) impossibilidade de desapropriação do imóvel, por se localizar em perímetro de ecossistema da Floresta Amazônica (art. 1º da Portaria/MEPF 88/99) e ser objeto de plano de manejo florestal sustentável (Lei 8.629/93, art. 7º); d) falta de notificação de entidades de classe (Decreto 2.250/97, art. 2º); e) invasão da propriedade por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST. Inicialmente, aplicando-se a orientação firmada pela Corte no sentido de que, em se tratando de desapropriação para fins de reforma agrária, podem ser analisados os vícios do processo administrativo quando do julgamento do mandado de segurança impetrado contra o decreto presidencial, rejeitou-se a preliminar de não-cabimento do writ.
MS 25391/DF, rel. Min. Carlos Britto, 11.2.2008. (MS-25391)

Desapropriação: Ecossistema da Floresta Amazônica e Intimação - 2
Quanto ao mérito, o Min. Carlos Britto, relator, denegou a segurança e cassou a liminar deferida. Relativamente à suposta invalidade da notificação da vistoria prévia, aduziu que esta fora recebida por advogado constituído pela impetrante para representá-la em notícia-crime e que funcionário da empresa acompanhara toda a vistoria. Afastou a segunda alegação, porquanto juntado aviso de recebimento endereçado à impetrante, intimando-a da atualização cadastral do imóvel. No tocante à impossibilidade de desapropriação do imóvel, por sua localização e por ser objeto de plano de manejo, asseverou, de início, que a área possui cobertura florestal primária incidente no Ecossistema da Floresta Amazônica, conforme demonstrado em laudo agronômico do INCRA, o que proibiria a desapropriação, nos termos do art. 1º, caput, da aludida Portaria 88/99. Contudo, entendeu que tal norma seria excepcionada pelo seu parágrafo único, bem como pelo § 6º do art. 37-A do Código Florestal (“§ 6º. É proibida, em área com cobertura florestal primária ou secundária em estágio avançado de regeneração, a implantação de projetos de assentamento humano ou de colonização para fim de reforma agrária, ressalvados os projetos de assentamento agroextrativista, respeitadas as legislações específicas.”). Dessa forma, uma vez destinada à implantação de projeto de assentamento agroextrativista — recomendado pela Procuradoria do INCRA e solicitado pelos trabalhadores da região — a propriedade estaria disponível para desapropriação. De igual modo, repeliu o argumento de que a implantação de projeto técnico na área obstaculizaria a desapropriação, haja vista a existência de controvérsia sobre a veracidade do documento em que afirmado ser o imóvel objeto desse projeto. Ademais, salientou não restar comprovado o atendimento dos requisitos legais, cuja conclusão em sentido diverso ensejaria dilação probatória, incabível na sede eleita. Também não acolheu o penúltimo fundamento, pois a jurisprudência do STF seria pacífica quanto à necessidade de intimação da entidade representativa da classe produtora se esta houver indicado a área a ser desapropriada, o que não ocorrera na espécie. Por fim, aduziu que a impetrante reconhecera que a invasão da propriedade por integrantes do MST acontecera bem depois da vistoria do INCRA. Após preliminar suscitada pelo Min. Cezar Peluso quanto à prova da intimação oportuna da impetrante no processo e confirmação do voto pelo relator, pediu vista dos autos o Min. Eros Grau.
MS 25391/DF, rel. Min. Carlos Britto, 11.2.2008. (MS-25391)

Reajuste de Proventos e EC 41/2003 - 2
O Tribunal, em conclusão de julgamento, concedeu mandado de segurança impetrado por servidor público aposentado contra ato omissivo do Tribunal de Contas da União - TCU, com o objetivo de compelir tal colegiado a proceder ao reajuste anual de seu benefício, nos termos do § 8º do art. 40, da CF; do art. 15, da Lei federal 10.887/2004; do art. 65, caput e parágrafo único, da Orientação Normativa 3/2004, do Ministério da Previdência Social, e do § 1º do art. 1º, da Portaria MPS 822/2005 e seu Anexo I — v. Informativo 481. Inicialmente, em votação majoritária, rejeitou-se a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, por se entender que, em razão de o writ ter sido impetrado por servidor público aposentado do TCU, seria este o único destinatário dos efeitos de eventual sentença favorável àquele e, como tal, responsável pelo pagamento de proventos. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio que acatava a preliminar para extinguir o processo sem julgamento de mérito, por julgar que o mandado de segurança deveria ter sido impetrado contra a União. No mérito, por maioria, considerou-se o que previsto no § 8º do art. 40, da CF, com a redação da EC 41/2003, que assegura o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei. Asseverou-se que o art. 9º da Lei federal 9.717/98, que dispõe sobre as regras gerais para a organização e o funcionamento dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, delegou competência ao Ministério da Previdência Social, para o estabelecimento de regras gerais atinentes ao regime em questão, sem afronta ao citado dispositivo constitucional, que versa apenas sobre critérios legais de reajustamento e não competência para fixação de índices, nem ao art. 61, § 1º, c, da CF, que não trata de reajuste de proventos. Ressaltou-se, ainda, que o art. 15 da Lei federal 10.887/2004 tão-só cuidou de estabelecer que os benefícios como os do autor, concedidos na forma do § 2º do art. 3º, da EC 41/2003, fossem reajustados na mesma data em que se desse o reajuste dos benefícios do regime geral de previdência social, sendo silente, no entanto, quanto ao índice. Reputou-se que, autorizado pela primeira lei federal, e sem contradição com a segunda, o Ministério da Previdência Social editou a Orientação Normativa 3/2004, que preencheu a lacuna sobre o índice, tendo a Portaria MPS 822/2005 fixado, posteriormente, o percentual aplicável a cada caso (art. 1º, § 1º, e Anexo I). Vencido o Min. Marco Aurélio que, superada a preliminar, indeferia a ordem ao fundamento de se estar concedendo tratamento diferenciado ao pessoal da inatividade. Segurança concedida para determinar que o TCU reajuste os proventos do impetrante nos termos do pedido.
MS 25871/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 11.2.2008. (MS-25871)

Atividade Judicante e Crime contra a Honra
O Tribunal negou provimento a agravo regimental interposto, nos autos de inquérito, contra decisão que negara seguimento a queixa-crime em que se imputava a Ministro do STJ a suposta prática de crimes contra a honra por meio de imprensa (Lei 5.250/67, artigos 20, 21 e 22). Tratava-se, na origem, de inicial acusatória em que sustentada ofensa às honras objetiva e subjetiva decorrente de publicação, no Diário da Justiça da União, de despacho proferido pelo querelado que rejeitara exceção de suspeição ajuizada pelos querelantes no tribunal a quo. Reafirmando os fundamentos da decisão agravada, con­siderou-se que o processamento da queixa-crime encontraria óbice no que disposto no art. 43, I, do CPP (“A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I – o fato narrado evidentemente não constituir crime;”), haja vista que os trechos do despacho judicial destacados pelos querelantes não sinalizariam o cometimento, nem sequer em tese, de delitos contra a honra por parte do querelado e que muitos desses fragmentos seriam meras transcrições de informações prestadas pelo juízo processante. Asseverou-se, também, que a aludida Lei 5.250/67, em seu art. 27, IV, ressalva que a reprodução de despachos e sentenças não constitui abuso no exercício da liberdade de manifestação (Lei 5.260/67: “Art . 27. Não constituem abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e de informação: ... IV - a reprodução integral, parcial ou abreviada, a notícia, crônica ou resenha dos debates escritos ou orais, perante juízes e tribunais, bem como a divulgação de despachos e sentenças e de tudo quanto fôr ordenado ou comunicado por autoridades judiciais;”). O Min. Celso de Mello acompanhou o relator e citou, ainda, o art. 41 da LOMAN, que versa sobre causa de imunidade funcional — que decorre da necessidade de proteger os magistrados no exercício regular e independente de seu ofício jurisdicional —, garantia essa não absoluta, eis que passível de ser afastada nas hipóteses de impropriedade ou excesso de linguagem (LOMAN: “Art. 41. Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir.”).
Inq 2637 AgR/DF, rel. Min. Carlos Britto, 11.2.2008. (INQ-2637)

Direito de Recorrer em Liberdade
O Tribunal, resolvendo questão de ordem, concedeu medida cautelar em habeas corpus no qual se questiona a harmonia, ou não, com a ordem jurídica, da condição imposta pelo art. 594 do CPP, que determina o recolhimento do réu à prisão para a interposição do recurso de apelação. No caso, decretada a prisão preventiva do paciente, sobreviera sua condenação por latrocínio (CP, art. 157, § 3º), sendo-lhe negado o direito de recorrer em liberdade. Inconformada, a defesa apelara e o tribunal de origem não conhecera do recurso porque o paciente não se recolhera à prisão, o que ensejara impetração de habeas corpus, denegado pelo STJ, ante a circunstância de o paciente estar foragido. No presente writ, sustenta-se a ausência de fundamentação da custódia preventiva e pretende-se a revogação da sentença condenatória, em face da ilegalidade da condição de recorribilidade imposta. O Min. Marco Aurélio, relator, indeferira a liminar requerida, por não vislumbrar risco na manutenção da situação fática. A impetração reiterara o pedido de exame da medida acauteladora. Tendo em conta o sistema constitucional, a ordem natural das coisas, o fato de o tema sobre a constitucionalidade do aludido art. 594 do CPP encontrar-se submetido à apreciação desta Corte (HC 83868/AM), bem como a existência de precedentes favoráveis à pretensão do paciente (HC 84975/SP, DJU de 6.5.2005; HC 84087/RJ, DJU de 6.8.2004),concedeu-se a cautelar para afastar o óbice à apreciação da apelação interposta.
HC 90279/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 11.2.2008. (HC-90279)

