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segunda-feira, 9 de novembro de 2009



Número 10 – janeiro de 2002 – Salvador – Bahia – Brasil
FUNÇÕES DAS LEIS COMPLEMENTARES NO SISTEMA TRIBUTÁRIO
NACIONAL – HIERARQUIA DE NORMAS - PAPEL DO CTN NO
ORDENAMENTO
Profª Heleno Taveira Tôrres
Doutor em Direito (PUC/SP). Mestre em Direito Tributário (UFPE).
Especializado em Direito Tributário Internacional (I Universidade de
Roma “La Sapienza”). Professor de Direito Tributário Internacional no
Mestrado e Doutorado da PUC/SP e de Direito Tributário na
UNIFIEO. Advogado e Conferencista. Docente Consultor da CAPES,
para avaliação dos Cursos de Pós-Graduação (desde 1999).
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Pela exigência de aperfeiçoamento da legislação tributária, no atual
quadro de reforma do Estado, na era da fiscalidade de massa, globalização
econômica e da extrema mobilidade de pessoas, bens e riquezas, a
codificação do direito tributário ganha relevância, em vista dos anseios de uma
sempre crescente garantia da segurança jurídica do sistema.
Os fundamentos que justificam uma discussão a respeito do
aperfeiçoamento da codificação (normas gerais) são vários, o que vamos
verificando nos motivos alegados para reformas tributárias, dentre os quais
poderíamos enumerar os seguintes: i) busca de aperfeiçoamento do
ordenamento jurídico e da prática, para colocar o Fisco em sintonia com os
novos conceitos, evoluídos modelos de interpretação do direito, técnicas de
tributação; ii) condição para uma harmonização fiscal entre os países da
América Latina, presentes ou não em processos de integração; iii) maior
respeito aos direitos dos contribuintes, de modo a permitir uma relação entre
Fisco e contribuinte baseada em valores democráticos, entabulada numa
transparência fiscal, e informada pelos ditames da vinculação, clareza e
simplicidade; iv) atualização do catálogo dos limites à ação fiscal, mediante a
inserção ou ampliação do código de defesa do contribuinte; v) aperfeiçoamento
da legislação para reduzir as possibilidades de fraudes, evasões fiscais,
mecanismos elisivos e até mesmo a corrupção; vi) exigência de elementos de
2
resistência às penetrações indesejáveis de conceitos forâneos, principalmente
de common law. Esses são motivos mais que legítimos para justificar tal
preocupação.
Como corolário dessa questão, justapõe-se o tema da hierarquia
sistêmica de normas, a respeito do que temos orientação diversa do que
tradicionalmente tem sido veiculado na nossa doutrina, de menor crítica, é
claro. Entendo que toda hierarquia normativa baseia-se na exclusivamente na
competência dos órgãos responsáveis pela produção de normas no
ordenamento, porquanto um mesmo órgão pode desempenhar diversas
funções, a partir de competências distintas. Vê-se, portanto, o quanto já está
superada a pueril concepção piramidal de Kelsen. Se a validade das normas
exige órgão competente atuando segundo os ditames do ordenamento
(processo ou procedimento), será exclusivamente a identificação da
competência o elemento preciso de demarcação da posição hierárquica da
norma produzida no ordenamento jurídico.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 trouxe um grupo de normas
muito abrangente para instituir o respectivo sistema tributário nacional, com
disposições atributivas de poder de tributar, sob a forma de competências, à
União, Estados, Distrito Federal e Municípios; além das limitações
constitucionais a essa repartição de poderes. Por isso, aparentemente, o papel
do Código Tributário Nacional (Lei 5172/66), entre nós, não tem a importância
que possui para os demais países, cujas constituições não asseguram os
pressupostos e os limites para o exercício da tributação.
Mas se o Código Tributário Nacional não desempenha esse papel de
centralidade primordial no sistema tributário brasileiro nem por isso deixa de ter
sua repercussão. A própria Constituição Federal (art. 146, III) exige que o
sistema de legislações (União, Estados, Distrito Federal e Municípios)
submeta-se às chamadas “normas gerais de direito tributário”, como forma de:
regular as limitações constitucionais ao poder de tributar, aplicando-se
estritamente àquelas que exigem lei específica para surtir efeitos (art. 146, II;
150, VI, “c”; 195, § 7º, 156, § 3º CF); ii) evitar eventuais conflitos de
competência entre as pessoas tributantes, quando deverá dispor sobre fatos
geradores, bases de cálculo e contribuintes dos impostos já identificados na
Constituição (art. 146, I e III, “a”; 155, § 2º, XII, CF); iii) definir os tributos e suas
espécies (art. 146, III, “a”, CF); iv) harmonizar os procedimentos de cobrança e
fiscalização dos tributos, tratando de obrigação, lançamento e crédito - art. 146,
III, “b”, CF; e v) uniformizar os prazos de decadência e prescrição - art. 146, III,
“b”, CF; vi) fomentar, de modo harmonizado, adequado tratamento tributário ao
ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.
Trata-se de algo fundamental, essa oportunidade de reascender
diálogos acadêmicos sobre o modelo de código tributário vigente, pelos
importantes efeitos que o movimento de codificação permite aos
ordenamentos, desde que inspirado no respeito aos direitos fundamentais1,
1 Quanto à relação entre direitos fundamentais e os códigos, ver o importante trabalho:
VALDÉS COSTA, Ramón. Los principios jurídicos fundamentales en la codificación tributaria de
América Latina. In: Revista de Direito Tributário. SP: RT, 1977, nº 3, set.-oct., p. 51-61;
3
numa forma racional de atuação e harmonização dos mecanismos de
incidência, além de outros aspectos pertinentes ao aperfeiçoamento da
legislação tributária2.
2. O CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL - FUNÇÃO INTERNA
2.1 Breve escorço histórico
O Código Tributário Nacional surge a partir da Lei nº 5.172, em 25 de
outubro de 1966, como resultado da reforma operada pela Emenda
Constitucional nº 18/65. Todavia, desde 1953, por ordem do então Ministro da
Fazenda, Osvaldo Aranha, encontravam-se instalados os trabalhos para
realizar tal codificação do direito tributário brasileiro. Para esta tarefa, foi
nomeado Rubens Gomes de Sousa, que ficou encarregado da preparação de
um anteprojeto, o qual foi apresentado em 1954. Este projeto não logrou
conversão em lei. Somente mais tarde, sob a égide daquela Emenda nº 18/65,
a partir de um outro anteprojeto redigido pela Comissão composta dos
Professores Gilberto de Ulhôa Canto, Rubens Gomes de Sousa e Gerson
Augusto da Silva (médico), que contavam com a ajuda de Aliomar Baleeiro, , tal
desiderato chegou a bom termo3.
Como se vê, a Lei nº 5.172/66 foi redigida sob a égide da Constituição
Federal de 1946, respeitando o seu art. 5º, XV, b, tendo sido recepcionado pelo
§ 1º do art. 18, da Constituição de 1967, o qual dispunha: “Lei Complementar
estabelecerá normas gerais de direito tributário, disporá sobre conflitos de
competência nessa matéria entre União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios e regulará as limitações constitucionais ao poder de tributar”. Em
seguida, o Ato Complementar nº 36, de 13/03/1967, em decorrência dos efeitos
de recepção e reconhecendo naquela lei as funções exigidas para lei
complementar, lha atribuiu a denominação com a qual atualmente a
reconhecemos, de Código Tributário Nacional.
Em face do princípio da recepção constitucional (art. 34, § 5º, dos
ADCT/CF), o Código Tributário Nacional foi mantido também pela Constituição
de 1988, em tudo o que não seja com ela incompatível, em atendimento ao
primado da economia legislativa e por estar em consonância com as exigências
do art. 146, CF, a saber:
Art. 146. Cabe à lei complementar4:
2 Na Alemanha, Klaus Tipke defende a necessidade de um Código Tributário
(Steuergesetzbuch) que inclua tanto a parte geral como os diversos impostos em espécie, o
que, segundo este prestigioso Professor, mostrar-se-ia como uma grande contribuição à
sistematização do Direito Tributário. Cfr. TIPKE, Klaus. Die Stueuerrechtsordnung, Colônia:
Otto Schmidt, 1993, v. I, p. 110;
3 Para uma análise mais apurada, cfr.: JULIANO, Raymundo. El código tributário
nacional. Anais das XX Jornadas do ILADT. Salvador: ABDF, 2000, dez., p. 1595-1607;
4 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária.SP: RT, 1975, p. 80-81;
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário, 12ª ed. SP: Saraiva, 1999, p. 206;
4
I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a
União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária,
especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos
impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos
geradores, bases de cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;
c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas
sociedades cooperativas. (g.n.).
Mesmo se en passant, mas precisávamos situar o Código Tributário,
temporalmente, em nosso sistema tributário, ora superando mais de seis
lustros cumprindo as exigências constitucionais típicas. Feitas essas
digressões, passemos agora a uma análise das funções que a lei
complementar cumpre no sistema tributário nacional, para em seguida
discorrermos sobre o conteúdo e alcance das normas gerais e o papel da
codificação.
2.2 Conceito e funções da lei complementar no sistema tributário
nacional
Sabemos que todos os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
possuem suas constituições e leis orgânicas, cada qual regendo os respectivos
sistemas de normas próprios, sob a égide dos princípios do federalismo e
autonomia dos municípios. Contudo, para a União, a mesma Constituição que
rege a República Federativa do Brasil (art. 1º, CF), regula também suas
atividades, exercidas na qualidade de pessoa jurídica de direito público interno
(art. 18, CF). Percebendo essa sobreposição, já Oswaldo Aranha Bandeira de
Mello, em 1937, na sua obra: “natureza jurídica do Estado Federal”, fizera a
necessária separação entre aquelas normas que, por se aplicarem à República
Federativa do Brasil, concentram em si eficácia vinculante para todas as
pessoas políticas, corporificando a Constituição Nacional; e aquelas normas
que se aplicam exclusivamente à União, pessoa autônoma do federalismo,
compondo a chamada Constituição Federal.
Como é de sua natureza, a Constituição institui órgãos aos quais confia,
segundo seu caráter objetivo, âmbitos de tarefas da atuação estatal distintos,
setores de competência material, portanto; além disso, define as atribuições de
poder necessárias para a adequada consecução de tais tarefas. A Constituição
funda competências, criando, no âmbito dos respectivos cometimentos, poder
estatal (conforme o direito), para que os órgãos legislativos tipifiquem as
materialidades correlatas. Dispõe, a Constituição, desse modo, a regular
composição e conformação dos órgãos estatais, garantindo a adequada
assunção de suas funções, cujos atos somente serão válidos se estes agirem
5
exclusivamente nos seus limites de competência e segundo o devido processo.
Em conformidade com este modo de ação, segue a Constituição sua
finalidade, coordenando as diferentes funções dos órgãos umas com a outras,
fazendo com que todas se complementem mutuamente, cada um agindo
segundo as regras constitucionais, de tal modo que a cooperação, a
responsabilidade e o controle entre estes restem assegurados, evitando-se
eventuais abusos de competências5 por um ou outro órgão.
Por determinação constitucional, no Brasil, o Congresso Nacional exerce
três funções legislativas (competências) distintas: é i) constituinte derivado, ao
discutir e votar Emendas à Constituição, e é o legislador ordinário da União,
sob duas modalidades: ii) legislador federal, ao exercer as competências
típicas da União, na qualidade de pessoa de direito público interno, plenamente
autônoma; e iii) legislador nacional, ao dispor sobre normas gerais aplicáveis
às quatro pessoas políticas, nas matérias previstas no art. 24, da CF, e em
outras previstas no corpo da Constituição.
Percebe-se, assim, que a Constituição atribuiu funções distintas a um
mesmo órgão legislativo, sob a forma de competências típicas: ao exercer o
poder de reforma, com poderes para alterar a fisionomia constitucional, criando
ou modificando inclusive suas próprias competências e das demais pessoas
políticas, desde que não afete as chamadas cláusulas pétreas do art. 60, IV,
CF; e como legislador ordinário, a partir das atribuições materiais de
competência, estabelecendo as tipificações das condutas, por lei específica,
bipartindo-se em legislador federal e legislador nacional6.
Como dito, o Congresso Nacional é órgão que concentra dúplice função,
e os processos exigidos para o exercício de cada uma delas são distintos, não
apenas por uma questão de necessidade de maior dificuldade, definidora da
rigidez constitucional, para o exercício das mutações constitucionais, operados
pelo Constituinte derivado, mas como razão do exercício de cada uma dessas
funções. Ao dúplice exercício de funções do órgão, um duplo processo, como
critério de legitimação dos atos emanados por cada um deles.
