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sexta-feira, 29 de maio de 2009

IMPORTANTE!!! JULGAMENTO ADIN 3934-2 NOVA LEI DE FALÊNCIAS

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.934-2 DISTRIT2 DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. RICARDO LEWANDOWSKI REQUERENTE(S) : PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA ADVOGADO(A/S) : SEBASTIÃO JOSÉ DA MOTTA E OUTRO(A/S) REQUERIDO(A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA ADVOGADO(A/S) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO REQUERIDO(A/S) : CONGRESSO NACIONAL INTERESSADO(A/S) : SINDICATO NACIONAL DOS AEROVIÁRIOS ADVOGADO(A/S) : ELIASIBE DE CARVALHO SIMÕES E OUTROS ADVOGADO(A/S) : DAMARES MEDINA INTERESSADO(A/S) : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA
CNI ADVOGADO(A/S) : SÉRGIO MURILO SANTOS CAMPINHO E OUTRO(A/S) ADVOGADO(A/S) : CASSIO AUGUSTO MUNIZ BORGES
RELATÓRIO
O Sr. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI: Trata-se de
ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida
liminar, proposta pelo Partido Democrático Trabalhista –
PDT, na qual impugna os arts. 60, parágrafo único, 83, I e
IV, c, e 141, II, da Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005,
que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a
falência do empresário e da sociedade empresária, por
entender incompatíveis com o disposto nos arts. 1º, III e
IV, 6º, 7º, I, e 170, VIII, da Constituição Federal.
Os dispositivos atacados possuem o seguinte
teor:
“Art. 60. Se o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, o juiz ordenará a sua realização, observado o disposto no art. 142 desta Lei.
Parágrafo único. O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, observado o disposto no § 1º do art. 141 desta Lei”.
“Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:
I – os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidente de trabalho;
(...); VI – créditos quirografários, a saber: (...); c) os saldos dos créditos derivados
da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inciso I do caput deste artigo”.
“Art. 141. Na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive da empresa ou de suas filiais, promovida sob qualquer das modalidades de que trata este artigo:
(...).
II. O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho”. Em primeiro lugar, o requerente identifica nos
dispositivos impugnados inconstitucionalidade de natureza
formal, pois teriam disciplinado matéria relativa à
“despedida arbitrária ou sem justa causa”, por lei
ordinária, a qual, no seu entender, somente poderia ser
regulada por lei complementar, a teor do art. 7º, I, da Carta Magna.
Depois, o requerente encontra neles inconstitucionalidade de ordem material, porquanto, ao liberarem os arrematantes de empresas alienadas judicialmente das obrigações trabalhistas, tornando-os imunes aos ônus de sucessão, estariam afrontando os valores constitucionais da dignidade da pessoa humana, do trabalho e do pleno emprego, abrigados nos arts. 1º, III e IV, 6º e 170, VIII, da Lei Maior.
Outra inconstitucionalidade material flagrada pelo requerente é a qualificação, como quirografários, dos créditos derivados da legislação do trabalho que ultrapassem 150 (cento e cinquenta) salários mínimos, porque tal disposição violaria a garantia do direito adquirido e a vedação de tomar-se o salário mínimo como referência de qualquer natureza, tratados nos arts. 5º, XXXVI, e 7º, IV, da Constituição.
Segundo o requerente, o regramento impugnado, nesse aspecto
“passará a constituir caminho fácil para o desrespeito aos direitos adquiridos pelos empregados no curso da relação desenvolvida com
seu empregador, que vindo a prestigiar outros credores comuns e, uma vez acumulando com eles grandes dívidas, delas poderá se livrar com a simples realização de uma alienação judicial em falência” (fl. 9).
Com esses argumentos, alinhavados em resumo,
almeja ver reconhecida a procedência da ação para que seja
declarada
“a inconstitucionalidade do artigo 83, incisos I e VI, letra ‘c’ da Lei 11.101/05, na parte em que limita os créditos trabalhistas em falência ou recuperação judicial ao montante de 150 (cento e cinquenta) salários mínimos e do artigo 141, inciso II, da mesma Lei 11.101/05, na parte em que isenta o adquirente de empresa, filial ou unidade produtiva, nos casos de falência, de obrigações de natureza trabalhista, ambos com efeito ex tunc.”
E, ainda,
“seja dada interpretação conforme ao artigo 60, parágrafo único, da mesma norma (Lei 11.101/2005), de modo a que seja esclarecido que os adquirentes de unidades produtivas ou empresas, em processos de recuperação judicial, respondem pelas obrigações derivadas da legislação do trabalho” (fls. 22-23).
Às fls. 166-184, a Presidência da República, em
síntese, informou que
“os dispositivos atacados (...) longe de afrontar a Lei Maior, cumprem-na
rigorosamente, prestigiando exatamente a dignidade da pessoa humana, o emprego e o trabalho.
Fazem-no (...) dentro do contexto excepcionalíssimo de uma situação de insolvência, em que a recuperação não comporta a observância dos mesmos parâmetros da normalidade, sob pena de em lugar de se garantir aos trabalhadores o que é possível, não se poder lhes garantir nada, pelo fato consumado da falta absoluta de recursos (...).