Serviços Notariais e de Registro e Imunidade - 3
Em conclusão de julgamento, o Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta proposta pela Associação dos Notários e Registradores do Brasil - ANOREG/BR para declarar a inconstitucionalidade dos itens 21 e 21.01 da lista de serviços anexa à Lei Complementar federal 116/2003, que autorizam os Municípios a instituírem o ISS sobre os serviços de registros públicos, cartorários e notariais — v. Informativos 441 e 464. Entendeu-se tratar-se, no caso, de atividade estatal delegada, tal como a exploração de serviços públicos essenciais, mas que, enquanto exercida em caráter privado, seria serviço sobre o qual incidiria o ISS. Vencido o Min. Carlos Britto, relator, que, salientando que os serviços notariais e de registro seriam típicas atividades estatais, mas não serviços públicos, propriamente, julgava o pedido procedente por entender que os atos normativos hostilizados afrontariam o art. 150, VI, a, da CF, que veda que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituam impostos sobre patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros.
ADI 3089/DF, rel. orig. Min. Carlos Britto, rel. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa, 13.2.2008. (ADI-3089)

ADI e Sufrágio Universal
O Tribunal concedeu medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido Humanista da Solidariedade - PHS para suspender a eficácia do art. 13 da Resolução 124/2008 que, dispondo sobre a regulamentação de eleição extemporânea no Município de Caldas Novas/GO, determina que “participarão da eleição de que trata esta resolução os eleitores do Município de Caldas Novas que se encontravam aptos a votar no pleito de 3 de outubro de 2004, desde que estes também estejam aptos no cadastro de eleitores deste município na data de 21 de janeiro de 2008”. Entendeu-se que, em princípio, a resolução questionada teria limitado o grupo de eleitores, em ofensa ao art. 14 da CF, que estabelece que a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I - plebiscito; II - referendo e III - iniciativa popular.
ADI 4018 MC/GO, rel. Min. Eros Grau, 13.2.2008. (ADI-4018)

Reclamação: Deferimento de Liminar em ADI e Efeito Vinculante - 3
O Tribunal, por maioria, julgou prejudicada reclamação ajuizada pela Fundação Universidade de Brasília - FUB, na qual se alegava ofensa à autoridade da decisão do Supremo de indeferimento da liminar na ADI 1104 MC/DF (DJU de 12.5.95), na qual se discutia a constitucionalidade da Lei distrital 464/93, que isentou as entidades assistenciais e beneficentes, declaradas de utilidade pública, das taxas e tarifas referentes ao fornecimento de água e energia elétrica. Na espécie, impugnavam-se decisões de 1ª instância que declararam a inconstitucionalidade da referida lei. Considerou-se ter havido perda do objeto da referida ADI, em face da revogação da lei impugnada pela Lei distrital 3.588/2005, restando insubsistente a medida cautelar cuja autoridade se pretendia garantir. Vencido o Min. Nelson Jobim, que dava provimento ao agravo.
Rcl 2121 AgR-AgR/DF, rel. Min. Eros Grau, 13.2.2008. (RCL-2121)

Reclamação: Deferimento de Liminar em ADI e Efeito Vinculante - 4
O Min. Gilmar Mendes, em voto-vista, apresentou reservas quanto à decisão agravada, consignadas como obiter dictum. Aduziu, na linha do voto do Min. Nelson Jobim, haver casos em que, o Tribunal, ao indeferir a cautelar, enfatizaria, ou quase, a não-plausibilidade da impugnação; e outros em que exporia apenas razões formais. Asseverou que, na primeira hipótese, seria possível justificar a reclamação, enquanto que, na segunda, o argumento seria mais tênue, ante a ausência de manifestação substancial do Tribunal sobre o conteúdo da norma. Afirmou, não obstante, que em ambas as situações poderiam ocorrer conflitos negativos para a segurança jurídica, com pronunciamentos contraditórios por parte de instâncias judiciais diversas. Concluiu, assim, que, em casos similares de indeferimento de liminar em ADI com possibilidade de repercussão nas instâncias ordinárias, seria pertinente adotar fórmula semelhante à prevista no art. 21 da Lei 9.868/99 (“O Supremo Tribunal Federal... poderá deferir pedido de medida cautelar na ação declaratória de constitucionalidade, consistente na determinação de que os juízes e os Tribunais suspendam o julgamento dos processos que envolvam a aplicação da lei ou do ato normativo objeto da ação até seu julgamento definitivo.”), para a ação declaratória de constitucionalidade. Asseverou, por fim, que a vantagem técnica dessa fórmula seria a de que ela alcançaria resultado equivalente, quanto à segurança jurídica, sem afirmar, em princípio, o efeito vinculante da decisão provisória proferida pelo Tribunal em sede de cautelar.
Rcl 2121 AgR-AgR/DF, rel. Min. Eros Grau, 13.2.2008. (RCL-2121)

ADI e Regime Jurídico de Servidores Públicos Militares
Por entender usurpada a iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo para instauração do processo legislativo em tema concernente à definição do regime jurídico dos servidores públicos militares (CF, art. 61, § 1º, II, f), de observância obrigatória pelos Estados-membros, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro para declarar a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional 2/91, à Constituição estadual, de origem parlamentar, que, incluindo um parágrafo único no art. 92 desta, assegurou direitos aos servidores militares e estabeleceu que a sua regulamentação seria feita por lei de iniciativa do Executivo.
ADI 858/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 13.2.2008. (ADI-858)
ADI e Vício Material - 1
O Tribunal julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República contra diversos artigos inseridos na Constituição do Estado do Ceará. Inicialmente, não se conheceu da ação quanto ao art. 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, em razão de sua declaração de inconstitucionalidade no julgamento da ADI 289/CE (DJU de 16.3.2007). Em seguida, julgou-se prejudicado o pedido em relação aos artigos 33, §§ 1º e 2º, e 42, caput e § 1º, submetidos a alteração substancial pelas Emendas Constitucionais 6/91 e 47/2001. Relativamente aos §§ 6º a 8º do art. 37, considerou-se, por maioria, não prejudicado o pedido, tendo em conta a inexistência de alteração substancial da norma de parâmetro (CF, art. 29, V), ficando vencidos, no ponto, os Ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia, Cezar Peluso e Gilmar Mendes.
ADI 307/CE, rel. Min. Eros Grau, 13.2.2008. (ADI-307)

ADI e Vício Material - 2
Por vislumbrar afronta ao princípio da autonomia municipal, declarou-se a inconstitucionalidade do art. 30, que impõe aos Municípios o encargo de transportar da zona rural para a sede do Município, ou Distrito mais próximo, alunos carentes matriculados a partir da 5ª série do ensino fundamental, bem como do § 3º do art. 35, que dispõe que as Câmaras Municipais funcionarão em prédio próprio ou público, independentemente da sede do Poder Executivo. Reputaram-se inconstitucionais, da mesma forma, os §§ 6º a 8º do art. 37 — que tratam da remuneração, composta por subsídio e representação, do Prefeito —, também por ofensa ao princípio da autonomia municipal, e o § 9º desse mesmo dispositivo, que proíbe que o Prefeito se ausente por mais de 10 dias, sem prévia licença da Câmara Municipal, em face do desrespeito ao art. 49, III, da CF, de observância obrigatória pelos Estados-membros, que impõe a autorização legislativa somente nos casos em que o Chefe do Executivo se ausente por prazo superior a 15 dias. Reconheceu-se, ainda, a inconstitucionalidade do § 2º do art. 38, que prevê que o Vice-Prefeito, ocupante de cargo ou emprego no Estado ou Município, ficará, automaticamente, à disposição da respectiva municipalidade, enquanto perdurar a condição de Vice-Prefeito, sem prejuízo dos salários e demais vantagens, ao fundamento de colisão com o art. 38, III, da CF, que estabelece uma única hipótese de acumulação, no que se refere aos Vereadores. Por fim, declarou-se a inconstitucionalidade do § 3º desse mesmo art. 38, por violação ao princípio da autonomia municipal. Quanto ao art. 20, V, que veda ao Estado e aos Municípios atribuir nome de pessoa viva a avenida, praça, rua, logradouro, ponte, reservatório de água, viaduto, praça de esporte, biblioteca, hospital, maternidade, edifício público, auditórios, cidades e salas de aula, o Tribunal, julgou o pedido improcedente, por reputá-lo compatível com o princípio da impessoalidade (CF, art. 37, caput e § 1º).
ADI 307/CE, rel. Min. Eros Grau, 13.2.2008. (ADI-307)

Preenchimento de Cargo de Desembargador e Critério de Merecimento - 1
O Tribunal, por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto, por juízes de direito, contra decisão que deferira pedido de suspensão da execução de liminar, concedida em mandado de segurança em trâmite no Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso - TJMT, que suspendera o preenchimento de cargo aberto pela aposentadoria de desembargador, pelo critério de merecimento. Sustentavam os agravantes que impetraram o referido writ para assegurar o direito de serem votados para compor a lista tríplice de acesso, por merecimento, ao cargo de desembargador, independentemente de integrarem a primeira quinta parte da lista de antiguidade da entrância especial, afastando, dessa forma, a incidência da Resolução 4/2006/OE daquela Corte, fundada no art. 6º da Resolução 6/2005 do Conselho Nacional de Justiça - CNJ. Tendo em conta a publicação do edital do concurso de acesso, a liminar no mandado de segurança fora concedida para suspender o preenchimento desse cargo até o julgamento do mérito da impetração.
SS 3457 AgR/MT, rel. Min. Ellen Gracie, 14.2.2008. (SS-3457)

Preenchimento de Cargo de Desembargador e Critério de Merecimento - 2
Entendeu-se que a decisão agravada deveria ser mantida em razão de não terem sido infirmados ou ilididos os fundamentos por ela adotados. Asseverou-se que o Estado requerente demonstrara a situação configuradora da grave lesão à ordem pública, qual seja, a de que a decisão impugnada impediria a aplicação da Resolução do CNJ, inibindo o exercício de suas atribuições institucionais. Além disso, a grave lesão à ordem pública restaria também comprovada, considerada em termos de ordem jurídico-constitucional, porque, se se adotasse o entendimento de que a EC 45/2004 teria estabelecido o retorno ao regime de merecimento puro na promoção de magistrados para os Tribunais de Justiça, permitir-se-ia que magistrados não integrantes da primeira quinta parte da lista de antiguidade da última entrância pudessem alcançar o cargo máximo da magistratura estadual, o que levaria ao desvirtuamento do sistema previsto na Constituição para a promoção por merecimento dos juízes estaduais.
SS 3457 AgR/MT, rel. Min. Ellen Gracie, 14.2.2008. (SS-3457)