As leis complementares são figuras do ordenamento que se diferenciam
dos demais atos legislativos tanto pela matéria (competência), quanto pelo
processo de formação (quorum qualificado de maioria absoluta, art. 69, da CF).
Daí Paulo de Barros Carvalho as definir nos seguintes termos: “lei
complementar é aquela que, dispondo sobre matéria, expressa ou
implicitamente, prevista na relação constitucional, está submetida ao quorum
qualificado do art. 69 (CF), isto é, maioria absoluta nas duas Casas do
Congresso Nacional”.
5 Cfr.: HESSE, Konrad. Escritos de derecho constitucional. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 1992, p. 19;
6 “O processo crescente de complexidade da evolução social impõe a divisão do
trabalho, a especialização de funções. Já as funções F’, F”, F’”, não são comportáveis num
único órgão O. Fragmenta-se o exclusivo órgão, destacando-se outros, cada um com função
específica”. VILANOVA, Lourival. Causalidade e relação no direito. Recife: OAB, 1985, p. 192;
6
Dito de outro modo, as leis complementares encontram no sistema
constitucional o respectivo campo material predefinido (competência), sob a
forma de matérias sujeitas ao princípio de reserva de lei complementar
(pressuposto material) e são aprovadas por maioria absoluta (pressuposto
formal, art. 69, CF). Eis o quanto as diferem das leis ordinárias.
No Brasil, a Constituição, como corolário do federalismo (art. 1º e 18,
CF) e da autonomia dos municípios (art. 18 e 29, CF), fixou todas as
competências, inclusive as que versam sobre matéria tributária, autorizando
aos legisladores das pessoas de direito público interno a criarem, por meio de
leis próprias, os tributos que lhes foram reservados, privativamente, de forma a
concretizar o federalismo fiscal.
Nas atividades típicas de legislador ordinário “federal”, o Congresso
Nacional poderá usar tanto de lei ordinária, como de lei complementar, a
depender da exigência constitucional para o respectivo exercício de
competência. É dizer, na Constituição encontramos matérias com reserva de lei
complementar, sendo esta exigida expressa ou implicitamente. Por conta disso,
torna-se, o procedimento do artigo 69, da CF, pressuposto de validade
inafastável para legitimar, em termos formais, o exercício do poder legislativo.
Salvo estas hipóteses, todas as demais matérias, submetidas à reserva de lei,
poderão ser objeto de leis ordinárias, como é o caso das competências do
artigo 21, 22, 23; 153, I-VI, da CF, dentre outros.
Retomando a idéia anterior sobre as funções do legislador ordinário,
temos que a lei complementar tanto é exigida pela Constituição para servir ao
legislador federal (efetivando competências da União), quanto ao legislador
nacional, na função de criar as chamadas “normas gerais”. É dizer, faz parte da
demarcação de competências, também, a definição daquelas que só poderão
ser exercidas exclusivamente pelo legislador federal (União) mediante lei
complementar, assim como a competência do legislador nacional, também
mediante lei complementar, para criar as chamadas normas gerais em matéria
de legislação tributária.
Desse modo, apreciando as hipóteses de cabimento de lei
complementar em matéria tributária, temos que, no ordenamento constitucional
vigente, são matérias de reserva de lei complementar, em duas das funções
legislativas do Congresso Nacional:
1) O exercício de competência da União (lei complementar federal), a
qual se subdivide em:
i) exercício de competências privativas específicas: arts. 148; 153, VII,
CF; e
ii) exercício de competência residual – arts. 154, I; 195, § 6º, CF;
2) A criação das normas gerais em matéria de legislação tributária (lei
complementar nacional – art. 24, I e 146, CF), as quais se encontram
expressas nas seguintes possibilidades:
7
i) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar,
restritamente àquelas que exigem lei específica para surtir efeitos (art. 146, II;
150, VI, “c”; 195, § 7º, 156, § 3º CF);
ii) evitar eventuais conflitos de competência entre as pessoas
tributantes, quando deverá dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes dos impostos já identificados na Constituição (art. 146, I e III, “a”;
156, III; 155, § 2º, XII, CF);
iii) definir os tributos e suas espécies (art. 146, III, “a”, CF);
iv) harmonizar os procedimentos de cobrança e fiscalização dos
tributos, tratando de obrigação, lançamento e crédito (redução de divergências)
- art. 146, III, “b”; 155, § 2º, XII, CF;
v) uniformizar os prazos de decadência e prescrição - art. 146, III, “b”,
CF; podendo estipular suas exceções;
vi) fomentar, de modo harmonizado, adequado tratamento tributário ao
ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas;
2.2.1 Lei complementar como pressuposto para o exercício de
competências da União (legislação federal)
A primeira função desempenhada pelas leis complementares no sistema
tributário é de ordem federal e corresponde, ao exercício de competência da
União para a criação de seus tributos originariamente atribuídos. Como se
sabe, a competência legislativa tributária equivale à parcela do poder de
tributar, previamente limitada, predisposta às pessoas políticas para criarem,
por meio de lei, normas jurídicas sobre tributos, quanto à instituição,
arrecadação e fiscalização destes. Pois bem. A União recebeu competências
materiais que somente podem ser exercidas mediante o uso de leis
complementares, como é o caso do empréstimo compulsório (art. 148, CF) e
do imposto sobre grandes fortunas (art. 153, VII, CF).
Além dessa hipótese, a União recebeu, por disposição constitucional
expressa, a chamada competência residual (art. 154, I; e 195, § 6º CF), para
criar novos impostos, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato
gerador ou base de cálculo próprios dos já existentes, ou novas contribuições,
ao prever que a União poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a
manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art.
154, I.
Em ambos os casos, o exercício da competência somente será legítimo
se acompanhado de lei complementar, por ser matéria reservada tipicamente
para essa espécie de lei. Da mesma sorte da anterior, exercida a competência,
quer dizer, instituído o tributo, sua função cessa, ingressando no sistema
jurídico nacional no mesmo plano das leis ordinárias e mantendo-se, assim, em
relação de coordenação com estas. Nesse caso, não há que se falar em
qualquer hierarquia entre a lei complementar e os demais atos legislativos,
8
porquanto sua função exaure-se com a instituição do tributo, cessando com o
próprio exercício de competência. Por conseguinte, nada impede que lei
ordinária modifique ou mesmo ab-rogue lei complementar com tais funções.
2.2.2 Lei complementar como pressuposto para a criação de
normas gerais (competência da União para instituir legislação nacional)
Quanto à definição do que sejam as chamadas “normas gerais”, o certo
é que, até o presente, nenhuma doutrina foi suficientemente rigorosa a ponto
de colocá-la no devido lugar do sistema jurídico. Lembraria, no limiar desses
esforços, o trabalho pioneiro de Carvalho Pinto, que ensaiou uma delimitação
pela negativa, i.e., do que não seriam normas gerais, ontologicamente, nos
seguintes termos: a) não são normas gerais as que objetivem especialmente
uma ou algumas dentre várias pessoas congêneres de direito público,
participantes de determinadas relações jurídicas; b) não são normas gerais as
que visem, particularizadamente, determinadas situações ou institutos jurídicos,
com exclusão de outros, da mesma condição ou espécie; c) não são normas
gerais as que se afastem dos aspectos fundamentais ou básico, descendo a
pormenores ou detalhes7. Ao que nos afigura, nenhuma obra mais recente foi
suficientemente capaz de refutar essa orientação.
Contudo, mesmo havendo essa lacuna no plano semântico, o que se
deve em grande parte à ambigüidade do termo “geral”, muito já se escreveu
tentando conferir a esta figura contornos bem precisos em termos analíticos, de
sorte a garantir a segurança jurídica do sistema como um todo e a colaborar
com a delimitação da competência da União nesse assunto, preservando os
direitos dos contribuintes e evitando a invasão de competências, para os fins
de proteção do federalismo e da autonomia dos municípios, além de outros
princípios do sistema tributário nacional. E todas as discussões começaram a
partir da própria Constituição Federal de 1967.
Analisando o art. 18, § 1º, CF/67, quanto ao seu alcance e função, duas
correntes de opiniões distintas passaram a disputar espaço acadêmico. Uma
primeira, entendendo que tal dispositivo manifestaria três distintas funções para
a lei complementar: a) emitir normas gerais de direito tributário; b) dispor sobre
conflitos de competência entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios; e c) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar. É a
chamada corrente “tricotômica”.
Outra vertente de pensamento, todavia, e a que mais prosperou
doutrinariamente, deu orientação diversa à questão, alegando que aquela visão
tricotômica pecaria por praticar uma hermenêutica literal, ao não delimitar o
conteúdo das normas gerais de direito tributário, o que possibilitaria ao
legislador da União cometer agressões ao sistema federativo e ao princípio da
autonomia dos municípios, na medida que ficaria permitido à legislação
complementar produzir, indiscriminadamente, regras jurídicas que
perpetrassem o recinto das competências outorgadas aos Estados-Membros,
atingindo o pacto federativo, e invadissem as prerrogativas constitucionais de
7 CARVALHO PINTO. Normas gerais de direito financeiro. SP: Ed. Prefeitura do
Município de São Paulo, 1949, p. 24;
9
que usufruem os Municípios, maculando o princípio da autonomia dos
municípios. Ademais, porque os direitos fundamentais dos contribuintes não
poderiam ser reduzidos no respectivo alcance e conteúdo, a título de “dispor
sobre limitações constitucionais ao poder de tributar”. Como visto, a prevalecer
tal entendimento, aquele da corrente tricotômica, tudo estaria permitido ao
legislador complementar, o que decerto não se compatibilizaria com toda a
estrutura do sistema implantado pela própria constituição.
Esta orientação, chamada de “dicotômica”, pautando-se numa
compreensão sistemática, dizia que o dispositivo em análise teria apenas uma
finalidade: as leis complementares serviriam para veicular unicamente normas
gerais de direito tributário, que exerceriam duas funções: i) dispor sobre
conflitos de competência entre as entidades tributantes e ii) regular as
limitações constitucionais ao poder de tributar. Com isso, ficariam
resguardados os princípios do federalismo e da autonomia dos Municípios8.
Mas como as competências são todas privativas e já estão distribuídas e os
direitos e garantias constitucionais não poderiam sofrer coarctações pelo
legislador infraconstitucional, então sobraria muito pouco espaço para ser
regulado pelas chamadas “normas gerais de direito tributário”. Melhor dizendo,
nenhum espaço, na opinião de Geraldo Ataliba, seu maior defensor.
Mais recentemente, Valdir de Oliveira Rocha ensaiou uma definição de
normas gerais, no seguintes termos: normas gerais em matéria de legislação
tributária são preceitos meramente didáticos, desenvolvedores do sistema
constitucional, e que, no máximo, funcionam supletivamente cedendo diante de
norma específica quando ocupem espaço a esta reservado. Segundo este
autor, as normas gerais, nada obstante a grave importância didática, não
seriam estritamente necessárias, do ponto de vista jurídico9. Essa tese
encontra-se na linha do quanto já vinham afirmando grandes nomes do nosso
direito tributário, como Rubens Gomes de Sousa. Mas essa visão
declarativista, digamos assim, do que diz a Constituição Federal, é missão
própria do legislador, em qualquer esfera do seu exercício de competências.
Mesmo se, negando a corrente tricotômica, pela superficialidade de sua
conclusão, reconheçamos maior legitimidade na força argumentativa na
chamada corrente dicotômica; por entendê-la, de certo modo, redutora demais
em suas propostas, preferimos ir além dessa concepção, mesmo se a
adotemos nos fundamentos. Na medida que a Constituição Federal exige tais
normas gerais no sistema, a estas temos que reservar algum papel, porque
como é de uso corrente dizer, para fins hermenêuticos, a Constituição não usa
palavras inúteis.
De fato, adotamos na concepção de base de nossas investigações a
corrente denominada dicotômica, cuja definição das normas gerais de direito
8 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária.SP: RT, 1975; ATALIBA,
Geraldo. Lei Complementar em Matéria Tributária. Revista de Direito Tributário. SP: RT, 1989,
nº 48; CARVALHO (1999, p. 205); CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional
Tributário, 10ª ed., SP: RT, 1997, p. 474-95;
9 Cfr. ROCHA, Valdir de Oliveira. Determinação do montante do tributo – qualificação,
fixação e avaliação. 2ª ed., SP: Dialética, 1995, p. 89 e 93;
10
tributário, na visão do eminente Prof. Paulo de Barros Carvalho, Titular da PUC
e da USP, à luz da Constituição Federal de 1988 continuaria sendo a seguinte:
“(...) são aquelas que dispõem sobre conflitos de competência entre as
entidades tributantes e também que regulam as limitações constitucionais ao
poder de tributar. Pronto: o conteúdo está firmado. Quanto mais não seja,
indica, denotativamente, o campo material, fixando-lhe limites. E como fica a
dicção constitucional, que desprendeu tanto verbo para dizer algo bem mais
amplo? Perde-se no âmago de rotunda formulação pleonástica, que nada
acrescenta” 10. Pois bem, não negamos que assim seja, nos fundamentos, mas
preferimos explicitar suas possibilidades, caso a caso, à luz das teorias da
codificação, no que tange às funções representadas em cada uma das
hipóteses do art. 146, da CF.
É certo que na maioria dos grandes autores que se dedicaram ao estudo
das “normas gerais”, sempre prevaleceu uma visão mais analítica, estrutural, e
menos funcional na sua descrição, excetuando-se Sacha Calmon, quando
afirma: “as normas gerais de direito tributário veiculadas pelas leis
complementares são eficazes em todo o território nacional, acompanhado o
âmbito de validade espacial destas, e se endereçam aos legisladores das três
ordens de governo da Federação, em verdade, seus destinatários. A norma
geral articula o sistema tributário da Constituição às legislações fiscais das
pessoas políticas (ordens jurídicas parciais). São normas sobre como fazer
normas em sede de tributação”11. A nossa proposta, decerto, é partir da
estrutura para chegar à função, privilegiando a ambos os modos de
abordagem.
Nesse particular, a lei complementar deverá ser adotada pela União
como instrumento inafastável para exercer suas respectivas competências na
criação de “normas gerais”. Numa leitura sistemática do art. 146, que é regra
típica de Constituição Nacional, “normas gerais” somente serão aquelas que
venham a ser criadas seguindo tal espírito; quando o legislativo da União,
revestindo-se das magnas funções de legislador nacional, as introduzirá no
ordenamento para: i) regular limitações constitucionais ao poder de tributar,
detidamente àquelas que exigem lei específica para surtir seus efeitos; ii) evitar
conflitos de competência entre as pessoas tributantes, ao dispor sobre fatos
geradores, bases de cálculo e contribuintes dos impostos já identificados na
Constituição; iii) definir os tributos e suas espécies; iv) harmonizar os
procedimentos de cobrança e fiscalização dos tributos, tratando de obrigação,
lançamento e crédito; e v) uniformizar prazos de decadência e prescrição; vi)
fomentar, de modo harmonizado, adequado tratamento tributário ao ato
cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.
Mas é claro que a todas essas funções aplicam-se limitações
principiológicas e formais próprias, como estabelecido na Constituição Federal,
sendo totalmente afastada qualquer possibilidade para que as normas gerais
10 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário, 13ª ed. SP: Saraiva, 2000,
p. 208;
11 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 2ª ed., RJ:
Forense, 1999, p. 109;
11
assumam feições tipicamente de normas constitucionais, sob pena do vício
insanável de inconstitucionalidade; do mesmo modo que será o exercício dos
legisladores ordinários sem observância dos seus preceitos.
2.2.2.1 As funções da lei complementar como veículo de normas
gerais
Primeiramente, a competência da União para criar normas gerais com a
função de regular limitações constitucionais ao poder de tributar, somente
poderá ser exercida nos casos que exigem lei específica para surtir os efeitos
que lhe são próprios, como se verifica no art. 150, VI, “c” ou do art. 195, § 7º.
Nenhuma redução poderá ser intrudida nas limitações principiológicas cujo
exercício a Constituição não condiciona a qualquer ato do legislador, como o
princípio da capacidade contributiva, da vedação de confisco, isonomia e
outros.
Poderá a União instituir normas gerais para evitar eventuais conflitos de
competência entre as pessoas tributantes. Mas nesse caso, jamais poderá
agredir a repartição constitucional de competências, pertinente ao federalismo
e à autonomia dos municípios. Por isso mesmo, o art. 146, III, “a”, ao prever a
criação de normas gerais para dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo
e contribuintes dos impostos já identificados na Constituição, estas somente
serão constitucionais se comparecerem no sistema para especificar os limites
do inciso I, i. e., para prevenir conflitos de competência entre as pessoas
políticas. E vice-versa, pois a título de evitar conflitos de competência, não
poderá a União dispor sobre outros aspectos além daqueles. Esse é o caso
dos arts. 146, I e III, “a”; 156, III; 155, § 2º, XII, todos da CF. É evidente que a
limitação de que se fala aqui não aparece apenas nas relações entre pessoas
políticas distintas, podendo ocorrer entre Estados (ICMS: 155, § 2º, XII; ITCMD:
155, III) ou entre municípios (ISS: 156, III), daí a exigência de lei complementar
para esses casos, insulando-se aos casos expressos na Constituição, ou
quando não expresso nos dispositivos próprios; naqueles acima referidos, no
art. 146, III, “a”, para dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes. Por fim, não é demais lembrar, essa é hipótese que se aplica
apenas aos impostos já previstos na Constituição originária.
A União recebe ainda competência para definir os tributos e suas
espécies (art. 146, III, “a”, CF). Para essa possibilidade, a norma geral deverá
ater-se aos caracteres gerais, tipificando as características dos tributos, nas
suas várias espécies. Nessa hipótese, a União limita-se mutuamente, tal qual
as demais pessoas políticas, porquanto ao tecer os elementos caracterizadores
do empréstimo compulsório, da contribuição de melhoria, contribuição de
intervenção no domínio econômico, taxa de exercício de poder de polícia, ou
taxa de serviço, por exemplo, disporá limitações e exigências que concorrerão
para ampliar as limitações ao poder de tributar. Nesta função, serão
inconstitucionais todas aquelas normas gerais que visem a qualificar,
particularizadamente, específicas situações com exclusão de outras; ou que se
afastem dos aspectos fundamentais ou básicos, descendo a pormenores ou
detalhes e que impliquem interferências nas competências alheias.
Na seqüência, temos que compete à União, na qualidade legislador
12
nacional, harmonizar os procedimentos de cobrança e fiscalização dos tributos,
tratando de obrigação, lançamento e crédito - art. 146, III, “b”; 155, § 2º, XII,
CF; e ainda uniformizar os prazos de decadência e prescrição. Decerto que a
própria Lei Complementar poderá dispensar específicos tributos do regime
geral, adotando prazos distintos, mas somente lei complementar terá essa
faculdade. A razão é que tanto este quanto o anterior, ambos encontram-se
fundados na premissa de que a Constituição deve primar pela redução de
divergências. É o que se dessome do art. 151, I, ao vedar a União de instituir
tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique
distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a
Município, em detrimento de outro. Mesmo sendo um dispositivo que
aparentemente seria aplicável apenas à União, na instituição de seus tributos,
não poderíamos deixar de considerá-lo no exercício da competência em
matéria de normas gerais. Por decorrência, temos que serão inconstitucionais
quaisquer leis editadas a título de normas gerais que caiam em particularismos
ou que se afastem dos aspectos fundamentais ou básicos, descendo a
pormenores ou detalhes, pelo risco de implicar em interferências nas
competências alheias. Vale ressaltar que para esses aspectos, as normas
gerais serão sempre vinculantes para todas as espécies de receitas públicas
qualificadas como tributo, às quais deva ser aplicado o regime jurídico
tributário.
Por fim, merece destaque o preceito segundo o qual cabe à lei
complementar o papel de fomentar, de modo harmonizado, adequado
tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades
cooperativas, mediante o uso de normas gerais. Nesses termos, dada a
importância e o interesse social envolvido12, e porque qualquer tratamento
tributário concedido em regime geral às cooperativas, na medida que elas
podem ter como objeto fornecer bens ou prestar serviços, poderia implicar em
afetação a tributos estaduais ou municipais, não se limitando aos tributos
federais, somente lei complementar, na qualidade de veículo introdutor de
normas gerais, teria o condão de estipular condições harmonizadas de
tributação. Sendo assim, a legislação preexistente, pertinente ao tratamento
jurídico-tributário conferido ao ato cooperativo, ao ser alçada à condição de
norma geral, somente poderá ser alterada por lei complementar, mas apenas
12 Como se dessome da própria Constituição Federal, em diversos artigos, como
exemplo:
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este
determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. (...) § 2.º A lei apoiará e
estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.
Art. 187. A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com a
participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem
como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transportes, levando em conta,
especialmente: (...) VI - o cooperativismo;
Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o
desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado
em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre: (...) VIII - o funcionamento das cooperativas
de crédito e os requisitos para que possam ter condições de operacionalidade e estruturação
próprias das instituições financeiras.
13
naquilo que for de matéria tributária13. Vedado, contudo, a concessão de
isenções (totais ou parciais) por esse meio, haja vista as limitações dos artigos
150, § 6º e 151, III, da CF.
2.2.3 A hierarquia da lei complementar na função de veículo de
normas gerais – posição do CTN no sistema de fontes
Mencionadas as funções que a lei complementar poderá desempenhar
para os fins de introduzir normas gerais no sistema tributário vigente,
passamos a cuidar da posição hierárquica que essas normas devem ocupar na
escala normativa. E como já salientamos, a relação hierárquica que
eventualmente possa existir entre lei complementar e as leis ordinárias, ou
mesmo outras leis complementares, dependerá, tão-só, da função que ela
exerça no sistema, i.e., das competências. E assim, caso a função seja
constitutiva de algum fundamento de validade, formal ou material, a lei
complementar sempre terá prevalência sobre qualquer outra lei.
Como dito acima, às normas gerais aplica-se também o primado da
reserva de lei complementar, e pelas funções pertinentes à “Constituição
Nacional”, impõe-se a necessária preeminência dessas leis complementares
em relação às demais leis, mesmo que complementares, quando tenham por
objeto o exercício de competência para instituição de tributos. Por conseguinte,
prevalecerão, sempre, sobre a legislação federal, estadual distrital ou
municipal, na medida que estas legislações passam a ter que admiti-las (as leis
complementares que veiculam normas gerais) como fundamento de validade
material.
Corolário dessa conclusão, somente lei complementar, na função de
“norma geral”, poderá revogar uma outra “norma geral”. Não basta ser lei
complementar, portanto. É preciso que esteja dirigida para o fim de modificar a
norma com essa função no ordenamento. Como exemplo, mesmo que o
imposto sobre grandes fortunas seja instituído, o que é reserva de lei
complementar, caso esta traga prazos próprios de decadência e prescrição,
diversos, portanto, do quanto se encontra no CTN, será inconstitucional nesse
particular.
Evidente, pois, que não estando a razão de hierarquia na vigência ou na
eficácia da norma, a única posição questionável será aquela do plano da
validade. Por isso mesmo, tomando em conta a natural submissão do Código
aos preceitos constitucionais, independentemente de se tratar de uma lei
ordinária14, a Lei nº 5.172/66, enquanto “lei nacional15” que é, naquilo que for
13 Nesse sentido, também: BECHO, Renato Lopes. Tributação das cooperativas. SP:
Dialética, 1998, cap. 9;
14 BORGES (1975, p. 54 e ss.); AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, SP:
Saraiva, 1997, p. 163;
15 No dizer de Geraldo Ataliba, “Basta deixar afirmado que o Código Tributário Nacional
é uma lei nacional e não uma expressão do Poder Legislativo da União, enquanto ordem
jurídica parcial – central, mas sim expressão da ordem jurídica nacional – global. Portanto, é
uma lei que não cria tributos, que não está comprometida com os poderes da União, é uma lei
que não cria tributos, que não está comprometida com os interesses da União, é uma lei de
14
fundamento de validade material para a construção da legislação do “sistema
tributário nacional”, terá preeminência sobre todas as demais leis, ordinárias ou
complementares, não importa, elaboradas por qualquer uma das pessoas
políticas.
Não há relevância para a discussão sobre ser o CTN uma lei ordinária, e
não complementar, como exigido por esse artigo, na medida que o art. 34, § 5º,
dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, lhe garantiu força de
recepção, alçando-a ao patamar funcional de sobrenorma, em matéria de
legislação tributária, somente podendo ser revogada, a partir de então, por lei
complementar, nos moldes do art. 146, quando instituída exclusivamente para
essa função. É dizer, a partir da Constituição Federal de 1988, qualquer
dispositivo do CTN somente poderá ser modificado por lei complementar
dirigida especialmente para esse fim, pelo princípio da reserva de lei
complementar referida no art. 146.
E repare-se bem: a Constituição Federal não fala mais em normas
gerais de “direito tributário”, como constava da constituição anterior, mas
normas gerais “em matéria de legislação tributária”. A razão disso é que as
normas gerais “de direito tributário” (como um todo), cujo subsistema marca as
competências e define os princípios aplicáveis, são de natureza
exclusivamente constitucional – são as normas que instituem o sistema
tributário nacional, portanto; ficando as regras sobre a delimitação das regrasmatrizes
de incidência dos tributos, faculdades da administração,
procedimentos de lançamento, de constituição, suspensão e extinção do
crédito, decadência, prescrição etc, qualificadas como “normas gerais em
matéria de legislação tributária”.
Feitas essas considerações sobre as funções da lei complementar e a
posição formal do CTN no direito interno, mister discorrer agora sobre o papel
dos códigos, a respeito da segurança jurídica e outros princípios decorrentes,
por ser este também o papel das normas gerais.
3. CODIFICAÇÃO DO DIREITO TRIBUTÁRIO COMO PARADIGMA
SISTÊMICO PARA O CONTEÚDO DAS NORMAS GERAIS
Como é de entendimento universal, o processo de codificação consiste
numa tentativa de ordenar, mediante uma sistematização racional, a unidade
essencial de um determinado ramo do direito. Por isso, o mundo dos códigos é o
mundo da busca pela segurança, traduzida numa seqüência de capítulos e
artigos e consolidando os valores mais relevantes que a sociedade quer ver
preservados sobre uma dada matéria. Tudo sob a égide do espírito
constitucional que deve reger todo o sistema.
A codificação envolve vários princípios importantes os quais, em grande
parte, correspondem ao processo de positivação de diversos princípios e
interesse nacional, acima das esferas parciais federal, estadual e municipal”. SOUSA, Rubens
Gomes; ATALIBA, Geraldo; CARVALHO, Paulo de Barros. Comentários ao Código Tributário
Nacional (parte geral), 2ª ed., SP: RT, 1984, p. 78;
15
regras constitucionais, prestando-se à tarefa de garantir um razoável teor de
estabilidade e segurança às relações jurídicas e atos de criação de normas no
sistema.
Em matéria tributária, esta garantia dada aos valores dominantes
significa estabilidade para o cálculo sobre o futuro, por meio de uma absoluta
previsibilidade de condutas devidas pelos detentores de competência
legislativa, na elaboração da legislação tributária, bem como pelas autoridades
administrativas e particulares nos atos de aplicação do direito tributário.
Bem sabemos que a experiência jurídica dos diversos países não é
uniforme e que precisamos sempre ter bem claras tais diferenças. A começar
pela análise constitucional de cada um deles. E nesse particular, tanto vamos
encontrar países cuja forma de estado é unitária, o que é a maioria dos casos,
como países organizados sob a forma de uma federação. Essas são
peculiaridades que influenciam por demais a necessidade e o papel de um
código tributário, predisposto para conferir maior certeza do direito, pela
redução das divergências de tratamento. E aqui surge o primeiro fundamento
para a sua necessária posição de superioridade hierárquica no sistema em
relação às demais leis, na medida que serve como fundamento de validade
material destas.
Como a maioria dos países não dispõe de uma constituição analítica em
matéria tributária, antes, trazem pouquíssimas disposições a respeito,
normalmente os princípios consagrados de maior realce, como princípio da
reserva de lei em matéria tributária, isonomia, capacidade contributiva, nãoconfisco,
apenas para citar os mais freqüentes, resta para o Código a suma
tarefa de ordenar os princípios basilares do sistema, dispor o estatuto dos
contribuintes, instituir tanto os limites do Legislador, nos atos de criação de leis,
quanto os da Administração, no que tange às formalizações de obrigações
tributárias, fiscalizações e cobranças de créditos, bem como todos os demais
procedimentos formais16.
Por essa razão, dizia Valdés Costa: “a enumeração dos princípios
fundamentais de direito que devem ser recolhidos nos Códigos Tributários não
é certamente rígida, nem unanimemente compartilhada. A meu ver, em razão
de sua universalidade e importância, sob o aspecto jurídico, podem resumir-se
em quatro princípios: igualdade das partes, legalidade, jurisdicionalidade ou
tutela jurisdicional e igualdade dos contribuintes, em face dos encargos
públicos. Esta enumeração não pretende ser taxativa, uma vez que existem
outros princípios de grande importância, como o do devido processo e o da
culpabilidade em matéria punitiva e o da capacidade contributiva, recolhido em
16 “Todo proceso codificador, y consiguientemente también el tributario, se caracteriza
por dos notas: primero, reduce a unidad lo que estaba disperso; y segundo, como derivación
lógica de lo anterior, proporciona seguridad a sus destinatarios”. GANZÁLEZ GARCÍA,
Eusebio. Los principios generales de la imposición y la codificación tributaria. Anais das XX
Jornadas do ILADT. Salvador: ABDF, 2000, dez., p. 1644;
16
tantas constituições”17.
Para o Direito Tributário, o princípio da centralidade18 reserva-se à
Constituição, que dispõe as regras gerais de direito tributário, instituindo o
sistema tributário da respectiva nação e preservando o respeito àqueles direitos
fundamentais referidos19. Mas numa expansão concêntrica, o fenômeno da
codificação deve concretizar-se como uma continuação sistêmica da
Constituição, respeitando todo o conteúdo desta e condensando os preceitos que
consistam em critérios de validade material e formal para a criação das demais
normas do sistema total20. Mormente quando se trata de sistemas dotados de
uma Constituição analítica em matéria tributária, como é o caso do Brasil.
Destarte, sob a égide constitucional, um código em matéria tributária deve
ter como objetivo a sistematização de todo o esquema dos procedimentos de
tributação21, a coordenação dos distintos tributos e a regulação dos direitos dos
contribuintes22 no campo dos procedimentos, como uma parte geral da
17 VALDÉS COSTA, Ramón. A codificação tributária na América Latina. In: MACHADO,
Brandão (Coord.) Direito Tributário – estudos em homenagem ao Prof. Ruy Barbosa Nogueira.
SP: Saraiva, 1984, p. 251;
18 ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Da codificação – crônica de um conceito. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 148;
19 O melhor estudo comparado sobre os princípios constitucionais de direito tributário
encontra-se em: UCKMAR, Victor. Princípios comuns de direito constitucional tributário. (trad.
por Marco Aurélio Greco) 2ª ed., SP: Malheiros, 1999, 145 p.;
20 Com esta finalidade, estatui critérios materiais de aplicação do direito, na criação
positiva de normas gerais e concretas ou gerais e abstratas (legislação tributária), pelo
legislador, ou individuais e concretas, pelos agentes administrativos (lançamentos tributários,
autos de imposição de multas etc);
21 Sobre as vantagens oferecidas pela codificação para o direito tributário, e em
especial ao mecanismo de lançamento tributário (norma individual e concreta), disse Vanoni:
“a) dal punto de vista formale, si attua un ordinamento armonico dell’amministrazione, cui
consegne la possibilità di utilizzare rispetto a più tributi la stessa attività amministrativa e di
ridurre al minimo i doveri ausiliari del singolo (...); b) dal punto de vista sostanziale, si eliminano
le contraddizioni e le descontinuità tra i vari instituti d’imposta, riducendo le divergenze e quelle
realmente imposte dalla realtà delle cose; c) la futura legislazione fiscale resta notevolmente
semplificata. La parte generale tende a porsi come ordinamento formale del rapporto tributario
non facilmente modificabile. Il legislatore, in occasione della introduzione di nuove imposte o
della variazione delle esistenti, non è più chiamato ad occuparsi dello svolgimento del rapporto
d’imposta, ma unicamente delles caratteristiche sostanziali del nuovo tributo. Per lo svolgimento
formale servono gli schemi predisposti nella parte generale; d) la giusrisprudenza trova quel
sostegno e quella guida logica che la molteplicità dei testi legislativi regolanti situazioni
analoghe rispetto a tributi diversi lascia spesso desiderare (...). e) la scienza del diritto tributario
viene indirizzata più decisamente a lasciare le sterili vie del commento delle singole leggi, per
volgersi alla elaborazione dogmatica degli istituti giuridici di imposta”. VANONI, Enzo. Il
problema della codificazione tributaria. Rivista di Diritto Finanziario e scienza delle finanze,
Milano: Giuffrè, 1938, I, p. 448; Mas tudo isso pode ser resumido em três aspectos básicos,
como menciona Sainz de Bujanda: “Una reforma que se proponga obtener un
perfeccionamiento del ordenamiento fiscal vigente tiene que actuar en una triple dirección: 1º
Sistematización formal de los instrumentos de imposición; 2º Coordinación de los distintos
impuestos, y 3º Refundición de las normas que reglamentan cada tributo”. SAINZ DE
BUJANDA, Fernanda. Hacienda y derecho. Madrid: IEP, 1975, p. 57;
22 “Contrariamente a la creencia popular predominante en nuestro medio, el Código
Tributario no es el Código de la Administración Tributaria, es más bien la norma que regula las
17
legislação tributária, pressupondo o mecanismo de funcionamento do direito
tributário, sua linguagem, seus conceitos e sua terminologia.
A especialidade da matéria tributária exige essa expansão às normas
gerais, como uma pauta para delimitar o espaço da própria juridicização, i.e., a
escolha política de condutas para que, mediante leis, possam fazer parte do
catálogo de condutas reguladas pelo direito, mediante a lógica da definição de
hipóteses de incidência e atribuição de efeitos típicos, por imputação deôntica.
Com isso, o legislador fica ainda mais coarctado na sua atividade de produtor
de regras inovadoras do ordenamento jurídico, pois além de dever obediência à
Constituição, às “normas gerais de direito tributário”, passa a dever, na
elaboração de leis, também, respeito às regras contidas no Código, às “normas
gerais em matéria de legislação tributária” 23.
Essa idéia de centralidade, por expansão concêntrica em relação à
Constituição, geradora de segurança24 para os partícipes da relação jurídica
tributária, aliada a uma pretensão de regular, por meio de cláusulas gerais, um
repertório de figuras e disciplinas típicas, com o fim de garantir à Fazenda
Pública maior certeza, celeridade e eficiência na percepção dos créditos
tributários; e aos particulares, os meios necessários para que estes possam
fazer valer os seus direitos, baliza a natureza dos códigos e de qual deve ser o
modo de compreensão da sua ação em relação às demais leis e atos
tributários em geral.
relaciones entre los sujetos que rodean el fenómeno tributario y sus consecuencias económicas
y jurídicas, a los cuales denominamos como operadores del Sistema Tributario”. BRAVO
CUCCI, Jorge Antonio; BRAVO SHEEN, David Enrique. Analisis y propuestas de cambio al
codigo tributario peruano: su adecuacion a las tendencias que inspiran el fin de siglo. Lima:
inédito, p. 1;
23 Como bem salienta o Prof. Ferreiro Lapatza: “(...) el Código ha de contener también,
de acuerdo con la experiencia común a nuestros países, la normativa general o básica de
todas las relaciones directamente derivadas del tributo y la normativa general o básica del
procedimiento para hacer efectivos los derechos y obligaciones que dan contenido a estas
relaciones, con la definición de los conceptos propios del Derecho Tributario indispensables
para toda esta regulación pues, de acuerdo asimismo con nuestra experiencia, uno de sus
fines primarios es introducir certeza, precisión y claridad en la terminología a emplear en las
Leyes, que regulan los distintos tributos”. FERREIRO LAPATZA, José Juan. La codificación en
América Latina – Análisis comparativo de los modelos OEA/BID (1967) y CIAT (1997) –
Relatorio Generale. Anais das XX Jornadas do ILADT. Salvador: ABDF, 2000, dez., p. 1182;
Nessa mesma linha, afirma também o Prof. Eusebio González: “(...) la codificación suele
proceder a una regulación de los conceptos tributarios fundamentales de los distintos
impuestos, esto es, de aquellos conceptos que inexcusablemente han de repertirse en cada
figura tributaria concreta (hecho imponible, sujeto pasivo, base imponible, liquidación, tipo
impositivo y cuota, fundamentalmente), por ello se dice que la codificación en cuestión opera en