(...).
A rigor, a exordial está arguindo a inconstitucionalidade do pagamento escalonado e a constitucionalidade da insolvência e de pagamento nenhum”.
O Advogado-Geral da União, às fls. 187-205,
opinou pelo não conhecimento da ação quanto ao art. 60,
parágrafo único, por ser a “interpretação pretendida pelo
autor (...) exatamente oposta àquela oferecida pela norma
entendida de forma singela e literal”, bem como pela
improcedência do pedido quanto aos demais dispositivos, em
parecer assim ementado:
“Comercial. Lei de Falências (Lei nº 11.101/2005). Novos paradigmas. Interesse social na preservação da empresa e dos postos de trabalho. Constitucionalidade dos arts. 60, parágrafo único; 83, I e VI, ‘c’, e 141, II, da Nova Lei de Falências. Manifestação pelo não conhecimento da impugnação quanto ao art. 60, parágrafo único, da lei, e pela improcedência do pedido com relação aos demais dispositivos” (fl. 187).
Às fls. 207-217, o Congresso Nacional suscitou,
em preliminar, o não conhecimento da ação, pois não teria
sido incluído no pedido o § 2º do art. 141 da Lei 11.101/2005, que ostenta a seguinte redação:
“§ 2º Empregados do devedor contratados pelo arrematante serão admitidos mediante novos contratos de trabalho e o arrematante não responde por obrigações decorrentes do contrato anterior”.
De acordo com o Advogado-Geral do Congresso
Nacional,
“mesmo a eventual procedência da ação deixaria remanescer no mundo jurídico aquela norma não impugnada, com manutenção da situação derivada de seu comando.
E, face à impossibilidade de conhecimento jurisdicional ex officio da matéria, não resta outro caminho além do não conhecimento da presente ação direta” (fl. 212).
No mérito, repete, em linhas gerais, os
argumentos da Presidência da República.
Às fls. 219-227, o Procurador-Geral da República
manifestou-se pela improcedência do pedido, em parecer que
recebeu a ementa abaixo transcrita:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 60, PARÁGRAFO ÚNICO, 83, INCISOS I E VI, LETRA ‘C’, E 141, INCISO II, DA LEI 11.101/2005, QUE REGULA A RECUPERAÇÃO JUDICIAL, A EXTRATERRITORIALIDADE E A FALÊNCIA DO EMPRESÁRIO E DA SOCIEDADE
EMPRESÁRIA. NÃO CONHECIMENTO DA AÇÃO, COM RELAÇÃO AOS ARTS. 60 E 141, POR CARÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DA ÍNTEGRA DO COMPLEXO NORMATIVO ATINENTE AO TEMA. MÉRITO. SUCESSÃO DE ENCARGOS TRABALHISTAS NAS ALIENAÇÕES DO ATIVO DE EMPRESAS SUJEITAS À RECUPERAÇÃO JUDICIAL OU FALÊNCIA. RESPEITO AOS DIREITOS SOCIAIS, À CONTINUAÇÃO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL E À PRESERVAÇÃO DE EMPREGOS. CRÉDITOS TRABALHISTAS EM MONTANTE SUPERIOR A 150 SALÁRIOS MÍNIMOS. CONVERSÃO EM QUIROGRAFÁRIOS. RAZOABILIDADE E RESPEITO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. PARECER PELA IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO” (fl. 219).
O Sindicato Nacional dos Aeroviários, às fls.
228-246, pleiteou seu ingresso na presente ação na
qualidade de amicus curiae. O pedido foi deferido às fls.
344-345.
Às fls. 351-362, a Confederação Nacional da
Indústria – CNI também postulou seu ingresso como amicus
curiae, sendo o pleito deferido às fls. 397-398.
Igualmente, a Gol Transportes Aéreos S.A
pretendeu ingressar nos autos nas mesmas condições, as fls.
392-394, mas seu pedido foi indeferido, às fls. 400-401.
É o relatório, cujas cópias serão distribuídas
aos Exmos. Srs. Ministros.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.934-2 DISTRIT2 DISTRITO FEDERAL
VOTO
O Sr. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI (Relator): Examino cada um dos aspectos levantados na inicial, na ordem em que foram levantados.
Inicio pela análise da alegada inconstitucionalidade formal dos dispositivos legais impugnados, por afronta à reserva constitucional de lei complementar, a qual, todavia, não consigo identificar na espécie.
Com efeito, nos termos do art. 22, I, da Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre direito do trabalho, não estando ela obrigada a utilizar-se de lei complementar para disciplinar a matéria, que somente é exigida, nos termos do art. 7º, I, da mesma Carta, para regrar a dispensa imotivada. Esse tema, porém, definitivamente, não constitui objeto da Lei 11.101/2005.
Não é difícil constatar, a meu ver, que o escopo do referido diploma normativo restringe-se a estabelecer
normas para a recuperação judicial e a falência das empresas, além de proteger os direitos de seus credores.