Preenchimento de Cargo de Desembargador e Critério de Merecimento - 3
Aduziu-se, ainda, que a Constituição haveria de ser interpretada com razoabilidade e que os agravantes estariam a interpretar o inciso III do art. 93 da CF, na redação que lhe foi dada pela EC 45/2004, de forma literal e estanque, o que produziria distorções. Salientou-se, ademais, que os agravantes estariam tentando contornar a orientação firmada pelo CNJ que, ao editar a Resolução 6/2005, teria agido dentro do âmbito de sua competência (CF, art. 103-B, § 4º, I e II), a fim de zelar pela observância da impessoalidade e da máxima objetividade na escolha dos juízes a compor a lista de promoção por merecimento. Ressaltou-se, por fim, a possibilidade de ocorrência do denominado “efeito multiplicador”, em face da existência de magistrados em outras unidades da federação em situação idêntica à dos agravantes. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto, que davam provimento ao recurso, por considerar que o ato atacado mediante o agravo não teria uma concretude maior, haja vista que, suspensa a liminar no mandado de segurança, o TJMT, como autor dela própria, não implementaria, de qualquer forma, o preenchimento, aguardando o julgamento final do feito, bem como em razão de a EC 45/2004 ter suprimido do art. 93, II, da CF a expressão “de acordo com o inciso II”, o qual dispunha sobre a exigência de integrar o juiz a primeira quinta parte da lista de antiguidade para fins de promoção por merecimento de entrância para entrância, implicando, portanto, o alargamento da clientela.
SS 3457 AgR/MT, rel. Min. Ellen Gracie, 14.2.2008. (SS-3457)

Porte Ilegal de Arma e Ausência de Munição - 3
O Tribunal, por votação majoritária, julgou prejudicado habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do crime previsto no art. 10 da Lei 9.437/97 (porte ilegal de arma), no qual se pretende a nulidade da sentença, sob alegação de atipicidade da conduta, em razão de a arma portada estar desmuniciada, e declinou de sua competência para o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo — v. Informativos 404 e 411. Considerou-se o julgamento do HC 86834/SP (j. em 23.8.2006), no qual o Tribunal, por maioria, firmou entendimento no sentido de que é incompetente para apreciar e julgar pedidos de habeas corpus impetrados contra atos de Turmas ou Colégios Recursais de Juizados Especiais. Vencidos os Ministros Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso e Joaquim Barbosa, que deferiram o pedido em assentada anterior. Reajustaram seus votos os Ministros Eros Grau e Cezar Peluso.
HC 85240/SP, rel. Min. Carlos Britto, 14.2.2008. (HC-85240)

Porte Ilegal de Arma de Fogo sem Munição com Sinal de Identificação Suprimido - 3
Em conclusão de julgamento, o Tribunal desproveu recurso ordinário em habeas corpus interposto em favor de condenado pela prática do crime de porte ilegal de arma de fogo com numeração de identificação suprimida (Lei 10.826/2003, art. 16, parágrafo único, IV), no qual se pretendia a nulidade da condenação, por atipicidade da conduta, em face da ausência de lesividade da arma desmuniciada apreendida (“Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: ... Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. ... Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: ... IV - portar, possuir, adquirir, transportar ou fornecer arma de fogo com numeração, marca ou qualquer outro sinal de identificação raspado, suprimido ou adulterado;”) — v. Informativos 447 e 486. Entendeu-se que os fatos descritos na denúncia amoldar-se-iam ao tipo previsto no art. 16, parágrafo único, IV, da Lei 10.826/2003. Inicialmente, enfatizou-se que, nas condutas descritas no referido inciso, não se exigiria como elementar do tipo a arma ser de uso permitido ou restrito, e que, no caso, a arma seria de uso permitido, tendo sido comprovada a supressão do seu número de série por abrasão. Diante disso, concluiu-se ser impertinente a discussão acerca da inadequação da conduta descrita na denúncia e tipificação pela qual fora o recorrente condenado.
RHC 89889/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 14.2.2008. (RHC-89889)

Porte Ilegal de Arma de Fogo sem Munição com Sinal de Identificação Suprimido - 4
Quanto ao argumento de atipicidade da conduta em face da ausência de lesividade da arma de fogo apreendida por estar ela desmuniciada e não haver, nos autos, comprovação de munição portada pelo recorrente, esclareceu-se que se teria, na espécie, hipótese diversa da analisada quando do julgamento do RHC 81057/SP (DJU de 29.4.2005), já que se tratara, naquela ocasião, do art. 10 da Lei 9.437/97, substituído, no sistema jurídico, pela norma do art. 14 da Lei 10.826/2003. Afirmou-se que o tipo do inciso IV do parágrafo único do art. 16 da Lei 10.826/2003 é um tipo novo, já que, na Lei 9.437/97, punia-se aquele que suprimisse ou alterasse marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato. Assim, a nova figura teria introduzido cuidado penal inédito do tema, tipificando o portar, possuir ou transportar a arma com a supressão ou alteração do número de série ou de outro sinal de sua identificação, independentemente de a arma de fogo ser de uso restrito, proibido ou permitido, tendo por objeto jurídico, além da incolumidade, a segurança pública, ênfase especial dada ao controle pelo Estado das armas de fogo existentes no país, pelo que o relevo ao municiamento ou não da munição da arma que se põe nos tipos previstos no caput dos artigos 14 e 16 da Lei 10.826/2003 não encontraria paralelo no inciso IV do parágrafo único deste último dispositivo.
RHC 89889/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 14.2.2008. (RHC-89889)

Suspensão de Liminar e Controle Abstrato de Constitucionalidade - 2
O Tribunal retomou julgamento de agravo regimental interposto contra decisão que negara seguimento a pedido de suspensão de liminar deferida, pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra a Emenda 17/2004, que alterou dispositivos da Lei Orgânica do Município de Jacutinga-MG, passando a exigir a participação do Poder Legislativo municipal em matérias administrativas — v. Informativo 434. O Min. Gilmar Mendes, em voto-vista, manifestou-se pela prejudicialidade do agravo regimental, ante a perda do objeto, tendo em conta a apreciação do mérito da mencionada ADI pela Corte Superior do TJMG, não mais subsistindo, assim, a medida cautelar atacada. Antes, entretanto, teceu considerações acerca da admissibilidade do pedido de suspensão de liminar concedida em ação direta de inconstitucionalidade estadual, nos termos do art. 4º da Lei 8.437/92. Asseverou, no ponto, que não se justificaria o óbice ao uso da suspensão de liminar instituída por essa lei, seja pela possibilidade de repercussão da decisão estadual no âmbito federal, seja pelo cabimento de recurso extraordinário contra acórdão proferido no processo objetivo. Ressaltou que, em precedentes aplicáveis à espécie, o Tribunal teria concedido efeito suspensivo ao recurso extraordinário interposto contra acórdão que julgou ação direta de inconstitucionalidade no âmbito estadual, como também acolhido pedido de suspensão de liminar deferida por Tribunal de Justiça dos Estados em ADI proposta perante as Cortes Estaduais. Após, o julgamento foi adiado.
SL 73 AgR/MG, rel. Min. Ellen Gracie, 14.2.2008. (SL-73)

Primeira Turma

Carta Rogatória: Custas e Ação Penal Pública - 3
A Turma retomou julgamento de habeas corpus em que se pleiteia a anulação de processo-crime — instaurado contra denunciado pela suposta prática do delito de apropriação indébita previdenciária (CP, art. 168-A) — a partir do despacho que, na instância de origem, condicionara a expedição de carta rogatória ao recolhimento prévio das custas. No caso, com o recebimento da denúncia, a defesa arrolara testemunhas residentes nos Estados Unidos da América, sendo-lhe determinado, pela autoridade judicial, o pagamento das custas de expedição de carta rogatória — v. Informativo 445. Em voto-vista, o Min. Marco Aurélio, acompanhando a divergência, indeferiu o writ. Afastou a aplicação do disposto no art. 804 do CPP (“A sentença ou o acórdão, que julgar a ação, qualquer incidente ou recurso, condenará nas custas o vencido.”), haja vista que esta regra refere-se a ações em curso no país e despesas efetuadas em território nacional. Aduziu de início que, se a diligência é requerida pela defesa, a esta cabe a satisfação respectiva, inexistindo norma legal a direcionar em sentido contrário. Ressaltou, ainda, que a exigência do depósito decorre da legislação americana e que o tratado ratificado mediante o Decreto 3.810/2001 — que trata da assistência mútua e gratuita entre os Estados no combate à criminalidade — não guarda pertinência com a espécie. Assim, rejeitou a possibilidade de a solução ser norteada pelo aparente conflito temporal entre as portarias referidas pelo relator. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Menezes Direito.
HC 85653/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.2.2008. (HC-85653)
Confissão Espontânea e “Reformatio in Pejus”
A Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STM que, acolhendo embargos infringentes opostos pelo Ministério Público Militar, majorara a pena aplicada a ex-sargento do Exército condenado pela prática de homicídio qualificado. Inicialmente, reconheceu-se a presença da circunstância atenuante de confissão espontânea do paciente. Entretanto, asseverou-se que sua incidência seria inócua para a anulação do acórdão impugnado, porquanto o tribunal a quo mantivera a pena-base no mínimo legal. No ponto, enfatizou-se que a existência de atenuantes não poderia conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal (Enunciado da Súmula 231 do STJ). Por outro lado, entendeu-se que a decisão não estaria devidamente fundamentada quanto à exclusão, do homicídio qualificado (CPM, art. 205, § 1º), de minorante, haja vista que o STM se limitara a afirmar que não existiriam provas nos autos da injusta provocação da vítima contra o paciente, desconsiderando os elementos disponíveis no processo no sentido de que este era constantemente provocado pela vítima. De igual modo, relativamente ao regime fechado imposto pela sentença condenatória, não tendo o parquet, em apelação, se insurgido, reputou-se preclusa essa matéria para a acusação, motivo pelo qual não poderia o STM ter piorado a situação do paciente, em flagrante ofensa ao princípio do ne reformatio in pejus. Ordem concedida para afastar o acórdão do STM, proferido nos embargos infringentes, e restabelecer a sentença condenatória, tal como proferida.
HC 90659/SP, rel. Min. Menezes Direito, 12.2.2008. (HC-90659)