el area de los principios”. GANZÁLEZ GARCÍA, Eusebio. Los principios generales de la
imposición y la codificación tributaria. Anais das XX Jornadas do ILADT. Salvador: ABDF,
2000, dez., p. 1647;
24 “La sicurezza non riguarda il raggiungimento del fine (legato sempre alle incognite
del mercato ed al mutevole mondo della produzione), ma le ‘regole del gioco’, ossia le
condizioni per le quali ciascuno può contare su un dato contegno altrui o attendere un certo uso
del potere coercitivo dello Stato. Il diritto fissa appunto le regole del giuoco: regole generali ed
astratte, che saranno utilizzate da persone ignote, per scopi ed in circonstanze particolari che
non conosciamo né siamo in grado di conoscere”. IRTI, Natalino. L’età della decodificazione. 3ª
ed., Milano: Giuffrè, 1989, p. 5;
18
Todavia, trabalharíamos fora da realidade se não tomássemos em conta
a crescente “erosão” da importância dos códigos modernos, sob os mais
diversos ângulos25. A codificação, que foi sempre considerada como um dos
processos mais acabados do iluminismo e da cultura ocidental moderna, e cujo
produto, os códigos, sempre funcionou como paradigma sistêmico da
legislação e da aplicação normativa, entrou em crise com a tendência
microssistêmica do direito, de leis especiais que passaram a regular
amplamente toda uma específica matéria, de tal sorte que o monossistema
teria sido superado pelo plurissistema, por uma espécie de êxodo normativo
daquele para este. É o que certos autores chamam de “descodificação”, fruto
da crise dos valores da sociedade moderna.
Mas se isso se verificou em alguns ramos jurídicos, o do direito civil por
exemplo, nos limites do direito tributário não alcançou maior importância,
exatamente porque a “crise legislativa”, nos angustos limites dessa seara,
possui distinta significação26, na medida que a inflação legislativa, acumulando
leis e mais leis sobre a matéria, razão da “descodificação” em outras,
apresenta-se exatamente como motivo para o enaltecimento da importância e
necessidade de codificação27, como elemento de estabilização e segurança
nas relações tributárias.
3.1 Codificação e segurança jurídica: a função certeza dos códigos
A virtude da codificação é servir aos princípios de segurança e certeza
do direito, em face da sua forma de comparecimento na teoria das fontes do
25 Cfr.: RAMOS NÚÑEZ, Carlos. Codificación, tecnologia y postmodernidad – la muerte
de un paradigma. Lima: PUC - Peru, 2000, p. 23 e ss.; Também: RAMOS NÚÑEZ, Carlos. El
Código napoleónico y su recepción en América Latina. Lima: PUC - Peru, 1997, p. 44 e ss.;
26 Tomando em conta a inquestionável importância dos códigos, mesmo em épocas de
descodificação, diz Ramos Núñez: “Si la centralidad y el protagonismo de los códigos han
cedido ante la acelerada producción normativa de carácter especial, éste parece ser un dato
más bien registrado por el jurista con sensibilidad sociológica, antes que por los finos cultores
de la dogmática y su numeroso séquito de abogados, jueces y estudiantes. A la vez que se
habla de la crisis de los códigos, se publican colecciones completas y se organizan congresos,
seminarios, simposiums y cértamenes de todo tipo, destinados a exaltar hasta el delirio las
bondades técnicas de un Código dado o para poner en tela de juicio sus imperfecciones.
Contra lo que pudiera pensarse, en una era de apogeo de los microsistemas y de predominio
de la tecnología, las ediciones se agotan y los auditorios se repletan, lo que, por añadidura, no
podrá hacer nunca culquiera de las ramas que se independizaron de los códigos o que se
formaron al margen de éstos”. RAMOS NÚÑEZ, Carlos. Codificación, tecnologia y
postmodernidad – la muerte de un paradigma. Lima: ARA, 1996, p. 72;
27 Na Itália, país que não dispõe de um Código Tributário, nada obstante a aspiração de
vários autores, numa exigência que se vai reforçando a cada dia. Tratando dos problemas
dessa incompreensível ausência, diz Corrado Magnani: “L’accennato quadro normativo dá
luogo a gravi incovenienti facilmente identificabili: 1) nell’esistenza di regole differenti
oggettivamente ingiustificate con conseguenti problemi di legittimità costituzionale per
violazione del principio di uguaglianza; 2) nelle lacune riscontrabili nella disciplina
dell’accertamento di molti tributi, con conseguenti problemi di integrazione di essa mediante il
ricorso a ‘principi’ di controversa individuazione; 3) nell’inesistenza, comunque, di normeprincipio
senza le quali la soluzione di molte questioni di ordine applicativo presenta, come
attestato dalla giurisprudenza, oggettivi margini di incertezza”. MAGNANI, Corrado.
Accertamento tributario e codificazione. In: UCKMAR, Victor (Coord.). L’evoluzione
dell’ordinamento tributario italiano. Padova: CEDAM, 2000, p. 554;
19
direito em posição intercalar entre a Constituição e a legislação, como meio de
gerar maior estabilidade no câmbio de expectativas normativas.
A segurança jurídica visa a conferir previsibilidade na regular positivação
do direito, o que somente será atendido se houver certeza do direito28, i.e., a
exata determinação do conteúdo jurídico aplicável, e manutenção da
igualdade29 de tratamento por parte das autoridades competentes, nos
respectivos atos de aplicação do direito. Temos, assim, a segurança como
resultante de duas variáveis axiológicas que se complementam, a certeza e a
igualdade30.
Interessa-nos aqui, a função certeza da segurança jurídica, entendendose
por “certeza” a determinação permanente dos efeitos que o ordenamento
jurídico atribui a um dado comportamento, de modo que o cidadão saiba ou
possa saber, de antemão, a conseqüência jurídica de suas próprias ações. E
essa função é atendida pelos códigos, porquanto a tipificação (regulação
normativa de ação-tipo)31, tarefa que lhe é própria, constitui-se numa garantia
dessa certeza, ao pretender oferecer a indicação explícita dos tipos e demais
elementos compositivos da regra-matriz de incidência, o que acaba por reforçar
o alcance e conteúdo dos dispositivos constitucionais, pelo processo de
28 Eusebio Gozález, ao tratar desse princípio, menciona como manifestação típica
deste: “en primer lugar, la estabilidad del Derecho, en segundo término, el suficiente desarrollo
normativo dentro de la jerarquía de las fuentes, finalmente, la certidumbre sobre los remedios
jurídicos a disposición del contribuyente, caso de incumplirse las previsiones del
ordenamiento”. GONZÁLEZ GARCÍA, Eusebio. Relaciones entre los principios de seguridad
jurídica y legalidad. In: IBET. Justiça Tributária. SP: Max Limonad, 1998, p. 151;
29 “A desigualdade decorre também da injustiça sistêmica. A igualdade estará
comprometida se o sistema tributário não for justo em sua totalidade, com equilíbrio entre
impostos diretos e indiretos e entre princípios e valores”. TORRES, Ricardo Lobo. Os direitos
humanos e a tributação – imunidades e isonomia. RJ: Renovar, 1995, p. 269; Cfr. ATALIBA,
Geraldo. República e Constituição. SP: RT., 1985, p. 142; HERRERA MOLINA, Pedro M.
Capacidad económica y sistema fiscal. Madrid: Marcial Pons, 1998, p. 84-87; NABAIS, José
Casalta. O dever fundamental de pagar impostos, Coimbra: Almedina, 1998, p. 394-421;
também, o importante estudo: OSVALDO CASÁS, José. Seguridad jurídica, legalidad y
legitimidad en la imposición tributaria. In: IBET. Justiça Tributária. SP: Max Limonad, 1998, p.
329-413;
30 Para maiores considerações, Cfr.: FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Segurança Jurídica
- Normas Gerais Tributárias, Revista de Direito Tributário. SP: RT, 1981, no 17/18, p. 42;
31 Como ensina Paulo de Barros Carvalho, ao tratar do princípio da tipologia tributária,
enquanto princípio constitucional tributário: “No direito positivo brasileiro, o tipo tributário é
definido pela integração lógico-semântica de dois fatores: hipótese de incidência e base de
cálculo. Ao binômio, o legislador constitucional outorgou a propriedade de diferençar as
espécies tributárias entre si, sendo também operativo dentro das próprias subespécies”.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 10ª Ed. SP: Saraiva, 1998, p. 116.
Por isso, ao tratar do princípio da estrita legalidade, acrescenta: “O veículo introdutor da regra
tributária no ordenamento há de ser sempre a lei (sentido lato), porém o princípio da estrita
legalidade diz mais do que isso, estabelecendo a necessidade de que a lei adventícia traga no
seu bojo os elementos descritores do fato jurídico e os dados prescritores da relação
obrigacional. Este plus caracteriza a tipicidade tributária” (1998, p. 114); Para uma apreciação
da aplicação dos “conceitos classificatórios”, ao invés da noção de “tipo”, no direito tributário,
cfr.: DERZI, Misabel de Abreu Machado. Direito tributário, direito penal e tipo. SP: RT, 1988,
302 p.;
20
positivação32.
Isso não quer dizer que os códigos tenham apenas um papel de
reiteração de matéria já previamente fixada pela Constituição. Atendendo à
função certeza, os códigos devem ampliar seus desdobramentos na regulação
do funcionamento do sistema tributário para permitir efetividade às regras
constitucionais, sem que isso signifique restringir direitos dos contribuintes,
limitando o que a Lei Maior ofertou sem limitações, ou ampliação de
competências estatais. Por isso, situar nos códigos matéria típica de direito
constitucional tem efeito meramente repetitivo do quanto já foi ali assentado.
Contudo, voltamos a enfatizar. O que acima se expôs não se dá em
todos os sistemas, principalmente quando a Constituição de um país não
contempla uma gama muito ampla de preceitos típicos de direito tributário,
quando então o código cumpre um papel fundamental no ordenamento: o de
veicular as “normas gerais de direito tributário”, os princípios e primados de
maior dimensão, além daquelas que já lhes são próprias, as “normas gerais em
matéria de legislação tributária”.
Vale lembrar que estamos trabalhando com o conceito mais amplo
possível de codificação, numa visão de direito comparado, envolvendo a
análise de constituições de países unitários e países com regimes federativos;
de constituições com ampla regulação do respectivo sistema tributário e de
constituições desprovidas de regras sobre essa matéria.
3.2 O equívoco da “descodificação” no direito tributário
Como foi dito acima, o protagonismo dos códigos continua a ser
questionado como modelo legislativo neste momento de produção acelerada
de legislações e constitucionalização de várias matérias, numa tentativa de
acompanhar a evolução do homem e dos seus valores, presentes numa dada
coletividade. Essa é uma das causas principais da chamada “descodificação”,
com grandes repercussões para a interpretação e aplicação do direito positivo.
Mas esse não é um fenômeno universal, em face do mundo jurídico, pois não
se trata de um fenômeno que se encontra instalado em todas as áreas do
direito como querem ou pensam alguns.
É certo que em países cuja Constituição estabelece o poder de tributar
ou a distribuição de competência tributária, identifica as espécies de tributos e
predispõe os princípios e limites à atividade tributária do Estado, fixando o
campo de possibilidades destas, como ocorre no Brasil, nesse caso, o código,
32 Como assinala C. García Novoa: “A la pretensión de definitividad de la norma hay
que unir la pretensión de estabilidad de la misma, expresión formal de la confianza del
ciudadano en el Derecho, lo que debe servir para reprobar los cambios normativos excesivos e
injustificados. Y finalmente, la plenitud de la norma. La regulación normativa ha de expresarse
de tal manera que la definición de los supuestos de hecho comprenda un ámbito de la realidad
normada lo más amplio posible, de forma que se aminoren las lagunas” GARCÍA NOVOA, C. El
principio de seguridad jurídica en materia tributaria, Madrid: Marcial Pons, 2000, p. 77. Parece
difícil para um sistema conseguir alcançar estes objetivos desprovido de um Código Tributário
estável e bem estruturado.
21
perde em importância, pela inexorável submissão deste à Constituição33,
dando-se, em certa medida, uma espécie de “esvaziamento” do Código, e por
conseguinte numa “descodificação” por “avocação” de matéria, mesmo se não
chegue ao alcance de desfigurá-lo e torná-lo desprovido de importância. Eis o
que poderíamos chamar de descodificação ascendente.
Além dessa forma de descodificação ascendente, do código para a
Constituição, temos a descodificação descendente: pela formação de
microssistemas de normas, no chamado “processo de expansão legislativa”,
cujos particularismos, aparentemente, superam as disposições do Código34.
Todavia, a codificação ter por reduzida sua importância não quer dizer
ter por eliminadas suas sobranceiras funções no sistema. E por isso mesmo tal
“descodificação” só ocorre de modo aparente, pois ambos, Constituição e
Código, ocupam-se de conteúdos diversos: aquela, das “normas gerais de
direito tributário”, definindo o poder de tributar e seus limites, bem como os
princípios gerais, e o código, das “normas gerais em matéria de legislação
tributária”, dispondo sobre as regras exigidas pela constituição para explicitar