Mesmo que se considere que a eventual recuperação ou falência da certa empresa ou, ainda, a venda de seus ativos acarrete, como resultado indireto, a extinção de contratos de trabalho, tal efeito subsidiário nada tem a ver com a “despedida arbitrária ou sem justa causa”, que decorre sempre de ato volitivo e unilateral do empregador.
É bem de ver que os contratos de trabalho não se rompem necessariamente nessas hipóteses, nem mesmo na circunstância extrema da falência, verificando-se, inclusive, que o art. 117 da Lei em comento prevê que os contratos bilaterais, dos quais a relação de emprego constitui exemplo, não se resolvem de forma automática, visto que podem ser cumpridos pelo administrador judicial em proveito da massa falida.
O rompimento do vínculo empregatício, naquelas hipóteses, resulta da situação excepcional pela qual passa a empresa, ou seja, por razões de força maior, cujas consequências jurídicas são, de há muito, reguladas por norma ordinária, a exemplo do art. 1.058 do antigo Código
Civil, e do art. 393 do novo Codex, bem assim dos arts. 501 a 504 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Convém registrar que, a rigor, um dos principais objetivos da Lei 11.101/2005 consiste justamente em preservar o maior número possível de empregos nas adversidades enfrentadas pelas empresas, evitando ao máximo as dispensas imotivadas, de cujos efeitos os trabalhadores estarão protegidos, nos termos do art. 10, II, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, de aplicabilidade imediata, segundo entende esta Corte, enquanto não sobrevier lei complementar disciplinadora. 1
Não prospera, assim, o argumento de que os dispositivos impugnados regulam “ato jurídico que gera a extinção automática do contrato de trabalho” (fl. 14), mesmo porque, como nota Jorge Luiz Souto Maior, a dispensa coletiva de empregados não figura, no art. 50 da Lei 11.101/2005, como um dos meios de recuperação judicial da
2
empresa.
Este Tribunal, de resto, já firmou o entendimento de que a reserva de lei complementar
1 RE 449.420-5/PA, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU, 14. out. 2005. 2 MAIOR, Jorge Luiz Souto. Negociação Coletiva de Trabalho em Tempos de Crises Econômicas. Disponível em:
http://www.diap.org.br/index.php/artigos/7223-negociacao-coletiva-detrabalho-em-tempos-de-crise-economica. Acesso em: jan.2009.
restringe-se àquelas situações para as quais a própria Constituição exigiu tal instrumento de forma expressa, não se admitindo qualquer tipo de analogia ou relação de similitude material. Nesse sentido, o Min. Celso de Mello, Relator da ADI 789/DF, assentou que o domínio normativo da lei complementar
“apenas se estende àquelas situações para as quais a própria Constituição exigiu – de modo expresso e inequívoco – a edição dessa qualificada espécie de caráter legislativo.
(...)
(...) a exigência de lei complementar não se presume e nem se impõe, quer por analogia, quer por força de compreensão, quer, ainda, por inferência de situações que possam guardar relação de similitude entre si”.
Definida a questão que envolve compatibilidade formal dos dispositivos impugnados diante da Carta Magna, passo, na sequência, a examiná-los quanto à sua alegada inconstitucionalidade material. Começo pela análise da ausência de sucessão no tocante às dívidas trabalhistas.
Nesse aspecto, o requerente sustenta que os arts. 60, parágrafo único, e 141, II, da Lei 11.101/05 são inconstitucionais do ponto de vista substantivo, ao estabelecerem que o arrematante das empresas em recuperação judicial não responde pelas obrigações do devedor, em especial as derivadas da legislação do trabalho.
Como visto, a AGU e a PGR manifestaram-se, em
preliminar, pelo não conhecimento da ADI no tocante à
impugnação desses dois dispositivos, sob argumento de que a
eventual procedência da ação quanto a estes não eliminaria
o alegado vício, pois o ordenamento jurídico continuaria a contemplar a não sucessão das obrigações trabalhistas do
arrematante.
Nesse sentido, o Ministério Público Federal
assentou, textualmente, que
“a falta de impugnação do § 2º do art. 141 da lei em questão prejudica o pedido deduzido em relação ao inciso II deste mesmo artigo e ao art. 60. Afinal, ainda que se admitam as especificidades de cada qual, não há dúvidas de que, com base na previsão mantida incólume de que ‘o arrematante não responde por obrigações decorrentes do contrato [de trabalho] anterior’ (art. 141, § 2º), permaneceriam a cargo exclusivo do devedor as dívidas trabalhistas. Não seria alcançado, portanto, o fim precípuo das impugnações deduzidas neste particular, que reside justamente em reconhecimento expresso de que ‘os adquirentes (...) respondem pelas obrigações derivadas da legislação do trabalho’" (fl. 222).
De fato, embora tal lacuna na inicial pudesse,
dentro de uma visão mais ortodoxa, levar ao reconhecimento
da prejudicialidade da ação quanto à impugnação dos citados
dispositivos, não tem ela, contudo, a meu ver, o condão de
torná-la inepta, diante da possibilidade, em tese, de a Corte decretar a inconstitucionalidade § 2º do art. 141 por arrastamento, caso venha a concluir que a ausência de sucessão, no caso de débitos trabalhistas, ofende a Carta Magna.