Devido Processo Legal e Negativa de Prestação Jurisdicional - 1
A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário em que se alega negativa de prestação jurisdicional e ofensa aos princípios do devido processo legal e da ampla defesa. Na espécie, a Presidência do STJ desprovera agravo de instrumento em que se pretendia a subida de recurso especial inadmitido na origem, consignando que a empresa agravante não infirmara os fundamentos decisórios nem demonstrara, no recurso especial, ofensa a determinados dispositivos do CPC, bem como que o tribunal de origem não extrapolara, em juízo primeiro de admissibilidade, seu limite de cognição. Seguiram-se embargos de declaração, rejeitados, ao fundamento de ausência de seus pressupostos. Contra esse acórdão, a empresa apresentou o presente recurso extraordinário no qual indica violação aos artigos 5º, LIV e LV, e 105, III, ambos da CF. Sustenta que o STJ não examinou fundamento autônomo do recurso especial, relativamente à recusa do tribunal de justiça em analisar a matéria da confissão de dívida extrajudicial e que o mencionado recurso atenderia ao que disposto no Enunciado da Súmula 211 daquela Corte (“Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal.”), uma vez que opusera embargos declaratórios para prequestionar transgressão aos artigos 348 e 353 do CPC e, alternativamente, ao art. 535 do mesmo diploma legal. Aduz, por fim, que o tema constitucional pode surgir no julgamento do recurso especial.
RE 417819/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 12.2.2008. (RE-417819)

Devido Processo Legal e Negativa de Prestação Jurisdicional - 2
O Min. Marco Aurélio, relator, deu provimento ao recurso extraordinário para que o STJ, afastado o óbice à seqüência do especial, examine-o como entender de direito, no que foi acompanhado pela Min. Cármen Lúcia, que o provia com fundamento no art. 5º, XXXV, da CF (“ a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;”). Ressaltando que o Supremo encontra-se no ápice da organização judiciária brasileira e que o devido processo legal é uma garantia constitucional, considerou não ter cabimento proclamar-se a irrecorribilidade das decisões do STJ que resultem na inadmissibilidade do recurso especial, cujos pressupostos de para recorrer estão previstos na CF. Asseverou que a definição sobre até que ponto o acórdão proferido pela aludida Corte implica violência à CF deve ser analisado caso a caso. Assim, não haveria como afirmar que o exame dos requisitos de admissibilidade do recurso especial seria providência privativa do STJ, como ocorrera na hipótese. Entendeu que a assertiva segundo a qual não teria a empresa veiculado a afronta aos artigos 348 e 353 do CPC mostrar-se-ia discrepante das balizas constitucionais, não apenas do devido processo legal, como também das definidoras do cabimento do especial, haja vista que a questão da confissão fora posta tanto no tribunal de justiça quanto no próprio STJ. Em divergência, os Ministros Ricardo Lewandowski e Carlos Britto desproveram o recurso por reputar que a discussão envolveria matéria infraconstitucional. Após, verificado o empate, adiou-se a conclusão do julgamento para colher o voto de Ministro da 2ª Turma, que substituirá e preencherá o lugar vago em razão do impedimento do Min. Menezes Direito.
RE 417819/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 12.2.2008. (RE-417819)

Lei 10.826/2003: Atipicidade Temporária e Posse de Arma de Fogo
A Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia o reconhecimento da extinção da punibilidade com fundamento na superveniência de norma penal descriminalizante. No caso, o paciente fora condenado pela prática do crime de posse ilegal de arma de fogo de uso restrito (Lei 9.437/97, art. 10, § 2º), em decorrência do fato de a polícia, em cumprimento a mandado de busca e apreensão, haver encontrado uma pistola em sua residência. A impetração sustentava que durante a vacatio legis do Estatuto do Desarmamento, que revogou a citada Lei 9.437/97, fora criada situação peculiar relativamente à aplicação da norma penal, haja vista que concedido prazo (Lei 10.826/2003, artigos 30 e 32) aos proprietários e possuidores de armas de fogo, de uso permitido ou restrito, para que regularizassem a situação dessas ou efetivassem a sua entrega à autoridade competente, de modo a caracterizar o instituto da abolitio criminis. Entendeu-se que a vacatio legis especial prevista nos artigos 30 e 32 da Lei 10.826/2003 (“Art. 30. Os possuidores e proprietários de armas de fogo não registradas deverão, sob pena de responsabilidade penal, no prazo de 180 dias (cento e oitenta) dias após a publicação desta Lei, solicitar o seu registro apresentando nota fiscal de compra ou a comprovação da origem lícita da posse, pelos meios de prova em direito admitidos. Art. 32. Os possuidores e proprietários de armas de fogo não registradas poderão, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias após a publicação desta Lei, entregá-las à Polícia Federal, mediante recibo e, presumindo-se a boa-fé, poderão ser indenizados, nos termos do regulamento desta Lei.”), não obstante tenha tornado atípica a posse ilegal de arma de fogo havida no curso do prazo que assinalou, não subtraiu a ilicitude penal da conduta que já era prevista no art. 10, § 2º, da Lei 9.437/97 e continuou incriminada, com mais rigor, no art. 16 da Lei 10.826/2003. Ausente, assim, estaria o pressuposto fundamental para que se tivesse como caracterizada a abolitio criminis. Ademais, ressaltou-se que o prazo estabelecido nos mencionados dispositivos expressaria o caráter transitório da atipicidade por ele indiretamente criada. No ponto, enfatizou-se que se trataria de norma temporária que não teria força retroativa, não podendo configurar, pois, abolitio criminis em relação aos ilícitos cometidos em data anterior.
HC 90995/SP, rel. Min. Menezes Direito, 12.2.2008. (HC-90995)

Obrigação Tributária: Decisões Contraditórias e Coisa Julgada - 1
A Turma julgou procedente pedido formulado em reclamação ajuizada por empresa contribuinte para determinar que delegado da Receita Federal em Uberlândia/MG cumpra decisão proferida por esta Corte que, em agravo de instrumento (AI 458027/MG, DJU de 11.12.2006), provera parcialmente recurso extraordinário com o fim de declarar a inconstitucionalidade da majoração ou alargamento da base de cálculo da PIS/COFINS, trazidos pela Lei 9.718/98. No caso, foram proferidas, com trânsito em julgado, duas decisões contraditórias em dois mandados de segurança envolvendo as mesmas partes, causa de pedir e pedido. No primeiro writ, reformara-se acórdão do TRF da 1ª Região na parte em que reputara válida a ampliação da base de cálculo da COFINS, sendo, tempos depois, tal decisão aditada para incluir a base de cálculo relativa ao PIS. Posteriormente, a mesma empresa impetrara outro mandado de segurança, idêntico àquele, que tivera o mesmo desfecho. A Fazenda Nacional, então, apelara, tendo sido provido seu recurso para assentar a inexistência de inconstitucionalidade na mencionada Lei 9.718/98. Na fase de habilitação de crédito, promovida pela contribuinte, a autoridade reclamada negara cumprimento à decisão do Supremo ao argumento de existência de coisa julgada, em face do trânsito do último mandado de segurança. Ocorre que o acórdão prolatado nesse writ fora posterior à rejeição do pedido de desistência formulado pela empresa, que o teria impetrado por equívoco, em virtude da constituição de novos advogados.
Rcl 5151/MG, rel. Min. Menezes Direito, 12.2.2008. (Rcl-5151)

Obrigação Tributária: Decisões Contraditórias e Coisa Julgada - 2
Inicialmente, ressaltando que as decisões proferidas versaram sobre o mérito do mandado de segurança, aduziu-se que seus efeitos atingiriam impetrante e impetrado, previamente definidos. Sendo assim, cuidando-se de ações individuais, não competiria à autoridade reclamada questionar a decisão prolatada pelo Supremo, cabendo-lhe dar cumprimento ao que decidido em recurso extraordinário. Mencionou-se, ainda, que a coisa julgada poderia ter sido impugnada mediante o ajuizamento de ação rescisória pela parte interessada em desconstituir a decisão ilegal ou contrária à jurisprudência. Ademais, em se tratando de obrigação tributária, sendo ré a Fazenda Pública, deveria prevalecer, na espécie, a interpretação normativa feita pelo STF, tendo em vista a redação do parágrafo único do art. 741, do CPC, nos termos da Lei 11.232/2005 (“Art. 741. Na execução contra a Fazenda Pública, os embargos só poderão versar sobre: ... Parágrafo único. Para efeito do disposto no inciso II do caput deste artigo, considera-se também inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal.”). Assim, concluiu-se ser desnecessário adentrar discussão teórica e doutrinária concernente à coisa julgada contrária à manifestação do STF, coisa julgada inconstitucional, haja vista estar-se em sede de reclamação.
Rcl 5151/MG, rel. Min. Menezes Direito, 12.2.2008. (Rcl-5151)

Acordo de Delação Premiada e Sigilo - 3
A Turma concluiu julgamento de habeas corpus em que se discutia a possibilidade de os advogados do paciente terem acesso aos autos de investigação preambular em que estabelecidos acordos de delação premiada, a partir dos quais foram utilizados documentos que subsidiaram as ações penais contra eles instauradas — v. Informativo 480. Conheceu-se em parte da impetração e, na parte conhecida, por maioria, deferiu-se, parcialmente, o writ para determinar que a 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba/PR certifique quais foram as autoridades, judiciárias e do MPF, responsáveis pela propositura e homologação dos acordos de delação premiada firmados em relação a 2 delatores. Salientando que a delação premiada constitui elemento de prova, entendeu-se fundada, à primeira vista, a suspeita da impetração quanto à possível falta de isenção dos subscritores dos acordos de delação premiada, uma vez que os representantes do parquet que subscreveram as denúncias também foram, em tese, vítimas do paciente, sendo razoável supor a hipótese de que eles também firmaram tais acordos, em indesejável coincidência dos papéis de acusador e vítima. Afastou-se, contudo, a pretensão de se conferir publicidade aos citados acordos, cujo sigilo lhe é ínsito, inclusive por força de lei, aduzindo que ao paciente basta saber quem participou da confecção e homologação dos acordos, sendo pública e notória a condição dos delatores. Vencidos os Ministros Marco Aurélio que concedia a ordem em maior extensão, por considerar presente o interesse da defesa em conhecer também o teor da referida delação, e Menezes Direito que a denegava ao fundamento de que tal acordo, como um todo, estaria coberto pelo sigilo.
HC 90688/PR, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.2.2008. (HC-90688)