as matérias tributáveis e gerar redução de divergências na configuração dos
mecanismos formais de exigibilidade dos tributos.
A constitucionalização da matéria tributária gera uma conseqüente
descodificação, mas só aparente, como foi dito. A construção dos elementos
compositivos da obrigação tributária, a caracterização do fato jurídico tributário,
a qualificação dos deveres formais, a demarcação dos contornos da sujeição
passiva, dos atos de lançamento e exigência do crédito, de suspensão e
extinção do crédito tributário, dos prazos de decadência e prescrição, da
Administração e da Fiscalização de tributos, além de outros preceitos
necessários para dar ensejo ao processo de positivação das regras
constitucionais, não encontram outro universo senão o do código tributário,
como o melhor lugar para constar e informar todo o conteúdo das leis dos
diversos tributos, como complemento dos dispositivos constitucionais e, desse
modo, fazendo-se um círculo concêntrico, a partir daquele núcleo
constitucional, que confere sistematização à matéria35, na construção do
33 “(...) es cierto que una ley ordinaria como la Ley General Tributaria no tiene como
función exclusiva o típica la de regular derechos y garantías fundamentales sino la de regular
los mecanismos jurídicos de aplicación de los tributos procurando, eso sí, que dicha regulación
sea respetuosa con los derechos y garantías constitucionales de los ciudadanos”. SOLER
ROCH, María Teresa. Reflexiones sobre la descodificación tributaria en España. Revista
Española de Derecho Financiero. 1998/97, p. 11;
34 Há países, como a Espanha, onde se observa uma tendência - aparentemente
transitória (espera-se) - à descodificação, por atos legislativos que regulam, de forma
separada, aspectos fundamentais da relação tributária. É o caso da “Ley de Derechos y
Garantías de los Contribuyentes”, nº 1, de 26 de fevereiro de 1998, cuja exposição de motivos
declara expressamente: “la regulación en un texto legal único dotará a los derechos y
garantías en él recogidos de mayor fuerza y eficacia y permitirá la generalización de su
aplicación al conjunto de las Administraciones tributarias, sin perjuicio de su posible integración
en un momento ulterior en la Ley General Tributaria en cuanto constituye el eje vertebrador del
ordenamiento tributario”.
35 “De norte a sul, seja o tributo federal, estadual ou municipal, o fato gerador, a
obrigação tributária, seus elementos, as técnicas de lançamento, a prescrição, a decadência, a
22
sistema tributário nacional.
Somente o Código, na qualidade de “norma geral”, pode ampliar a
estabilidade sistêmica desejada pela Constituição, devendo as demais leis
serem a ele também subordinadas, por necessária compatibilidade vertical de
conteúdo. Por essa razão, dizemos que só aparentemente tal hipótese de
descodificação pode ser alegada, porque as “normas gerais em matéria de
legislação tributária”, é que vão informar os valores que devem ser
obedecidos36, como garantia de segurança jurídica para os contribuintes,
ficando para as regras codificadas o papel ordenador dos procedimentos
formais de constituição, fiscalização, arrecadação e extinção do crédito
tributário, as quais deverão ser atendidas pela por qualquer outro subssistema
que se crie.
Como disse Aliomar Baleeiro: “Os fatos – para lembrar livro que faz
época – passam adiante dos Códigos. Mas os Códigos, mesmo condenados à
mutilação ou à ancilose do tempo, põem ordem, estimulam a elaboração do
estudo científico do Direito e facilitam a tarefa dos aplicadores e o
conhecimento das regras pelo povo, mormente em assunto impregnado de
tecnicismo como é o tributo moderno”37.
Enquanto em outros ramos é atual o discurso que discute a existência
de uma “descodificação”, como é o caso do Direito Civil; no Direito Tributário,
contrariamente, a codificação é um reclamo de segurança e certeza jurídica,
cujo aperfeiçoamento representa a melhoria de todo o sistema tributário vigente
em um dado país, ao permitir a construção de uma legislação harmônica,
dotada de regras claras e submetidas a critérios formais comuns38.
anistia, as isenções etc. obedecem a uma mesma disciplina normativa, em termos conceituais,
evitando o caos e a desarmonia. Sobre os prolegômenos doutrinários do federalismo
postulatório da autonomia das pessoas políticas prevaleceu a praticidade do Direito, condição
indeclinável de sua aplicabilidade à vida. A preeminência da norma geral de Direito Tributário é
pressuposto de possibilidade do Código Tributário Nacional (veiculado por lei complementar)”.
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 2ª ed., RJ: Forense,
1999, 801 p.;
36 “Na verdade, não é mais possível trabalhar com um conceito oitocentista de código.
(...) Alterado substancialmente esse quadro, isto não significa que deva ser rejeitado o conceito
de código, pois ele favorece a preservação dos valores essenciais do ordenamento jurídico. Até
porque o código não é apenas mais uma lei, mas um valor cultural do ordenamento jurídico. A
luta por sua manutenção constitui uma manifesta aplicação do princípio da continuidade. (...)
Acrescente-se que a preservação do código favorece a obtenção de uma maior certeza do
direito”. ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Da codificação – crônica de um conceito. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 157;
37 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário brasileiro. RJ: Forense, 11ª ed., 1999, p. 19;
38 “O interesse da unidade nacional, a segurança e a comodidade dos contribuintes, a
eficiência da Administração clamam por essa codificação.” BALEEIRO, Aliomar. Direito
Tributário brasileiro. RJ: Forense, 11ª ed., 1999, p. 14 (este é o mais completo trabalho sobre
codificação do direito tributário brasileiro, às páginas 11-46); Como diz Ferreiro Lapatza: “Los
cambios muy frecuentes de la normativa y las normas demasiado minuciosas contribuyen a la
opacidad del Derecho y dificultan su aplicación. Atentan contra la claridad de la norma, privan
la certeza el ordenamineto y significan, por tanto, un ataque directo al principio de seguridad.
Principio que postula normas claras y sencillas y, en el medida de lo posible, estables, de tal
forma que los ciudadanos puedan, sin grandes esfuerzos, medir las consecuencias fiscales de
23
Por tal razão, é que na atualidade já se faz sentir um fenômeno inverso,
de recodificação, ou seja, de “devolução” de matérias aos códigos, dantes
subtraídas por legislação especial (pela “descodificação descendente”), com
natureza de princípios ou paradigmas imprescindíveis para a construção,
interpretação ou aplicação das demais normas do sistema. Como assinala
Ramos Núñez: “La recodificación no es un dato aislado que corresponda a la
experiencia política de un sólo país. En realidad, se trata de una tendencia que
se registra en todos los países de tradicion romanista”39.
No enfrentamento dos problemas relacionados com a suposta
“descodificação”, vemos que uma das hipóteses desta situação decorre da
relação entre a Constituição e o Código Tributário (descodificação ascendente),
que se não nos legitima a falar numa espécie de perda de conteúdo, ao menos
nos confere condições para dizer sobre uma perda de importância quando essa
Constituição, expressamente, não disponha sobre qual a posição hierárquica a
ser ocupada pelo Código no ordenamento jurídico. A ausência de um
dispositivo como esse enfraquece o Código, ao mesmo tempo que instaura um
clima de desconfiança sobre o efetivo alcance e a eficácia das normas nele
contidas. É o caso do Brasil, nada obstante o art. 146, da Constituição Federal,
cuja interpretação não tem recebido um sentido uniforme por parte da doutrina.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando tudo quanto foi dito acima, no atual quadro de exigências
de aperfeiçoamento da legislação tributária, particularmente do CTN,
precisamos isolar com clareza suas funções constitucionais no sistema jurídico
vigente.
A Constituição Federal (art. 146, III) exige que o sistema de legislações
(União, Estados, Distrito Federal e Municípios) submeta-se às chamadas
“normas gerais de direito tributário”, como forma de: regular as limitações
constitucionais ao poder de tributar, aplicando-se estritamente àquelas que
exigem lei específica para surtir efeitos (art. 146, II; 150, VI, “c”; 195, § 7º, 156,
§ 3º CF); ii) evitar eventuais conflitos de competência entre as pessoas
tributantes, quando deverá dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes dos impostos já identificados na Constituição (art. 146, I e III, “a”;
155, § 2º, XII, CF); iii) definir os tributos e suas espécies (art. 146, III, “a”, CF);
iv) harmonizar os procedimentos de cobrança e fiscalização dos tributos,
tratando de obrigação, lançamento e crédito - art. 146, III, “b”, CF; e v)
uniformizar os prazos de decadência e prescrição - art. 146, III, “b”, CF.
Para criar tais normas gerais, o Congresso Nacional, na qualidade de
legislador nacional, deve usar de leis complementares, que são figuras do
ordenamento que se diferenciam dos demais atos legislativos por encontrarem
no sistema constitucional o respectivo campo material predefinido
sus actuaciones”. FERREIRO LAPATZA, José Juan. Ensayos sobre metodología y técnica
jurídica en el derecho financiero y tributario. Madrid: Marcial Pons, 1998, p. 29;
39 RAMOS NÚÑEZ (1996, p. 76);
24
(competência), sob a forma de matérias sujeitas ao princípio de reserva de lei
complementar (pressuposto material), e aprovadas por maioria absoluta
(pressuposto formal, art. 69, CF).
Desse modo, apreciando as hipóteses de cabimento de lei
complementar em matéria tributária, temos que, no ordenamento constitucional
vigente, são matérias de reserva de lei complementar, em duas das funções
legislativas do Congresso Nacional:
3) O exercício de competência da União (lei complementar federal), a
qual se subdivide em:
i) exercício de competências privativas específicas: arts. 148; 153, VII,
CF; e
ii) exercício de competência residual – arts. 154, I; 195, § 6º, CF;
4) A criação das normas gerais em matéria de legislação tributária (lei
complementar nacional – art. 24, I e 146, CF), as quais se encontram
expressas nas seguintes possibilidades:
vii) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar,
restritamente àquelas que exigem lei específica para surtir efeitos (art. 146, II;
150, VI, “c”; 195, § 7º, 156, § 3º CF);
viii) evitar eventuais conflitos de competência entre as pessoas
tributantes, quando deverá dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes dos impostos já identificados na Constituição (art. 146, I e III, “a”;
156, III; 155, § 2º, XII, CF);
ix) definir os tributos e suas espécies (art. 146, III, “a”, CF);
x) harmonizar os procedimentos de cobrança e fiscalização dos
tributos, tratando de obrigação, lançamento e crédito (redução de divergências)
- art. 146, III, “b”; 155, § 2º, XII, CF;
xi) uniformizar os prazos de decadência e prescrição - art. 146, III, “b”,
CF.
No primeiro caso, o exercício da competência será legítimo se
acompanhado de lei complementar, por ser matéria reservada tipicamente para
essa espécie de lei. Exercida a competência, quer dizer, instituído o tributo, sua
função cessa, ingressando no sistema jurídico nacional no mesmo plano das
leis ordinárias e mantendo-se, assim, em relação de coordenação com estas.
Nesse caso, não há que se falar em qualquer hierarquia entre a lei
complementar e os demais atos legislativos, porquanto sua função exaure-se
com a instituição do tributo, cessando com o próprio exercício de competência.
Por conseguinte, nada impede que lei ordinária posterior modifique ou mesmo
ab-rogue lei complementar com tais funções.
Corolário dessa conclusão, somente lei complementar, na função de
“norma geral”, poderá revogar uma outra “norma geral”. Não basta ser lei
25
complementar, portanto. É preciso que esteja dirigida para o fim de modificar a
norma com essa função no ordenamento.
Evidente, pois, que não estando a razão de hierarquia na vigência ou na
eficácia da norma, a única posição questionável será aquela do plano da
validade. Por isso mesmo, tomando em conta a natural submissão do Código
aos preceitos constitucionais, independentemente de se tratar de uma lei
ordinária, a Lei nº 5.172/66, enquanto “lei nacional” que é, naquilo que for
fundamento de validade material para a construção da legislação do “sistema
tributário nacional”, terá preeminência sobre todas as demais leis, ordinárias ou
complementares, não importa, elaboradas por qualquer uma das pessoas
políticas.
Referência Bibliográfica deste Artigo (ABNT: NBR-6023/2000):
TÔRRES, Heleno Taveira. Funções das leis complementares no sistema tributário
nacional – hierarquia de normas - papel do CTN no ordenamento. Revista
Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, nº. 10, janeiro,
2002. Disponível na Internet: . Acesso em: xx
de xxxxxxxx de xxxx
(substituir x por dados da data de acesso ao site).
Publicação Impressa:
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Texto: Evolução da Tributação sobre o Consumo