Conheço, pois, da ação, adiantando, todavia, que não identifico a inconstitucionalidade aventada pelo requerente quanto aos arts. 60, parágrafo único, e 141, II, da Lei 11.101/05.
Primeiro, porque a Constituição não abriga qualquer regra expressa sobre o eventual direito de cobrança de créditos trabalhistas em face daquele que adquire ativos de empresa em processo de recuperação judicial ou cuja falência tenha sido decretada.
Depois, porque não vejo, no ponto, qualquer ofensa direta a valores implícita ou explicitamente protegidos pela Carta Política. No máximo, poder-se-ia flagrar, na espécie, uma colisão entre distintos princípios constitucionais. Mas, mesmo assim, não seria possível falar, no dizer de Luís Virgílio Afonso da Silva, “nem em declaração de invalidade de um deles, nem em instituição de
uma cláusula de exceção”, 3 visto ter o legislador ordinário, apenas, estabelecido, nas palavras de Robert Alexi, “relações de precedência condicionada”.4
É que, na conhecida definição do referido jurista germânico, princípios são mandamentos de otimização, ou seja, normas que exigem que algo seja realizado na maior medida possível diante das condições fáticas e jurídicas existentes, razão pela qual a sua concretização demanda sempre um juízo de ponderação de interesses opostos, à luz de uma situação concreta.5
As condições fáticas e jurídicas, no seio das quais o juízo de ponderação é levado a cabo, contudo, nem sempre são as ideais, visto que a tendência expansiva dos princípios tende a fazer com que a realização de um deles no mais das vezes, se dê em detrimento da concretização de
6
outro.
No caso, o papel do legislador infraconstitucional resumiu-se a escolher dentre os distintos valores e princípios constitucionais, igualmente aplicáveis à espécie, aqueles que entendeu mais idôneos
3 SILVA, Luís Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais – conteúdo essencial, restrições eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 50. 4 ALEXI, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estúdios Constitucionales, 1993, p. 91-92. 5 Idem, loc.cit. 6 SILVA, Luís Virgílio Afonso da. Op.cit., loc. cit.
para disciplinar a recuperação judicial e a falência das empresas, de maneira a assegurar-lhes a maior expansão possível, tendo em conta o contexto fático e jurídico com o qual se defrontou.
Assim, o exame da alegada inconstitucionalidade material dos dispositivos legais que estabeleceram a inocorrência de sucessão das dívidas trabalhistas, na hipótese da alienação judicial de empresas, passa necessariamente pelo exame da adequação da escolha feita pelo legislador ordinário no tocante aos valores e princípios constitucionais aos quais pretendeu emprestar eficácia.
Ora, analisando a gênese do diploma normativo cujos dispositivos se encontram sob ataque, verifico que ele resultou de um projeto de lei, o PL 4.376/1993, o qual tramitou por cerca de onze anos no Congresso Nacional. Após longas e aprofundadas discussões, os parlamentares aprovaram a Lei 11.101/2005, revogando concomitantemente o Decreto-lei 7.661/1945, que antes regia a matéria.
Em parecer ofertado à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal, o Senador Ramez Tebet, relator do projeto em questão, deixou anotado o seguinte:
“A fim de conhecer as opiniões dos diversos segmentos da sociedade sobre o assunto e democratizar o debate, esta Comissão promoveu, nos meses de janeiro e fevereiro de 2004, audiências públicas acerca do PLC nº 71, de 2003, em que foram ouvidas centrais sindicais, representantes das associações e confederações comerciais e industriais, das micro e pequenas empresas, dos bancos e do Banco Central, das empresas de construção civil, dos produtores rurais, do Poder Judiciário, do Ministério Público, do Governo Federal, e outros especialistas em direito falimentar. Além disso, recebemos numerosas sugestões por escrito, que também contribuíram para o aprofundamento do debate”. 7
Embora houvesse um consenso generalizado, na
doutrina, acerca da excelência técnica do texto normativo
editado em 1945, registrava-se também uma crescente
concordância na comunidade jurídica quanto ao seu
anacronismo diante das profundas transformações
socioeconômicas pelas quais passou o mundo a partir da
segunda metade do Século XX, e que afetaram profundamente a
vida das empresas.
Rubens Approbato Machado, por exemplo, ao
comentar a nova Lei, afirma que
“a falência (...) e a concordata, ainda que timidamente permitissem a busca da recuperação da empresa, no decorrer da longa vigência do Decreto-lei 7.661/45 e ante as mutações havidas na economia mundial, inclusive
7 Parecer do Senador Ramez Tebet para a Comissão de Assuntos Econômicos
– CAE, 2003, p. 11-13. com a sua globalização, bem assim nas periódicas e inconstantes variações da economia brasileira, se mostram não só defasadas, como também se converteram em verdadeiros instrumentos da própria extinção da atividade empresarial. Raramente, uma empresa em concordata conseguia sobreviver e, mais raramente ainda, uma empresa falida era capaz de desenvolver a continuidade de seus negócios. Foram institutos que deixavam as empresas sem qualquer perspectiva de
8
sobrevida”.