Segunda Turma

Competência Penal e Prevenção
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus impetrado contra decreto de prisão temporária expedido por Ministra do STJ a quem distribuído, por prevenção, inquérito em curso na Corte Especial daquele tribunal, originado de desmembramento, por ela determinado, de outro inquérito do qual relatora. A impetração sustenta a nulidade desse decreto, por ausência de competência da autoridade tida por coatora, sob a alegação de que o caso não comportaria o critério de prevenção disposto no art. 69, IV, do CPP, já que seriam distintos os fatos e pessoas envolvidos em ambos os inquéritos, devendo o feito ser distribuído livremente (CPP, “Art. 69. Determinará a competência jurisdicional: ...IV - a distribuição;”). O Min. Eros Grau, relator, indeferiu a ordem. Inicialmente, asseverou que a questão concernente à prisão temporária estaria prejudicada em conseqüência da revogação do ato que a ordenara, mas subsistiria o argumento de incompetência da relatora. Considerou inexistir, nos autos, informação de que a aludida Ministra tivesse sido provocada relativamente à falta de prevenção, circunstância que, em tese, poderia ensejar o não conhecimento da argüição de incompetência no STF. No ponto, reputou incidente o Enunciado da Súmula 706 do Supremo (“É relativa a nulidade decorrente da inobservância da competência penal por prevenção.”), bem como enfatizou que os impetrantes não demonstraram o prejuízo que a distribuição por prevenção causara ao paciente. Após, pediu vista o Min. Cezar Peluso.
HC 93163/BA, rel. Min. Eros Grau, 12.2.2008. (HC-93163)

Estabilidade Financeira e Cálculo de Gratificação de Pós-Graduação
A Turma acolheu embargos de declaração opostos pelo Estado de Santa Catarina contra acórdão que, em agravo regimental, mantivera decisão do Min. Gilmar Mendes que negara provimento a recurso extraordinário, do qual relator, ao fundamento de que a discussão estaria limitada ao âmbito da legislação infraconstitucional. No caso, o ora embargado, servidor público estadual, incorporara a sua remuneração a diferença entre o valor de vencimento de cargo comissionado anteriormente exercido e o valor dos vencimentos do cargo efetivo (vantagem financeira nominalmente identificada). Ocorre que o tribunal de justiça daquela unidade federativa reconhecera ao embargado o direito à percepção de “Gratificação de Pós-Graduação”, fixada sobre o valor do vencimento do cargo efetivo, cujo cálculo incidiria sobre a soma desse vencimento com a vantagem correspondente à agregação. Inicialmente, acolheram-se os embargos declaratórios, tendo em conta o reconhecimento de que a matéria versada nos autos possuiria cunho constitucional. Em seguida, proveu-se o recurso extraordinário por se entender que o acórdão impugnado estaria em confronto com a orientação firmada pela Corte no sentido de que, em se tratando de “estabilidade financeira”, seria legítimo que, por lei superveniente, sem ofensa a direito adquirido, o cálculo da vantagem fosse desvinculado, para o futuro, dos vencimentos do cargo em comissão outrora ocupado pelo servidor, passando a quantia a ela correspondente a ser reajustada segundo os critérios das revisões gerais de remuneração do funcionalismo. Precedentes citados: RE 293976 AgR/PE (DJU de 1º.6.2001); RE 358788 AgR/PE (DJU de 7.11.2003); RE 294009 AgR/PE (DJU de 25.6.2004); RE 437328/AM (DJU de 16.12.2004).
RE 353545 ED-AgR/SC, rel. Min. Gilmar Mendes, 12.2.2008. (RE-353545)

Sessões Ordinárias Extraordinárias Julgamentos
Pleno 13.2.2008 11 e 14.2.2008 33
1ª Turma 12.2.2008 —— 13
2ª Turma 12.2.2008 —— 319

Transcrições

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do Informativo STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Réu preso – Instrução processual – Direito de presença (Transcrições)

HC 93503 MC/SP*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: A GARANTIA CONSTITUCIONAL DA PLENITUDE DE DEFESA: UMA DAS PROJEÇÕES CONCRETIZADORAS DA CLÁUSULA DO “DUE PROCESS OF LAW”. CARÁTER GLOBAL E ABRANGENTE DA FUNÇÃO DEFENSIVA: DEFESA TÉCNICA E AUTODEFESA (DIREITO DE AUDIÊNCIA E DIREITO DE PRESENÇA). PACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS/ONU (ART. 14, N. 3, “D”) E CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS/OEA (ART. 8º, § 2º, “D” E “F”). DEVER DO ESTADO DE ASSEGURAR, AO RÉU PRESO, O EXERCÍCIO DESSA PRERROGATIVA ESSENCIAL, ESPECIALMENTE A DE COMPARECER À AUDIÊNCIA DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS, AINDA MAIS QUANDO ARROLADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. RAZÕES DE CONVENIÊNCIA ADMINISTRATIVA OU GOVERNAMENTAL NÃO PODEM LEGITIMAR O DESRESPEITO NEM COMPROMETER A EFICÁCIA E A OBSERVÂNCIA DESSA FRANQUIA CONSTITUCIONAL. DOUTRINA. PRECEDENTES. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.


DECISÃO: Os fundamentos que dão suporte a esta impetração revestem-se de inquestionável plausibilidade jurídica, pois o caso ora em exame põe em evidência uma controvérsia impregnada da mais alta relevância constitucional, consistente no pretendido reconhecimento de que assiste, ao réu preso, sob pena de nulidade absoluta, o direito de comparecer, mediante requisição do Poder Judiciário, à audiência de instrução processual em que serão inquiridas testemunhas arroladas pelo Ministério Público.

Tenho sustentado, nesta Suprema Corte, com apoio em autorizado magistério doutrinário (FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, “Processo Penal”, vol. 3/136, 10ª ed., 1987, Saraiva; FERNANDO DE ALMEIDA PEDROSO, “Processo Penal – O Direito de Defesa”, p. 240, 1986, Forense; JAQUES DE CAMARGO PENTEADO, “Acusação, Defesa e Julgamento”, p. 261/262, item n. 17, e p. 276, item n. 18.3, 2001, Millennium; ADA PELLEGRINI GRINOVER, “Novas Tendências do Direito Processual”, p. 10, item n. 7, 1990, Forense Universitária; ANTONIO SCARANCE FERNANDES, “Processo Penal Constitucional”, p. 280/281, item n. 26.10, 3ª ed., 2003, RT; ROGÉRIO LAURIA TUCCI, “Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro”, p. 189, item n. 7.2, 2ª ed., 2004, RT; ANTONIO MAGALHÃES GOMES FILHO, “Direito à Prova no Processo Penal”, p. 154/155, item n. 9, 1997, RT; VICENTE GRECO FILHO, “Tutela Constitucional das Liberdades”, p. 110, item n. 5, 1989, Saraiva; JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, “Direito Processual Penal”, vol. 1/431-432, item n. 3, 1974, Coimbra Editora, v.g.), que o acusado, embora preso, tem o direito de comparecer, de assistir e de presenciar, sob pena de nulidade absoluta, os atos processuais, notadamente aqueles que se produzem na fase de instrução do processo penal, que se realiza, sempre, sob a égide do contraditório, sendo irrelevantes, para esse efeito, “(...) as alegações do Poder Público concernentes à dificuldade ou inconveniência de proceder à remoção de acusados presos a outros pontos do Estado ou do País”, eis que “(...) alegações de mera conveniência administrativa não têm - e nem podem ter - precedência sobre as inafastáveis exigências de cumprimento e respeito ao que determina a Constituição” (RTJ 142/477-478, Rel. Min. CELSO DE MELLO).

Esse entendimento, hoje prevalecente em ambas as Turmas deste Tribunal (HC 85.200/RJ, Rel. Min. EROS GRAU – HC 86.634/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO), tem por suporte o reconhecimento – fundado na natureza dialógica do processo penal acusatório, impregnado, em sua estrutura formal, de caráter essencialmente democrático (JOSÉ FREDERICO MARQUES, “O Processo Penal na Atualidade”, “in” “Processo Penal e Constituição Federal”, p. 13/20, 1993, APAMAGIS/Ed. Acadêmica) - de que o direito de audiência, de um lado, e o direito de presença do réu, de outro, esteja ele preso ou não, traduzem prerrogativas jurídicas que derivam da garantia constitucional do “due process of law” e que asseguram, por isso mesmo, ao acusado, o direito de comparecer aos atos processuais a serem realizados perante o juízo processante, ainda que situado este em local diverso daquele em que esteja custodiado o réu.

Vale referir, neste ponto, ante a extrema pertinência de suas observações, o douto magistério de ROGÉRIO SCHIETTI MACHADO CRUZ (“Garantias Processuais nos Recursos Criminais”, p. 132/133, item n. 5.1, 2002, Atlas):

“A possibilidade de que o próprio acusado intervenha, direta e pessoalmente, na realização dos atos processuais, constitui, assim, a autodefesa (...).

Saliente-se que a autodefesa não se resume à partici­pação do acusado no interrogatório judicial, mas há de estender-se a todos os atos de que o imputado participe. (...).

Na verdade, desdobra-se a autodefesa em ‘direito de audiência’ e em ‘direito de presença’, é dizer, tem o acusado o direito de ser ouvido e falar durante os atos processuais (...), bem assim o direito de assistir à realização dos atos processuais, sendo dever do Estado facilitar seu exercício, máxime quando o imputado se encontre preso, impossibilitado de livremente deslocar-se ao fórum.” (grifei)

Incensurável, por isso mesmo, sob tal perspectiva, a decisão desta Suprema Corte, de que foi Relator o eminente Ministro LEITÃO DE ABREU, em acórdão assim ementado (RTJ 79/110):

“Habeas Corpus. Nulidade processual. O direito de estar presente à instrução criminal, conferido ao réu, assenta na cláusula constitucional que garante ao acusado ampla defesa. A violação desse direito importa nulidade absoluta, e não simplesmente relativa, do processo.

.......................................................

Nulidade do processo a partir dessa audiência.