1- Introdução



Uma análise comparativa entre impostos não-cumulativos no Brasil - Imposto Sobre Circulação de Mercadoria e Serviço, ICMS - e na Europa - Taxe Sur La Valeur Ajoutée, Valore Aggiunto, ou Value Added, TVA ou IVA, é exigente, para uma melhor compreensão do tema, de um escorço da gênese dos impostos sobre consumo, o que, ao menos no caso brasileiro, importa em exame sintético dos textos constitucionais.

Conforme adverte Canotilho, na aprendizagem de qualquer tema do Direito não se pode dispensar a “memória”, principalmente quando se busca a perfeita compreensão dos problemas políticos-constitucionais.

Cumpre anotar, por relevante, que na discussão dos impostos sobre o consumo se torna perceptível, como talvez em nenhum outro, a viva comunicação entre os sistemas jurídico, econômico e político, este último com destaque para a discussão do pacto federativo, de modo a tornar harmoniosa a relação de seus membros, propiciando a junção das ordens jurídicas parciais com a ordem jurídica total.


2- História dos Impostos Sobre o Consumo



Ensina a história que já no Egito antigo, há 3300 anos A.C., qualquer mercadoria em trânsito entre o lugar de produção ao local de consumo estava sujeita a uma imposição fiscal, sendo talvez esta a primeira notícia a respeito de tributo desta natureza (JUANO, Manoel de. Tributación sobre el valor agregado. Buenos Aires: Victor P. Zavalia, 1975, apud MEIRELLES, José Ricardo. Impostos indiretos no MERCOSUL e integração. São Paulo: Ltr, 2000. p.47-48 ).

Os gregos e os romanos estipularam forma de tributação sobre os negócios realizados, sendo que os impostos incidentes sobre as transferências e sobre as vendas de mercadoria serviam como recurso financeiro destinado à proteção do comércio ou para custear gastos militares (JUANO, Manoel de. Tributación sobre el valor agregado. Buenos Aires: Victor P. Zavalia, 1975, apud MEIRELLES, José Ricardo. Impostos indiretos no MERCOSUL e integração. São Paulo: Ltr, 2000. p.47-48 ).

Ainda na Roma Antiga, dizia-se que o Imperador Constantino tinha imposto sobre serviços de nome chrysagyrum ou lustralis collatio, sendo que os clérigos, oleiros e carpinteiros e os trabalhadores manuais em geral estavam isentos do referido imposto. (MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. São Paulo: Malheiros, 1998, p.15 ).

O desenvolvimento industrial tornou visível a deficiência dos impostos existentes, os quais oneravam a produção e dificultavam a concorrência com outros países, de modo que em meados do Século XX, havia a preocupação dos Estados em substituir o imposto sobre o volume de vendas (chiffre d’affaires) por um imposto sobre o valor acrescido (la valeur ajoutée, ou valore aggiunto, ou value added), com objetivo de tributação da circulação econômica de bens, tanto em relação a mercadorias como a serviços ( Martins, Sérgio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. São Paulo: Malheiros, 1998, p.15 ).

3- História do ICMS



A primeira constituição brasileira foi outorgada em 1824 quando o Brasil ainda era um Império e, desta forma, além de destituída de um sistema de impostos que pudesse identificar a origem do atual ICMS, também carece da estrutura de divisão de poder típica das Federações, faltando-lhe assim, mesmo que já houvesse imposto similar, elementos de complexidade que permitissem a problematização do aspecto espacial da norma tributária.

A Constituição de 1891, a primeira editada já no período republicano, foi inteiramente inspirada no modelo americano, contendo apenas um total de noventa e nove artigos, já contando os das disposições transitórias, adotando o modelo Federalista, na qual predomina a descentralização político-jurídica e se observa como critério básico de sua caracterização a existência de ordens jurídicas distintas no seu território, que, conforme anota Kelsen, “atuam em esferas territoriais de validade diferentes” ( Teoria Geral do Direito e do Estado, p. 309, Trad. Luis Carlos Borges, 2 , São Paulo, Martins Fontes, 1992 ).

Adotado o modelo federalista e reconhecida a autonomia dos entes federados dentro das esferas de competências que lhe são atribuídas pela Constituição Federal, de rigor reconhecer como corolário natural desta autonomia a garantia de recursos financeiros e a atribuição constitucional da competência tributária, devendo a atribuição de renda ser devidamente dimensionada através da advertência feita pela jurista Misabel Derzi (Fundamento da competência tributária municipal, in Revista de Direito Tributário, ed. RT, Vol. 13-14, p. 106-7):
Alguns autores costumam considerar outros elementos, como a renda atribuída a cada esfera de competência, como característica fundamental do federalismo. De fato, a renda é necessária para o cumprimento de qualquer encargo que toque à comunidade parcial. No entanto, é também fundamental quando se dá uma descentralização meramente administrativa, ou descentralização, no sentido apenas estático. Todos os serviços públicos, estejamos falando de Estado unitário ou federal, se descentralizados, não funcionam sem renda própria. Os recursos financeiros são um suporte necessário tanto à viabilidade da descentralização administrativa dos Estados unitários como dos federais. Sendo assim, não pode ser considerada, do ponto de vista jurídico, como característica essencial ou própria do federalismo, embora, de fato, este se torne oco e meramente formal se não atribuir renda própria às comunidades parciais. A razão de não dever ser incluída como característica própria do federalismo resulta de que, efetivamente, não é elemento essencial do ponto de vista jurídico, além do fato de que a consideração indevida da renda, como fator fundamental, pode levar a errôneas conclusões. A desigualdade econômica ou política pode estimular a falsa idéia de haver a hierarquia entre os entes que compõem a federação. É característica do estado federal a igualdade jurídica entre as comunidades parciais. Não há sobreposição de uma sobre a outra. A inclusão de renda entre os elementos essenciais do federalismo facilita o desacerto raciocínio de que, por ser a União, enquanto poder central, mais rica, ou mais poderosa, seria do ponto de vista jurídico, hierarquicamente superior. Erro inconciliável com a noção de federalismo.

Corretamente relativizada a questão pertinente à distribuição de renda para a estrutura federalista de Estado, sensível observar, porém, a contaminação do interesse econômico e político na atribuição pelo legislador constituinte aos entes parciais da competência tributária, como será evidenciado em momento próprio.

A Constituição Federal de 1934, embora contendo um total de duzentos e treze artigos, igualmente deixou de conter um capítulo especificamente voltado ao sistema tributário, vindo, em seu Título I, Capítulo I, estabelecer que:

Art. 8º - Também competem privativamente aos estados:
I – decretar impostos sobre:
a- propriedade territorial, excepto a urbana;
b- transmissão de propriedade causa mortis;
c- transmissão de propriedade immobiliária inter vivos, inclusive a sua incoproração ao capital da sociedade;
d- consumo de combustíveis de motor de explosão;
e- vendas e consignações effetctuadas por commerciantes e productores, inclusive os industriaes, ficando isenta a primeira operação do pequeno productor, como tal definido na lei estadual;
f- exportação das mercadorias de sua producção até o máximo de dez por cento ad valorem, vedados quaesquer addicionaes;
g- industrias e profissões;
h- actos emanados do seu governo e negócios da sua economia, ou regulados por lei estadual.

Grande parte da doutrina em uníssono considera o imposto previsto na alínea “e”, sobre as vendas e consignações, como aquele que deu origem ao nosso conhecido ICMS, enxergando outros a gênese do ICMS no imposto do selo federal, previsto no art. 7o, parágrafo terceiro, da Constituição Federal de 1891, conforme advoga a este respeito Edvaldo Brito (Natureza Jurídica Mercantil do ICMS – in O ICMS e a LC 87/96 – Coordenador Valdir de Oliveira Rocha, São Paulo: Dialética, 1997, p. 38 e 39):
O imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias o ICM como é chamado, substitui, no sistema tributário atual, o imposto de vendas e consignações. Nem por isso são iguais. Têm alguns pontos em comum, por exemplo o de ambos serem impostos do campo de incidência circulação dos bens. Do tipo tributário cumulativo ou em cascata, no qual a imposição recai nos diversos estágios do ciclo desenvolvido pelo bem, aplicando-se a alíquota, em cada um deles, ao valor global da transação, o imposto sobre vendas e consignações teve origem no imposto do selo federal que recaia sobre faturas.

Nesta mesma linha Rubens Gomes de Souza apresenta relevante análise que explica a distinção fundamental entre o aspecto material do ICMS e o IVA (A Tributação das Vendas, in O Imposto Sobre Vendas e Consignações no Sistema Tributário Brasileiro, pp. 14/15):
No Brasil, a instituição do imposto sobre vendas mercantis está ligada a disposições de direito comercial. O art.219 do Código de 1850 obrigava o vendedor, nas vendas por atacado entre comerciantes, a emitir fatura ou conta de venda em duas vias assinadas, ficando uma das vias com o vendedor e a outra com o comprador: na ausência de reclamação deste no prazo de 10 dias, a conta assinada presumia-se a título de dívida líquida e certa. Em conseqüência, as contas assinadas, tributadas com imposto do selo desde o Decreto nº 4.505, de 9 de abril de 1870, eram aceitas como tais pelos bancos para efeito de desconto. Todavia, a legislação especial sobre a cambial, aprovada pelo Decreto nº 2.044, de 31 de dezembro de 1908, veio por em dúvida a negociabilidade das contas assinadas como títulos de crédito. Para assegurar esse privilégio aos negociantes, o Congresso das Associações Comerciais do Brasil, reunido no Rio de Janeiro, propôs ao governo a instituição da duplicata de fatura com caráter de título cambiário, prestando-se à cobrança de um imposto sobre as vendas por ela documentadas, com vantagem, para o fisco, de que a negociabilidade do título transformava virtualmente cada portador em um fiscal gratuito do imposto. Essas sugestões foram adotadas pelo governo federal na lei nº 4.625, de 31 de dezembro de 1922. Os diversos atos legislativos posteriormente expedidos foram depois consolidados no Decreto 22.061, de 9 de novembro de 1932, que regulou não só a matéria de direito comercial referente a duplicata, como a matéria de direito tributário relativa ao imposto sobre as vendas mercantis.
Em 1934, o imposto conceituado como de “vendas e consignações”, foi transferido para os Estados pela Constituição Federal daquele ano; em conseqüência, a matéria de direito fiscal contida no Decreto 22.061 passou a ter aplicação restrita aos territórios Federais, ao passo que a Lei nº 187, de 15 de Janeiro de 1936, reproduzia com caráter geral a matéria de direito mercantil referente à duplicata. Esta evolução histórica explica porque, no Brasil, à diferença de outros países, o imposto sobre circulação dos valores tem sua incidência especificamente referida aos negócios jurídicos mercantis de compra e venda e de consignação.

Nesta fase ainda não se observa a preocupação com a neutralidade do tributo, havendo incidência cumulativa, a qual gerava efeitos negativos na economia do país e que acabaram por forçar mais adiante inovações normativas que dão sensível mudança no perfil do imposto em questão.

A Constituição Federal de 1934, a par de transferir imenso poder ao executivo federal, instituindo o decreto-lei – ao qual era vedado versar a respeito de matéria tributária - não inovou na área em comento, limitando-se a praticamente reproduzir o texto da carta anterior, preservando a competência dos Estados para instituir o Imposto Sobre Vendas e Consignações.

A Constituição Federal de 1946, em que pese sua origem democrática, poucas mudanças promoveu na área tributária, particularmente no que se refere ao imposto sobre vendas e consignações, vindo a dispor em seu Título I, Capítulo I o seguinte:
Art. 19- Compete aos Estados decretar impostos sobre:
(...)
IV – vendas e consignações efetuadas por comerciantes e produtores, inclusive industriais, isenta, porém, a primeira operação do pequeno produtor, conforme definir a lei estadual;
(...)
Parágrafo 5º - O imposto sobre vendas e consignação será uniforme, sem distinção de procedência ou destino.

Cabe ressaltar que em relação à Constituição de 1934 veio a ser suprimido pela redação dada ao parágrafo quinto acima citado o vocábulo “espécie”, circunstância que demonstra evolução do instituto, já que possibilitava ao legislador estadual estabelecer alíquotas diferenciadas, atendendo ao critério de essencialidade maior ou menor da mercadoria ou serviço tributado.