Essa foi também a visão do relator do projeto na
Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal:
“A realidade sobre a qual se debruçou Trajano de Miranda Valverde para erigir esse verdadeiro monumento do direito pátrio, que é a Lei de Falências de 1945, não mais existe. Como toda obra humana, a Lei de Falências é histórica, tem lugar em um tempo específico e deve ter sua funcionalidade constantemente avaliada à luz da realidade presente. Tomar outra posição é enveredar pelo caminho do dogmatismo. A modernização das práticas empresariais e as alterações institucionais que moldaram essa nova concepção de economia fizeram necessário adequar o regime falimentar brasileiro à nova realidade.” 9
Assim, é possível constatar que a Lei
11.101/2005 não apenas resultou de amplo debate com os
setores sociais diretamente afetados por ela, como também
surgiu da necessidade de preservar-se o sistema produtivo
nacional inserido em uma ordem econômica mundial
caracterizada, de um lado, pela concorrência predatória
8 MACHADO, Rubens Approbato. Comentários à Nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 22. 9 Parecer, loc.cit.
entre seus principais agentes e, de outro, pela eclosão de
crises globais cíclicas altamente desagregadoras.
Nesse contexto, os legisladores optaram por
estabelecer que adquirentes de empresas alienadas
judicialmente não assumiriam os débitos trabalhistas, por
sucessão, porquanto, segundo consta do citado parecer
senatorial:
“O fato de o adquirente da empresa em processo de falência não suceder o falido nas obrigações trabalhistas não implica prejuízo aos trabalhadores. Muito ao contrário, a exclusão da sucessão torna mais interessante a compra da empresa e tende a estimular maiores ofertas pelos interessados na aquisição, o que aumenta a garantia dos trabalhadores, já que o valor pago ficará à disposição do juízo da falência e será utilizado para pagar prioritariamente os créditos trabalhistas. Além do mais, a venda em bloco da empresa possibilita a continuação da atividade empresarial e preserva empregos. Nada pode ser pior para os trabalhadores que o fracasso na tentativa de vender a empresa, pois, se esta não é vendida, os trabalhadores não recebem seus créditos e ainda perdem seus empregos”.10
Comentando o dispositivo da Lei 11.101/2005, que
isenta os arrematantes dos encargos decorrentes da sucessão
trabalhista, Alexandre Husni assenta o quanto segue:
“A realidade é que visto o fato de forma econômica, a entidade produtiva mais valor
10 Parecer, loc. cit.
terá na medida em que se desligue dos ônus que recaiam sobre si, independentemente da sua natureza. Via de conseqüência, a procura será maior tanto quanto garanta o Poder Judiciário a inexistência de sucessão. Pago o preço justo de mercado, quem efetivamente sai ganhando com o fato será o credor de natureza trabalhista e acidentário que são os primeiros na ordem de preferências estabelecida pelo legislador.” 11
Do ponto de vista teleológico, salta à vista que
o referido diploma legal buscou, antes de tudo, garantir a sobrevivência das empresas em dificuldades -não raras
vezes derivadas das vicissitudes por que passa a economia
globalizada -, autorizando a alienação de seus ativos,
tendo em conta, sobretudo, a função social que tais
complexos patrimoniais exercem, a teor do disposto no art.
170, III, da Lei Maior.
Nesse sentido, é a lição de Manoel Pereira
Calças:
“Na medida em que a empresa tem relevante função social, já que gera riqueza econômica, cria empregos e rendas e, desta forma, contribui para o crescimento e desenvolvimento socioeconômico do País, deve ser preservada sempre que for possível. O princípio da preservação da empresa que, há muito tempo é aplicado pela jurisprudência de nossos tribunais, tem fundamento constitucional, haja vista que nossa Constituição Federal, ao regular
11 HUSNI, Alexandre. Comentários aos artigos 139 ao 153. In: DE LUCCA, Newton e SIMÃO FILHO, Adalberto (Coords.). Comentários à Nova Lei de Recuperação de Empresas e de Falências. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p.537-538.
a ordem econômica, impõe a observância dos postulados da função social da propriedade (art. 170, III), vale dizer, dos meios de produção ou em outras palavras: função social da empresa. O mesmo dispositivo constitucional estabelece o princípio da busca pelo pleno emprego (inciso VIII), o que só poderá ser atingido se as empresas forem preservadas.
(...).