Pedido deferido.” (grifei)

Cumpre destacar, nesse mesmo sentido, inúmeras outras decisões emanadas deste Supremo Tribunal Federal (RTJ 64/332 - RTJ 66/72 - RTJ 70/69 - RTJ 80/37 - RTJ 80/703), cabendo registrar, por relevante, julgamento em que esta Suprema Corte reconheceu essencial a presença do réu preso na audiência de inquirição de testemunhas arroladas pelo órgão da acusação estatal, sob pena de ofensa à garantia constitucional da plenitude de defesa:

“‘Habeas corpus’. Nulidade processual. O direito de estar presente à instrução criminal, conferido ao réu e seu defensor, assenta no princípio do contraditório. Ao lado da defesa técnica, confiada a profissional habilitado, existe a denominada autodefesa, através da presença do acusado aos atos processuais. (...).”
(RTJ 46/653, Rel. Min. DJACI FALCÃO – grifei)

Essa orientação, por sua vez, reflete-se no magistério jurisprudencial de outros Tribunais (RT 522/369 - RT 537/337 - RT 562/346 - RT 568/287 - RT 569/309 - RT 718/415):

“O direito conferido ao réu de estar presente à instrução criminal assenta-se na cláusula constitucional que garante ao acusado ampla defesa. A violação desse direito importa nulidade absoluta, e não apenas relativa, do processo.”
(RT 607/306, Rel. Des. BAPTISTA GARCIA - grifei)

Não constitui demasia assinalar, neste ponto, analisada a função defensiva sob uma perspectiva global, que o direito de presença do réu na audiência de instrução penal, especialmente quando preso, além de traduzir expressão concreta do direito de defesa (mais especificamente da prerrogativa de autodefesa), também encontra suporte legitimador em convenções interna­cionais que proclamam a essencialidade dessa franquia processual, que compõe o próprio estatuto constitucional do direito de defesa, enquanto complexo de princípios e de normas que amparam qualquer acusado em sede de persecução criminal, mesmo que se trate de réu processado por suposta prática de crimes hediondos ou de delitos a estes equiparados.

A justa preocupação da comunidade internacional com a preservação da integridade das garantias processuais básicas reconhecidas às pessoas meramente acusadas de práticas delituosas tem representado, em tema de proteção aos direitos humanos, um dos tópicos mais sensíveis e delicados da agenda dos organismos internacionais, seja em âmbito regional, como o Pacto de São José da Costa Rica (Artigo 8º, § 2º, “d” e “f”), aplicável ao sistema interamericano, seja em âmbito universal, como o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Artigo 14, n. 3, “d”), celebrado sob a égide da Organização das Nações Unidas, e que representam instrumentos que reconhecem, a qualquer réu, dentre outras prerrogativas eminentes, o direito de comparecer e de estar presente à instrução processual, independentemente de achar-se sujeito, ou não, à custódia do Estado.

Impende reconhecer, por extremamente relevante, que o entendimento que ora exponho na presente decisão tem, hoje, o beneplácito da jurisprudência que ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal firmaram na matéria em causa:

“‘HABEAS CORPUS’. EXTORSÃO MEDIANTE SEQÜESTRO. PACIENTE PRESA EM SÃO PAULO, RESPONDENDO À AÇÃO PENAL NO RIO DE JANEIRO. CONDENAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA: AUSÊNCIA DA RÉ NOS ATOS PROCESSUAIS. IMPOSSIBILIDADE DE ENTREVISTAR-SE COM A DEFENSORA NOMEADA EM OUTRA UNIDADE DA FEDERAÇÃO.

1. Paciente condenada por crime de extorsão mediante seqüestro. Ação penal em curso no Rio de Janeiro. Paciente presa em São Paulo. Ausência de contato com o processo em que figurou como ré. Impossibilidade de indicar testemunhas e de entrevistar-se com a Defensora Pública designada no Rio de Janeiro. Cerceamento de defesa.

2. A falta de recursos materiais a inviabilizar as garantias constitucionais dos acusados em processo penal é inadmissível, na medida em que implica disparidade dos meios de manifestação entre a acusação e a defesa, com graves reflexos em um dos bens mais valiosos da vida, a liberdade.

3. A circunstância de que a paciente poderia contatar a Defensora Pública por telefone e cartas, aventada no ato impugnado, não tem a virtude de sanar a nulidade alegada, senão o intuito de contorná-la, resultando franco prejuízo à defesa, sabido que a comunicação entre presos e pessoas alheias ao sistema prisional é restrita ou proibida.

Ordem concedida.”
(HC 85.200/RJ, Rel. Min. EROS GRAU, Primeira Turma – grifei)

“‘HABEAS CORPUS’ - INSTRUÇÃO PROCESSUAL - RÉU PRESO - PRETENDIDO COMPARECIMENTO À AUDIÊNCIA PENAL - PLEITO RECUSADO - REQUISIÇÃO JUDICIAL NEGADA SOB FUNDAMENTO DA PERICULOSIDADE DO ACUSADO - INADMISSIBILIDADE - A GARANTIA CONSTITUCIONAL DA PLENITUDE DE DEFESA: UMA DAS PROJEÇÕES CONCRETIZADORAS DA CLÁUSULA DO ‘DUE PROCESS OF LAW’ - CARÁTER GLOBAL E ABRANGENTE DA FUNÇÃO DEFENSIVA: DEFESA TÉCNICA E AUTODEFESA (DIREITO DE AUDIÊNCIA E DIREITO DE PRESENÇA) - PACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS/ONU (ARTIGO 14, N. 3, ‘D’) E CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS/OEA (ARTIGO 8º, § 2º, ‘D’ E ‘F’) - DEVER DO ESTADO DE ASSEGURAR, AO RÉU PRESO, O EXERCÍCIO DESSA PRERROGATIVA ESSENCIAL, ESPECIALMENTE A DE COMPARECER À AUDIÊNCIA DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS, AINDA MAIS QUANDO ARROLADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO - RAZÕES DE CONVENIÊNCIA ADMINISTRATIVA OU GOVERNAMENTAL NÃO PODEM LEGITIMAR O DESRESPEITO NEM COMPROMETER A EFICÁCIA E A OBSERVÂNCIA DESSA FRANQUIA CONSTITUCIONAL - NULIDADE PROCESSUAL ABSOLUTA - AFASTAMENTO, EM CARÁTER EXCEPCIONAL, NO CASO CONCRETO, DA INCIDÊNCIA DA SÚMULA 691/STF – ‘HABEAS CORPUS’ CONCEDIDO DE OFÍCIO.

- O acusado, embora preso, tem o direito de comparecer, de assistir e de presenciar, sob pena de nulidade absoluta, os atos processuais, notadamente aqueles que se produzem na fase de instrução do processo penal, que se realiza, sempre, sob a égide do contraditório. São irrelevantes, para esse efeito, as alegações do Poder Público concernentes à dificuldade ou inconveniência de proceder à remoção de acusados presos a outros pontos do Estado ou do País, eis que razões de mera conveniência administrativa não têm - nem podem ter - precedência sobre as inafastáveis exigências de cumprimento e respeito ao que determina a Constituição. Doutrina. Jurisprudência.

- O direito de audiência, de um lado, e o direito de presença do réu, de outro, esteja ele preso ou não, traduzem prerrogativas jurídicas essenciais que derivam da garantia constitucional do ‘due process of law’ e que asseguram, por isso mesmo, ao acusado, o direito de comparecer aos atos processuais a serem realizados perante o juízo processante, ainda que situado este em local diverso daquele em que esteja custodiado o réu. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos/ONU (Artigo 14, n. 3, ‘d’) e Convenção Americana de Direitos Humanos/OEA (Artigo 8º, § 2º, ‘d’ e ‘f’).

- Essa prerrogativa processual reveste-se de caráter fundamental, pois compõe o próprio estatuto constitucional do direito de defesa, enquanto complexo de princípios e de normas que amparam qualquer acusado em sede de persecução criminal, mesmo que se trate de réu processado por suposta prática de crimes hediondos ou de delitos a estes equiparados. Precedentes.”
(HC 86.634/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma)

Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, defiro o pedido de medida cautelar, para suspender, provisoriamente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, os efeitos da decisão proferida pelo E. Superior Tribunal de Justiça nos autos do REsp 906.361/SP, assegurando-se, em conseqüência, ao ora paciente, o direito de permanecer em liberdade, se por al não estiver preso.

Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão ao eminente Senhor Ministro-Relator do REsp 906.361/SP (STJ), ao E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (Apelação Criminal nº 419.716-3/9-00) e ao MM. Juiz de Direito da 4ª Vara Criminal da comarca de Campinas/SP (Ação Penal nº 175/2002).

Publique-se.

Brasília, 08 de fevereiro de 2008.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJE de 14.2.2008

Persecução penal - Sigilo - Direito de acesso do advogado, quando constituído (Transcrições)

HC 93767 MC/DF*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO


EMENTA: PERSECUÇÃO PENAL INSTAURADA EM JUÍZO OU FORA DELE. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO OU PELO RÉU. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL OU ACUSAÇÃO CRIMINAL EM JUÍZO. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA PERSECUÇÃO PENAL (INQUÉRITO POLICIAL OU PROCESSO JUDICIAL). POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.

- A pessoa que sofre persecução penal, em juízo ou fora dele, é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal.

- O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de persecução penal, mesmo que sujeita, em juízo ou fora dele, a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorpora­das ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüente­mente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito ou processo judicial. Precedentes. Doutrina.


DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, com pedido de medida liminar, impetrado contra decisão emanada de eminente Ministra de Tribunal Superior da União, que, em sede de processo idêntico ainda em curso no Superior Tribunal de Justiça (HC 99.402/DF), denegou medida liminar que lhe havia sido requerida em favor do ora paciente.

Presente tal contexto, impende verificar, desde logo, se a situação processual versada nestes autos, justifica, ou não, o afastamento, sempre excepcional, da Súmula 691/STF.

Como se sabe, o Supremo Tribunal Federal, ainda que em caráter extraordinário, tem admitido o afastamento, “hic et nunc”, da Súmula 691/STF, em hipóteses nas quais a decisão questionada divirja da jurisprudência predominante nesta Corte ou, então, veicule situações configuradoras de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade (HC 85.185/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 86.634-MC/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO - HC 86.864-MC/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - HC 87.468/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 89.025-MC-AgR/SP, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA - HC 90.112-MC/PR, Rel. Min. CEZAR PELUSO, v.g.).