Na senda da velha lição de Alberto Asquini, em seu clássico trabalho sobre os perfis da empresa como um fenômeno poliédrico, não se pode confundir o empresário ou a sociedade empresária (perfil subjetivo) com a atividade empresarial ou organização produtiva (perfil funcional), nem com o estabelecimento empresarial (perfil objetivo ou patrimonial). Nesta linha, busca-se preservar a empresa como atividade, mesmo que haja a falência do empresário ou da sociedade empresária, alienando-a a outro empresário, ou promovendo o trespasse ou o arrendamento do estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados, conforme previsão do art. 50, VIII e X, da Lei de Recuperação de Empresas e Falências”. 12
Sérgio Campinho, na mesma linha, assenta que a
“alienação judicial (...) tem por escopo justamente a obtenção de recursos para cumprimento de obrigações contidas no plano [de recuperação da empresa], frustrando-se o intento caso o arrematante herde os débitos trabalhistas do devedor, porquanto perderá atrativo e cairá de preço o bem a ser alienado”.13
12 CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. “A Nova Lei de Recuperação de
Empresas e Falências: Repercussão no Direito do Trabalho (Lei nº 11.101, de fevereiro de 2005)”. Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Ano 73. N. 4. out/dez 2007, p. 40.
13 CAMPINHO, Sérgio. Falência e recuperação de empresa: o novo regime de insolvência empresarial. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 173.
Isso porque o processo falimentar, nele compreendido a recuperação das empresas em dificuldades, objetiva, em última análise, saldar o seu passivo mediante a realização do respectivo patrimônio. Para tanto, todos os credores são reunidos segundo uma ordem pré-determinada, em consonância com a natureza do crédito de que são detentores.
O referido processo tem em mira não somente contribuir para que a empresa vergastada por uma crise econômica ou financeira possa superá-la, eventualmente, mas também busca preservar, o mais possível, os vínculos trabalhistas e a cadeia de fornecedores com os quais ela guarda verdadeira relação simbiótica.
É exatamente o que consta do art. 47 da Lei 11.101/2005, verbis:
“Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos
credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”.
Cumpre ressaltar, por oportuno, que a ausência de sucessão das obrigações trabalhistas pelo adquirente de
ativos das empresas em recuperação judicial não constitui uma inovação do legislador pátrio. De fato, em muitos países, dentre os quais destaco a França (Code de Commerce, arts. L631-1, L631-13 e L642-1) e a Espanha (Ley 22/2003, art. 148), existem normas que enfrentam a problemática de modo bastante semelhante ao nosso.
Na lei falimentar italiana, por exemplo, há inclusive um dispositivo bastante similar à regra aqui contestada. Trata-se do art. 105 do Decreto 267/1942, com a redação que lhe emprestou o Decreto Legislativo 5/2006, que tem a seguinte redação:
“Salvo disposição em contrário, não há responsabilidade do adquirente pelo débito relativo ao exercício do estabelecimento empresarial adquirido”.14
Por essas razões, entendo que os arts. 60, parágrafo único, e 141, II, do texto legal em comento mostram-se constitucionalmente hígidos no aspecto em que estabelecem a inocorrência de sucessão dos créditos trabalhistas, particularmente porque o legislador ordinário, ao concebê-los, optou por dar concreção a determinados valores constitucionais, a saber, a livre
14 “Salva diversa convenzione, è esclusa la responsabilità dell’acquirente per i debiti relativi all’esercizio delle aziende cedute”.
iniciativa e a função social da propriedade -de cujas manifestações a empresa é uma das mais conspícuas -em detrimento de outros, com igual densidade axiológica, eis que os reputou mais adequados ao tratamento da matéria.
Superadas tais objeções, passo agora ao exame do último argumento da presente ação direta, isto é, o da inconstitucionalidade da conversão de créditos trabalhistas, a partir de um certo patamar, em quirografários.
Também nesse tópico não vejo qualquer ofensa à Constituição no tocante ao estabelecimento de um limite máximo de 150 (cento e cinquenta) salários mínimos, para além do qual os créditos decorrentes da relação de trabalho deixam de ser preferenciais.
É que – diga-se desde logo -não há aqui qualquer perda de direitos por parte dos trabalhadores, porquanto, independentemente da categoria em que tais créditos estejam classificados, eles não deixam de existir nem se tornam inexigíveis. Quer dizer, os créditos trabalhistas não desaparecem pelo simples fato de serem convertidos em quirografários, mas apenas perdem o seu caráter preferencial, não ocorrendo, pois, nesse aspecto, qualquer afronta ao texto constitucional.
Observo, a propósito, que o estabelecimento de um limite quantitativo para a inserção dos créditos trabalhistas na categoria de preferenciais, do ponto de vista histórico, significou um rompimento com a concepção doutrinária que dava suporte ao modelo abrigado no Decretolei 7.661/1945, cujo principal enfoque girava em torno da proteção do credor e não da preservação da empresa como fonte geradora de bens econômicos e sociais.
É importante destacar, ademais, que a própria legislação internacional de proteção ao trabalhador contempla a possibilidade do estabelecimento de limites legais aos créditos de natureza trabalhista, desde que preservado o mínimo essencial à sobrevivência do empregado.
Esse entendimento encontra expressão no art. 7.1 da Convenção 173 da Organização Internacional do Trabalho – OIT (Convenção sobre a Proteção dos Créditos Trabalhistas em Caso de Insolvência do Empregador), segundo o qual a
“legislação nacional poderá limitar o alcance do privilégio dos créditos trabalhistas a um montante estabelecido, que não deverá ser inferior a um mínimo socialmente aceitável”.