Parece-me que a situação exposta nesta impetração ajusta-se às hipóteses que autorizam a superação do obstáculo representado pela Súmula 691/STF. Passo, em conseqüência, a examinar a postulação cautelar ora deduzida nesta sede processual.

O caso ora em exame põe em evidência, uma vez mais, situação impregnada de alto relevo jurídico-constitucional, consideradas as graves implicações que o regime de sigilo – necessariamente excepcional – impõe ao exercício, em plenitude, do direito de defesa e à prática, pelo Advogado, das prerrogativas profissionais que lhe são inerentes (Lei nº 8.906/94, art. 7º, incisos XIII e XIV).

O Estatuto da Advocacia - ao dispor sobre o acesso do Advogado investido de mandato aos procedimentos estatais que tramitam em regime de sigilo – assegura-lhe, como típica prerrogativa de ordem profissional, o direito de examinar os autos, sempre em benefício de seu constituinte, e em ordem a viabilizar, quanto a este, o exercício do direito de conhecer os dados probatórios já formalmente produzidos no âmbito da investigação penal, para que se possibilite a prática de direitos básicos de que também é titular aquele contra quem foi instaurada, pelo Poder Público, determinada persecução criminal.

Nem se diga, por absolutamente inaceitável, considerada a própria declaração constitucional de direitos, que a pessoa sob persecução penal (em juízo ou fora dele) mostrar-se-ia destituída de direitos e garantias. Esta Suprema Corte jamais poderia legitimar tal entendimento, pois a razão de ser do sistema de liberdades públicas vincula-se, em sua vocação protetiva, a amparar o cidadão contra eventuais excessos, abusos ou arbitrariedades emanados do aparelho estatal.

Cabe relembrar, no ponto, por necessário, a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal em torno da matéria pertinente à posição jurídica que o indiciado – e, com maior razão, o próprio réu - ostenta em nosso sistema normativo, e que lhe reconhece direitos e garantias inteiramente oponíveis ao poder do Estado, por parte daquele que sofre a persecução penal:

“INQUÉRITO POLICIAL - UNILATERALIDADE - A SITUAÇÃO JURÍDICA DO INDICIADO.
- O inquérito policial, que constitui instrumento de investigação penal, qualifica-se como procedimento administrativo destinado a subsidiar a atuação persecutória do Ministério Público, que é - enquanto ‘dominus litis’ - o verdadeiro destinatário das diligências executadas pela Polícia Judiciária.

A unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao indiciado, que não mais pode ser considerado mero objeto de investigações.

O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais, cuja inobservância, pelos agentes do Estado, além de eventualmente induzir-lhes a responsabilidade penal por abuso de poder, pode gerar a absoluta desvalia das provas ilicitamente obtidas no curso da investigação policial.”
(RTJ 168/896-897, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Não custa advertir, como já tive o ensejo de acentuar em decisão proferida no âmbito desta Suprema Corte (MS 23.576/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO), que o respeito aos valores e princípios sobre os quais se estrutura, constitucionalmente, a organização do Estado Democrático de Direito, longe de comprometer a eficácia das investigações penais, configura fator de irrecusável legitimação de todas as ações lícitas desenvolvidas pela Polícia Judiciária, pelo Ministério Público ou pelo próprio Poder Judiciário.

A pessoa contra quem se instaurou persecução penal - não importa se em juízo ou fora dele - não se despoja, mesmo que se cuide de simples indiciado, de sua condição de sujeito de determinados direitos e de senhor de garantias indisponíveis, cujo desrespeito só põe em evidência a censurável (e inaceitável) face arbitrária do Estado, a quem não se revela lícito desconhecer que os poderes de que dispõe devem conformar-se, necessariamente, ao que prescreve o ordenamento positivo da República.

Esse entendimento - que reflete a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal construída sob a égide da vigente Constituição - encontra apoio na lição de autores eminentes, que, não desconhecendo que o exercício do poder não autoriza a prática do arbítrio, enfatizam que, mesmo em procedimentos inquisitivos instaurados no plano da investigação policial, há direitos titularizados pelo indiciado, que simplesmente não podem ser ignorados pelo Estado.

Cabe referir, nesse sentido, o magistério de FAUZI HASSAN CHOUKE (“Garantias Constitucionais na Investigação Criminal”, p. 74, item n. 4.2, 1995, RT), de ADA PELLEGRINI GRINOVER (“A Polícia Civil e as Garantias Constitucionais de Liberdade”, “in” “A Polícia à Luz do Direito”, p. 17, 1991, RT), de ROGÉRIO LAURIA TUCCI (“Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro”, p. 383, 1993, Saraiva), de ROBERTO MAURÍCIO GENOFRE (“O Indiciado: de Objeto de Investigações a Sujeito de Direitos”, “in” “Justiça e Democracia”, vol. 1/181, item n. 4, 1996, RT), de PAULO FERNANDO SILVEIRA (“Devido Processo Legal - Due Process of Law”, p. 101, 1996, Del Rey), de ROMEU DE ALMEIDA SALLES JUNIOR (“Inquérito Policial e Ação Penal”, p. 60/61, item n. 48, 7ª ed., 1998, Saraiva) e de LUIZ CARLOS ROCHA (“Investigação Policial - Teoria e Prática”, p. 109, item n. 2, 1998, Saraiva), dentre outros.

Impende destacar, de outro lado, precisamente em face da circunstância de o indiciado (e com maior razão, o réu em juízo criminal) ser, ele próprio, sujeito de direitos, que o Advogado por ele regularmente constituído (como sucede no caso) tem direito de acesso aos autos da investigação (ou do processo) penal, não obstante em tramitação sob regime de sigilo, considerada a essencialidade do direito de defesa, que há de ser compreendido - enquanto prerrogativa indisponível assegurada pela Constituição da República - em perspectiva global e abrangente.

É certo, no entanto, em ocorrendo a hipótese excepcional de sigilo - e para que não se comprometa o sucesso das providências investigatórias em curso de execução (a significar, portanto, que se trata de providências ainda não formalmente incorporadas ao procedimento de investigação) -, que o acusado (e, até mesmo, o mero indiciado), por meio de Advogado por ele constituído, tem o direito de conhecer as informações “já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução das diligências em curso (...)” (RTJ 191/547-548, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei).

Vê-se, pois, que assiste, àquele sob persecução penal do Estado, o direito de acesso aos autos, por intermédio de seu Advogado, que poderá examiná-los, extrair cópias ou tomar apontamentos (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIV), observando-se, quanto a tal prerrogativa, orientação consagrada em decisões proferidas por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 90.232/AM, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - Inq 1.867/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO – MS 23.836/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, v.g.), mesmo quando a persecução estatal, como no caso, esteja sendo processada em caráter sigiloso, hipótese em que o Advogado do acusado, desde que por este constituído (como sucede na espécie), poderá ter acesso às peças que digam respeito à pessoa do seu cliente e que instrumentalizem prova já produzida nos autos, tal como esta Corte decidiu no julgamento do HC 82.354/PR, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE (RTJ 191/547-548):

“Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado - interessado primário no procedimento administrativo do inquérito policial -, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado, de acesso aos autos respectivos, explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia (L. 8906/94, art. 7º, XIV), da qual - ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas - não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade.

A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações.

O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em conseqüência, a autoridade policial, de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório.” (grifei)

Esse mesmo entendimento foi por mim reiterado, quando do julgamento de pleito cautelar que apreciei em decisão assim ementada:

“INQUÉRITO POLICIAL. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA INVESTIGAÇÃO PENAL. POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.

- O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal.

- O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de investigação penal, mesmo que sujeita a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito. Precedentes. Doutrina.”
(HC 87.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 02/02/2007)

Os eminentes Advogados ALBERTO ZACHARIAS TORON e ALEXANDRA LEBELSON SZAFIR, em recentíssima obra - que versa, dentre outros temas, aquele ora em análise (“Prerrogativas Profissionais do Advogado”, p. 86, item n. 1, 2006, OAB Editora) -, examinaram, com precisão, a questão suscitada pela injusta recusa, ao Advogado investido de procuração (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIII), de acesso aos autos de inquérito policial ou de processo penal que tramitem, excepcionalmente, em regime de sigilo, valendo rememorar, a esse propósito, a seguinte passagem:

“No que concerne ao inquérito policial há regra clara no Estatuto do Advogado que assegura o direito aos advogados de, mesmo sem procuração, ter acesso aos autos (art. 7°, inc. XIV) e que não é excepcionada pela disposição constante do § 1° do mesmo artigo que trata dos casos de sigilo. Certo é que o inciso XIV do art. 7° não fala a respeito dos inquéritos marcados pelo sigilo. Todavia, quando o sigilo tenha sido decretado, basta que se exija o instrumento procuratório para se viabilizar a vista dos autos do procedimento investigatório. Sim, porque inquéritos secretos não se compatibilizam com a garantia de o cidadão ter ao seu lado um profissional para assisti-lo, quer para permanecer calado, quer para não se auto-incriminar (CF, art. 5°, LXIII). Portanto, a presença do advogado no inquérito e, sobretudo, no flagrante não é de caráter afetivo ou emocional. Tem caráter profissional, efetivo, e não meramente simbólico. Isso, porém, só ocorrerá se o advogado puder ter acesso aos autos. Advogados cegos, ‘blind lawyers’, poderão, quem sabe, confortar afetivamente seus assistidos, mas, juridicamente, prestar-se-ão, unicamente, a legitimar tudo o que no inquérito se fizer contra o indiciado.” (grifei)

Cumpre referir, ainda, que a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o HC 88.190/RJ, Rel. Min. CEZAR PELUSO, reafirmou o entendimento anteriormente adotado por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 87.827/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), em julgamento que restou consubstanciado em acórdão assim ementado:

“ADVOGADO. Investigação sigilosa do Ministério Público Federal. Sigilo inoponível ao patrono do suspeito ou investigado. Intervenção nos autos. Elementos documentados. Acesso amplo. Assistência técnica ao cliente ou constituinte. Prerrogativa profissional garantida. Resguardo da eficácia das investigações em curso ou por fazer. Desnecessidade de constarem dos autos do procedimento investigatório. HC concedido. Inteligência do art. 5°, LXIII, da CF, art. 20 do CPP, art. 7º, XIV, da Lei nº 8.906/94, art. 16 do CPPM, e art. 26 da Lei nº 6.368/76. Precedentes. É direito do advogado, suscetível de ser garantido por habeas corpus, o de, em tutela ou no interesse do cliente envolvido nas investigações, ter acesso amplo aos elementos que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária ou por órgão do Ministério Público, digam respeito ao constituinte.” (grifei)

Cabe assinalar, neste ponto, um outro aspecto relevante do tema ora em análise, considerados os diversos elementos probatórios já produzidos nos autos da persecução penal e, portanto, a estes já formalmente incorporados. Refiro-me ao postulado da comunhão da prova, cuja eficácia projeta-se e incide sobre todos os dados informativos, que, concernentes à “informatio delicti”, compõem o acervo probatório coligido pelas autoridades e agentes estatais.

Esse postulado assume inegável importância no plano das garantias de ordem jurídica reconhecidas ao investigado e ao réu, pois, como se sabe, o princípio da comunhão (ou da aquisição) da prova assegura, ao que sofre persecução penal – ainda que submetida esta ao regime de sigilo -, o direito de conhecer os elementos de informação já existentes nos autos e cujo teor possa ser, eventualmente, de seu interesse, quer para efeito de exercício da auto-defesa, quer para desempenho da defesa técnica.

É que a prova penal, uma vez regularmente introduzida no procedimento persecutório, não pertence a ninguém, mas integra os autos do respectivo inquérito ou processo, constituindo, desse modo, acervo plenamente acessível a todos quantos sofram, em referido procedimento sigiloso, atos de persecução penal por parte do Estado.

Essa compreensão do tema – cabe ressaltar - é revelada por autorizado magistério doutrinário (ADALBERTO JOSÉ Q. T. DE CAMARGO ARANHA, “Da Prova no Processo Penal”, p. 31, item n. 3, 3ª ed., 1994, Saraiva; DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, “O Princípio da Comunhão da Prova”, “in” Revista Dialética de Direito Processual (RDPP), vol. 31/19-33, 2005; FERNANDO CAPEZ, “Curso de Processo Penal”, p. 259, item n. 17.7, 7ª ed., 2001, Saraiva; MARCELLUS POLASTRI LIMA, “A Prova Penal”, p. 31, item n. 2, 2ª ed., 2003, Lumen Juris, v.g.), valendo referir, por extremamente relevante, a lição expendida por JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA (“O Juiz e a Prova”, “in” Revista de Processo, nº 35, Ano IX, abril/junho de 1984, p. 178/184):

“E basta pensar no seguinte: se a prova for feita, pouco importa a sua origem. (...). A prova do fato não aumenta nem diminui de valor segundo haja sido trazida por aquele a quem cabia o ônus, ou pelo adversário. A isso se chama o ‘princípio da comunhão da prova’: a prova, depois de feita, é comum, não pertence a quem a faz, pertence ao processo; pouco importa sua fonte, pouco importa sua proveniência. (...).” (grifei)

Cumpre rememorar, ainda, ante a sua inteira pertinência, o magistério de PAULO RANGEL (“Direito Processual Penal”, p. 411/412, item n. 7.5.1, 8ª ed., 2004, Lumen Juris):

“A palavra comunhão vem do latim ‘communione’, que significa ato ou efeito de comungar, participação em comum em crenças, idéias ou interesses. Referindo-se à prova, portanto, quer-se dizer que a mesma, uma vez no processo, pertence a todos os sujeitos processuais (partes e juiz), não obstante ter sido levada apenas por um deles. (...).

O princípio da comunhão da prova é um consectário lógico dos princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico processual, pois as partes, a fim de estabelecer a verdade histórica nos autos do processo, não abrem mão do meio de prova levado para os autos.

(...) Por conclusão, os princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico-processual fazem com que as provas carreadas para os autos pertençam a todos os sujeitos processuais, ou seja, dão origem ao princípio da comunhão das provas.” (grifei)

Nem se diga que a existência de co-indiciados (ou de co-réus) poderia obstar o exercício do direito de acesso à prova penal já formalmente introduzida nos autos da persecução estatal. É que, mesmo que haja co-réus (ou co-indiciados), a concessão da presente medida cautelar, ainda assim, garantirá, ao ora paciente (por intermédio dos Advogados por ele constituídos), acesso a toda e qualquer prova, desde que formalmente incorporada aos autos, especialmente porque a tanto o autoriza o postulado da comunhão da prova.

É por tal razão que se impõe assegurar, ao ora paciente, por intermédio dos patronos que constituiu, o acesso a toda informação já produzida e formalmente incorporada aos autos da persecução penal em causa, mesmo porque o conhecimento do acervo probatório pode revestir-se de particular relevo para a própria defesa do paciente em questão.

É fundamental, como salientado, para o efeito referido nesta decisão, que os elementos probatórios já tenham sido formalmente produzidos nos autos da persecução penal.

O que não se revela constitucionalmente lícito, segundo entendo, é impedir que o réu (ou indiciado, quando for o caso) tenha pleno acesso aos dados probatórios, que, já documentados nos autos (porque a estes formalmente incorporados), veiculam informações que possam revelar-se úteis ao conhecimento da verdade real e à condução da defesa da pessoa investigada ou processada pelo Estado, não obstante o regime de sigilo excepcionalmente imposto ao procedimento de persecução penal.

O fascínio do mistério e o culto ao segredo não devem estimular, no âmbito de uma sociedade livre, práticas estatais cuja realização, notadamente na esfera penal, culmine em ofensa aos direitos básicos daquele que é submetido, pelos órgãos e agentes do Poder, a atos de persecução criminal, valendo relembrar, por oportuno, a advertência de JOÃO BARBALHO feita em seus comentários à Constituição Federal de 1891 (“Constituição Federal Brasileira – Comentários”, p. 323/324, edição fac-similar, 1992, Senado Federal):

“O pensamento de facilitar amplamente a defesa dos acusados conforma-se bem com o espírito liberal das disposições constitucionais relativas à liberdade individual, que vamos comentando. A lei não quer a perdição daqueles que a justiça processa; quer só que bem se apure a verdade da acusação e, portanto, todos os meios e expedientes de defesa que não impeçam o descobrimento dela devem ser permitidos aos acusados. A lei os deve facultar com largueza, regularizando-os para não tornar tumultuário o processo.

Com a ‘plena defesa’ são incompatíveis, e, portanto, inteiramente inadmissíveis, os processos secretos, inquisitoriais, as devassas, a queixa ou o depoimento de inimigo capital, o julgamento de crimes inafiançáveis na ausência do acusado ou tendo-se dado a produção das testemunhas de acusação sem ao acusado se permitir reinquiri-las, a incomunicabilidade depois da denúncia, o juramento do réu, o interrogatório dele sob a coação de qualquer natureza, por perguntas sugestivas ou capciosas, e em geral todo o procedimento que de qualquer maneira embarace a defesa.

Felizmente, nossa legislação ordinária sobre a matéria realiza o propósito da Constituição, cercando das precisas garantias do exercício desse inauferível direito dos acusados – para ela ‘res sacra reus’” (grifei)

Em conclusão, e tal como decidi no MS 24.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO (Informativo/STF nº 331), cumpre enfatizar, por necessário, que os estatutos do poder, numa República fundada em bases democráticas, não podem privilegiar o mistério.

A Assembléia Nacional Constituinte, em momento de feliz inspiração, repudiou o compromisso do Estado com o mistério e com o sigilo, que fora tão fortemente realçado sob a égide autoritária do regime político anterior (1964-1985), quando no desempenho de sua prática governamental.

Ao dessacralizar o segredo, como proclamou esta Corte Suprema (RTJ 139/712-713, Rel. Min. CELSO DE MELLO), a Assembléia Constituinte restaurou velho dogma republicano e expôs o Estado, em plenitude, ao princípio democrático da publicidade, convertido, em sua expressão concreta, em fator de legitimação das decisões e dos atos governamentais.

É preciso não perder de perspectiva que a Constituição da República não privilegia o sigilo, nem permite que este se transforme em “praxis” governamental, sob pena de grave ofensa ao princípio democrático, pois, consoante adverte NORBERTO BOBBIO, em lição magistral sobre o tema (“O Futuro da Democracia”, 1986, Paz e Terra), não há, nos modelos políticos que consagram a democracia, espaço possível reservado ao mistério.

Tenho por inquestionável, por isso mesmo, que a exigência de publicidade dos atos que se formam no âmbito do aparelho de Estado traduz conseqüência que resulta de um princípio essencial, a que a nova ordem jurídico-constitucional vigente em nosso País não permaneceu indiferente, revestindo-se de excepcio­nalidade, por isso mesmo, a instauração do regime de sigilo nos procedimentos penais, consideradas, para tanto, razões legítimas de interesse público, cuja verificação, no entanto, não tem o condão de suprimir ou de comprometer a eficácia de direitos e garantias fundamentais que assistem a qualquer pessoa sob investigação ou persecução penal do Estado, independentemente da natureza e da gravidade do delito supostamente praticado.

Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a suspender, cautelarmente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, o curso do Processo-crime nº 2007.01.1.122602-4, ora em tramitação perante a 1ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF, sustando, em conseqüência, a realização do interrogatório judicial do ora paciente, com data já designada para o próximo dia 05/03/2008 (fls. 48), ressalvada a prática de atos processuais de urgência ou, se necessário, a produção antecipada das provas consideradas inadiáveis.

Estendo, ainda, referido provimento cautelar, aos demais litisconsortes penais passivos, que, nessa condição, figuram no mesmo procedimento penal instaurado contra o ora paciente (Processo-crime nº 2007.01.1.122602-4) perante a 1ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF.

Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão à eminente Senhora Ministra-Relatora do HC 99.402/DF (STJ), ao E. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (HC 2007.00.2.014019-8) e ao MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF (Processo-crime nº 2007.01.1.122602-4).

Publique-se.

Brasília, 12 de fevereiro de 2008.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJE de 18.2.2008


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