Embora essa Convenção não tenha sido ainda ratificada pelo Brasil, é possível afirmar que os limites adotados para a garantia dos créditos trabalhistas, no caso de falência ou recuperação judicial de empresas, encontram respaldo nas normas adotadas no âmbito da OIT, entidade integrante da Organização das Nações Unidas, que tem por escopo fazer com que os países que a integram adotem padrões mínimos de proteção aos trabalhadores.
Nesse aspecto, as disposições da Lei 11.101/2005 abrigam uma preocupação de caráter distributivo, estabelecendo um critério o mais possível equitativo no que concerne ao concurso de credores. Em outras palavras, ao fixar um limite máximo – bastante razoável, diga-se -para que os créditos trabalhistas tenham um tratamento preferencial, a Lei 11.101/2005 busca assegurar que essa proteção alcance o maior número de trabalhadores, ou seja, justamente aqueles que auferem os menores salários.
Procurou-se, assim, preservar, em uma situação de adversidade econômica por que passa a empresa, o caráter isonômico do princípio da par condicio creditorum, segundo
o qual todos os credores que concorrem no processo de falência devem ser tratados com igualdade, respeitada a categoria que integram. Esse é o entendimento de Fábio Ulhoa Coelho,
para quem o limite à preferência do crédito trabalhista tem
como objetivo
“impedir que (...) os recursos da massa [sejam consumidos] com o atendimento a altos salários dos administradores da sociedade falida. A preferência da classe dos empregados e equiparados é estabelecida com vistas a atender os mais necessitados, e os credores por elevados salários não se consideram nessa situação”.15
Insta sublinhar, ainda, que o valor estabelecido
na Lei não se mostra arbitrário e muito menos injusto,
afigurando-se, ao revés, razoável e proporcional, visto
que, segundo dados do Tribunal Superior do Trabalho,
constantes do já citado parecer da Comissão de Assuntos
Econômicos do Senado Federal,
“o limite superior de 150 salários mínimos (...) afetará número reduzidíssimo de assalariados, entre os quais estão, exclusiva ou primordialmente, os ocupantes de cargos elevados da hierarquia administrativa das sociedades”. 16
Isso porque as indenizações trabalhistas,
levando-se em conta os valores vigentes à época da edição
do diploma legal, foram, em média, de 12 (doze) salários
mínimos.
15 COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Nova Lei de Falências. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 14. 16 Parecer, loc.cit.
Foi precisamente o dever estatal de proteger os
direitos dos trabalhadores que determinou a fixação de
regras que tornem viável a percepção dos créditos
trabalhistas pelo maior número possível de credores, ao
mesmo tempo em que se buscou preservar, no limite do
possível, os empregos ameaçados de extinção pela eventual
quebra da empresa sob recuperação ou em processo de
falência.
Em abono dessa tese, afirma o já citado Manoel
Pereira Calças que:
“O Estado deve proteger os trabalhadores que têm como ‘único e principal bem sua força de trabalho’. Por isso, tanto na falência, como na recuperação judicial, os trabalhadores devem ter preferência no recebimento de seus créditos, harmonizando-se, no entanto, tal prioridade, com a tentativa da manutenção dos postos de trabalho.
(...)
(...) o credor trabalhista, cujo crédito somar até cento e cinquenta saláriosmínimos, será classificado pela totalidade do respectivo valor na classe superpreferencial; já
o trabalhador que for titular de crédito que supere o teto legal participará do concurso em duas classes distintas, ou seja, pelo valor subsumido no teto integrará a classe dos créditos trabalhistas e pelo valor excedente será incluído na classe dos quirografários”. 17 17 CALÇAS, Manoel de Queiroz Pereira. “A Nova Lei de Recuperação de Empresas e Falências: Repercussão no Direito do Trabalho (Lei N. 11.101, de fevereiro de 2005)”. Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Ano 73. nº 4. out/dez 2007, p. 41.
Essa restrição, contudo, de forma acertada, como asseveram Vera de Mello Franco e Rachel Sztajn “não atinge as indenizações devidas por acidente do trabalho, que devem ser pagas integralmente”. 18 Ademais, assentam que:
“Caso o apurado com a venda dos ativos seja insuficiente para a satisfação do total, procede-se ao rateio, em igualdade de condições, dentre os credores trabalhistas e preferenciais, classificados nesta classe”.19
Assim, forçoso é convir que o limite de conversão dos créditos trabalhistas em quirografários fixado pelo art. 83 da Lei 11.101/2005 não viola a Constituição, porquanto, longe de inviabilizar a sua liquidação, tem em mira, justamente, a proteção do patrimônio dos trabalhadores, em especial dos mais débeis do ponto de vista econômico.
Assento, por fim, que não encontro nenhum vício na fixação do limite dos créditos trabalhistas, para o efeito de classificá-los como quirografários, em salários mínimos, pois o que a Constituição veda é a sua utilização como indexador de prestações periódicas, e não como parâmetro de indenizações ou condenações, de acordo com remansosa jurisprudência desta Suprema Corte.
18 FRANCO, Vera Helena de Mello e SZTAJN, Rachel. Falência e Recuperação de Empresa em Crise. São Paulo: Elsevier, 2009, p. 42-43. 19 Idem, loc.cit.
Isto posto, conheço e julgo improcedente a presente ação direita de inconstitucionalidade.

Juiz responsável por processo de recuperação de empresas é competente para executar créditos trabalhistas

Por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, nesta quinta-feira (28), a competência da Justiça comum para efetuar a execução de dívidas trabalhistas de empresas que foram objeto de recuperação ou alienação judicial.
Com a decisão, que teve os votos discordantes dos ministros Marco Aurélio e Carlos Britto, a Corte negou provimento ao Recurso Extraordinário (RE) 583955, interposto por Maria Tereza Richa Felga - autora de ação trabalhista contra a VRG Linhas Aéreas S/A, sucessora da VARIG – contra acórdão do STJ em conflito de competência (CC) lá suscitado por ela e que lhe foi desfavorável.
Ao julgar o conflito, aquela Corte Superior declarou competente o Juízo de Direito da 1ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro para decidir a respeito da forma de pagamento dos créditos previstos no quadro geral de credores e no plano de recuperação judicial da VRG Linhas Aéreas S/A e outros.
Repercussão geral
Em 21 de junho do ano passado, o Plenário Virtual do STF reconheceu repercussão geral à matéria. Com isso, todos os processos versando o assunto tiveram de ser sobrestados até decisão final da Suprema Corte, que foi proferida nesta quinta-feira. Integralidade
A maioria dos ministros acompanhou o voto do ministro Ricardo Lewandowski, que manteve o acórdão do STJ. Prevaleceu entre os ministros presentes à sessão, a lógica de que é preciso preservar, na sua integralidade, o sistema instituído pela Lei nº 11.101/2005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.
A lei em questão alterou a antiga lei de falências, estabelecendo, em seu artigo 60 que, se o plano de recuperação judicial aprovado envolver alienação judicial de filiais ou de unidades produtivas isoladas do devedor, caberá ao juiz ordenar a sua realização, dentro de critérios estabelecidos no artigo 142 da própria lei.
E, no parágrafo único deste artigo, a mencionada lei liberou o objeto da alienação de qualquer ônus, estabelecendo, ainda, que não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, observadas as condições estabelecidas no parágrafo 1o do artigo 141 desta Lei.
Alegações
A autora do RE sustentou, em síntese, que a interpretação dada pelo STJ acabou por suprimir a “competência absoluta da Justiça do Trabalho para atuar no julgamento de causa trabalhista quando tratar de direito de empregados de empresa em recuperação judicial”.
Nessa linha, sustentou que “não há nem no texto da Constituição Federal (art. 114, incisos I a IX) e, muito menos na própria Lei de Recuperação Judicial (Lei 11.101/05), qualquer previsão legal que confira a juiz estadual jurisdição sobre matéria eminentemente trabalhista, mesmo que dela se extraiam reflexos no patrimônio ou obrigações de empresas em recuperação judicial”.
Por seu turno, a VRG Linhas Aéreas S/A pediu o não conhecimento do recurso e, se conhecido, que fosse negado. Alegou que, na verdade, não estava sendo contestada a competência da Justiça do Trabalho para julgar ações trabalhistas, nem mesmo de empregados de empresas objeto de recuperação ou alienação judicial, como foi o caso da VARIG.
Risco de desarticulação
Ao acompanhar o voto do relator, o ministro Celso de Mello disse que, se acolhida, a pretensão da autora da ação ”desarticularia a coerência do sistema instituído pela Lei 11.101/05. Esta lei, como lembrou, teve o específico objetivo de preservas as atividades produtivas e a função social de empresas em situação de crise financeira e, com isso, viabilizar, também, a preservação e oferta de empregos e, ainda, abrir condições para satisfazer os interesses dos credores.
Prevaleceu, entre a maioria dos ministros, o entendimento favorável ao princípio de que, na ação trabalhista na qual foi interposto o RE hoje julgado, “inexiste conflito oriundo de relação imediata de trabalho”, pois a autora do recurso foi funcionária da VARIG, não da nova empresa que a sucedeu. A maioria dos ministros acompanhou a tese do princípio da universalidade do juiz falimentar, evocada pelo ministro Ricardo Lewandowski. Entenderam que este magistrado tem que ser único para todos os credores da empresa em crise ou em processo de falência, sem privilegiar um ou outro, salvo no caso dos empregados.
Neste caso, os créditos de natureza alimentar, ou seja, valores devidos no montante até cinco salários mínimos vencidos nos três meses anteriores ao pedido de recuperação judicial, devem ser pagos dentro de 30 dias (parágrafo único do artigo 54 da Lei 11.101) . Quanto aos de valores que vão até 150 salários-mínimos, o prazo é de um ano (artigo 54, caput, da mesma lei). Já quem tiver crédito oriundo de relação trabalhista de valor mais elevado, o que exceder a 150 salários mínimos será inscrito como crédito quirografário (destituído de qualquer privilégio ou preferência).
Leia a íntegra do relatório e voto do ministro Ricardo Lewandowski