A Constituição Federal de 1967 é a primeira a tratar as questões tributárias em capítulo próprio, dando conteúdo normativo às espécies tributárias e conferindo um conteúdo sistemático à matéria, modificando o Imposto Sobre Vendas e Consignações a se chamar Imposto Sobre Circulação de Mercadoria – ICM -, sem o “S” posto ainda não englobar os impostos sobre serviços de Transporte e Comunicações, nem incidir sobre o consumo de energia elétrica e sobre a extração, circulação, distribuição ou consumo de minerais, bem como a importação, a produção e a circulação de lubrificantes e de combustíveis líquidos e gasosos, ainda incluídos na competência tributária da União.

Além de ganhar um novo nome, passando de IVC para ICM, o imposto passa a ser não cumulativo, dispondo expressamente o texto constitucional que se deve abater em cada operação, nos termos do disposto em lei, o montante cobrado nas anteriores, pelo mesmo ou outro Estado, vedando ainda sua incidência sobre o IPI e outros impostos previstos em lei.

O imposto se moderniza para atender uma necessidade da economia, passando o Estado a se preocupar não apenas com a arrecadação mas também com a indústria e o mercado nacionais, responsáveis pelos produtos e serviços que, ao circularem, dão origem à obrigação tributária; daí a necessidade de buscar um modelo de impostos que não causasse interferência na competitividade das empresas.

Foi justamente esta exigência de neutralidade feita pela economia – nos dias atuais, mais globalizada do que nunca – que irá forçar novas discussões a respeito da não-cumulatividade, seja no que trata ao tema crédito físico versus crédito financeiro, seja no que tange ao aspecto temporal e espacial, com a questão da cobrança na origem ou no destino.
Buscando ser mais sintético e reconhecendo que nada de mais relevante foi acrescentado pela emenda número “1” (também conhecida como a Constituição Federal de 1969), chega-se finalmente à Carta Magna em vigor, elaborada em época em que mais de cem países já tinham optado por tributos sobre valor agregado, onde, assentado na distinta descrição do aspecto material, o princípio da neutralidade se projetava com força bem superior ao agora denominado ICMS.

O antigo ICM passa a englobar a prestação de serviços de transporte – ressalvados os realizados dentro de um mesmo município -, a prestação de serviços de comunicações; o consumo de energia elétrica; a extração, circulação, distribuição ou consumo de minerais e a importação, a produção e a circulação de lubrificantes e de combustíveis, sendo conferida maior sistematização ao imposto.

4- História da União Européia



Antes de tratar da gênese do IVA convêm fazer uma breve exposição a respeito dos países que primeiro adotaram a sistemática deste tipo de imposto, conhecendo a geografia e as bases sociais e políticas que moldaram a estrutura desta forma de tributação.

A denominada União Européia é uma reação do “Velho Continente” ao processo de globalização do mundo moderno e ao crescimento industrial de países como Estados Unidos, Japão e China, fazendo com que as antigas rivalidades – historicamente desenvolvidas pela Inglaterra e França, por exemplo – dessem lugar à idéia de integração, inclusive com a quebra da soberania dos países membros, criando um mercado interno único, com moeda própria, um sistema financeiro e bancário comum, possibilitando assim maior competitividade às economias dos países membros.

Cumpre ressaltar que a União Européia vai além de um simples mercado comum, já que se prevê a unificação das políticas externas e de defesa das leis trabalhistas, de imigração e de combate ao crime, além de garantir cidadania única para todos os habitantes dos países membros, de modo que se pode vislumbrar aqui um novo modelo de federalismo.

A União Européia tem como países membros: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Portugal, Reino Unido e Suécia.

O primeiro passo deste processo ainda em gestação foi o Tratado de Roma, de 1957, sendo os países signatários a Itália, França, Alemanha, Bélgica, Holanda e Luxemburgo. Logo a seguir, em 1973, entram a Dinamarca, Grã Bretanha e Irlanda e, posteriormente, em 1981, Grécia, e em 1986, Espanha e Portugal.

Em 1979 começou a se materializar a idéia de uma moeda única – o Euro -, passo extremamente difícil se for considerada a identificação emocional de cada país com sua unidade monetária, limitando-se a 2,25% a margem de flutuação das moedas para controlar a inflação.

Em 1986, o Ato Único Europeu fornece o caráter democrático da comunidade para conceder novos poderes para o Parlamento europeu e amplia os âmbitos de atuação comunitária nas áreas de meio ambiente, pesquisa e desenvolvimento.

Em 1988, um comitê de peritos, presidido pelo presidente da Comissão européia, Jacques Delors, detalhou um plano para a consecução do mercado interno, a livre circulação de capitais e a convergência econômica (A nova Europa e história. Disponível em http://www.elpais.es/temas/ue/menud/menud6.html).

A seguir, em 1992, foi assinado o Tratado de Maastricht que agiliza e dá maior consistência às reformas das instituições européias, substituindo a Comunidade Econômica Européia pela União Européia, implanta-se progressivamente a plena união monetária e a moeda única.

No ano de 1993, com a crise do sistema monetário, surgiu o primeiro grande desafio da idéia unificadora, havendo necessidade de uma firme atuação dos bancos centrais dos países membros para controlar os movimentos especulativos e evitar que o euro fosse implodido.

Em 1997, o Tratado de Amsterdã, de menor alcance que o Tratado de Maastricht, teve prioridade para aproximar a União Européia para as preocupações de seus cidadãos, vindo a se realizar acordos sobre seguros, sobre empregos, sobre política exterior, sobre defesa e sobre a legitimidade das instituições européias, ficando cada vez mais próxima a idéia de unificação nos moldes de um Estados Unidos da Europa.


5- A História do TVA ou IVA



Não é possível olvidar que a importância da tributação sobre o consumo na estrutura de diversos países ultrapassou todas as expectativas ao mesmo tempo em que as receitas proporcionadas pelo tributo começaram a ter uma amplitude maior em relação às outras modalidades de imposição.

Com os estudos de Nicholas Kaldor, foi elaborado um modelo tributário com um imposto abrangente sobre o consumo e que reunia, em um só tributo, neutralidade econômica, justiça fiscal e relação direta entre o contribuinte e o fisco, sendo que neste modelo o contribuinte declararia seu consumo com incidência do tributo em razão do montante e da composição do gasto de cada um, sendo previsto alíquotas progressivas (Rezende, Fernando. A moderna tributação do consumo. in Mattos Filho, Ary Oswaldo. (coord.) Reforma fiscal: coletânea de estudos técnicos. São Paulo: DBA Dórea Books and Art, 1994. vol. 2. p. 358 ).

Em 1952, a França introduz o imposto sobre o valor agregado, a Taxe Sur La Valeur Ajoutée (TVA), substituindo o imposto sobre a produção.

Em 1960, um Comitê Fiscal e Financeiro, composto por dez fiscais, presidido por Neumark, recomendou a adoção do IVA para o setor atacadista, complementado por um imposto especial sobre o setor varejista, tendo este relatório um grande impacto junto aos Estados Europeus, norteando inúmeras decisões dos membros da Comissão Européia, ainda em busca de um regime definitivo para o IVA.

A partir daí foram sendo editadas as diversas diretivas sobre o IVA, a primeira delas, de 11 de abril de 1967, número 71, publicada em 14 de abril de 1967, que limitava-se a impor a obrigatoriedade da adoção do IVA por todos os Estados que fossem membros, não sendo, contudo, respeitado o prazo limite de janeiro de 1970 por todos os Estados signatários.

A França aprovou, em 6 de janeiro de 1966, a Lei 6.610, que teve vigência no início do exercício de 1968, de onde foram suprimidos 13 impostos do sistema tributário, inclusive a taxe sur les prestations de services, que passou a fazer parte do campo de incidência da taxe sur la valeur ajoutée (Martins, Sérgio Pinto. in Manual do imposto sobre serviços. São Paulo: Malheiros, 1998, p.17) .

A segunda diretiva sobre o IVA, publicada em 14 de abril 1967, determinava a estrutura e as modalidades de aplicação do imposto sobre o valor acrescido, sendo possível observar até este momento uma certa desarmonia de alguns de seus elementos e faltando regulamentar a determinação do âmbito das isenções.

A sexta diretiva do IVA, de 17 de maio de 1977, consagra o sistema comum do IVA e a base imponível uniforme sem ingressar a fixação dos tipos de gravame, cumprindo salientar que essa diretiva constitui o texto essencial do primeiro imposto comunitário e dispõe como os Estados regularão os direitos e os deveres relacionados com esse imposto, nas diversas legislações.

Ocorre um aprimoramento na estrutura dos aspectos fundamentais do gravame no que se relaciona à generalidade de sua aplicação a todos os bens e serviços, ou seja, uma base imponível uniforme, com efeito de evitar a dupla tributação, estabelecendo regras para concretizar o lugar de realização do fato imponível, permitindo uniformizar a incidência do IVA.

Em 1985 foi aprovada pelo CEE um conjunto de propostas — denominadas de “Livro Branco” — que definiu uma série de medidas a serem adotadas por todos os membros para alcançar a almejada unificação efetiva do mercado único até 1992, tendo como principal instrumento a abolição das fronteiras fiscais internas.

Para o IVA, indicou o Livro Branco passagem gradativa para a técnica da imposição na origem, tributando-se as mercadorias e os serviços no país de procedência e não mais no de destino, como até então, conjugando-se o sistema com um mecanismo comunitário de compensação financeira de que redundasse o reembolso, ao Estado-membro importador — e em que era deduzido o montante — do IVA recolhido no Estado-membro exportador.

Buscava-se, assim, preservar o princípio da atribuição do IVA ao país de consumo, sendo certo que tais deliberações acabaram sendo materializadas logo no ano seguinte.

A diretiva 91/680, de 16 de dezembro de 1991, modificou a sexta diretiva do IVA, incluindo um novo título que incorpora toda a normatividade relativa ao regime transitório, que aplicaria entre 01.01.1993 até 31.12.1998, também ainda não implementado, chegando-se assim nos dias atuais.

Cabe salientar, que assim como a unificação político/administrativa ainda não se consumou – mesmo estando cada vez mais próxima a concretização dos Estados Unidos da Europa -, também o projeto final do IVA não está acabado, o que evidencia a interligação das duas questões, ambas fundamentais para o projeto de mercado único.

O professor Marcelo Jabour, em palestra proferida no VII Congresso Nacional de Direito Tributário, realizado em Belo Horizonte, anotando a existência de dois fatos históricos para a construção do IVA à moda européia e que foram a gênese e evolução do TVA na França e a decisão da Suprema Corte Alemã, antes mesmo da assinatura do tratado de Roma, que considerou inconstitucional a cobrança cumulativa do imposto sobre consumo, por entender que, mesmo não estando prevista na Constituição daquele país, a não-cumulativa como regra geral é que prestigiaria a neutralidade tão perseguida nos impostos sobre consumo .

Para terminar, extrapolando um pouco da proposta deste capítulo, não se pode deixar de registrar que a decisão da Suprema Corte Alemã é emblemática e deve servir de reflexão, modificando o pensamento dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, principalmente quando se leva em consideração que nenhum outro país constitucionalizou tanto o sistema tributário quanto o brasileiro, tornando explícito princípios que apontam para uma não-cumulatividade ampla, possibilitando ao empresariado nacional competir com as empresas domiciliadas em outros países.
6- IVA: Tributação na Origem ou no Destino




O aspecto espacial e temporal da hipótese de incidência tanto do IVA quanto do ICMS podem ser caracterizados quanto à tributação na origem ou no destino da operação. Segundo Antônio Carlos Rodrigues do Amaral[1], “os termos origem e destino são utilizados para descrever o método peculiar de contabilidade do IVA nas transações interjurisdicionais”.

O objetivo não é apenas impedir que determinada operação seja tributada tanto na origem quanto no destino, acabando por elevar o preço da mercadoria pela transferência da dupla carga tributária, mas sobretudo para permitir que os produtos possam concorrer em igualdade de condições com aqueles negociados nos mercados internos.

Conforme bem determina Misabel de Abreu Machado Derzi, há duas soluções. A primeira, mais utilizada, é a de optar pelo princípio da tributação exclusiva no Estado de destino; a Segunda, que foi a solução brasileira, também adotada na Constituição de 1988, é a adoção do princípio da tributação única no Estado de origem (embora, financeiramente, haja uma repartição ou compensação entre um e outro Estado)[2].

A utilização do critério da tributação na origem requer uma assemelhação das estruturas fiscais e das cargas tributárias, de tal maneira que as pequenas diferenças sejam absorvidas pelo mercado. Nos mercados cujas estruturas são diferenciadas, a tributação no destino das operações aparece como a melhor saída.

Segundo o critério do país de origem, o bem ou serviço deve ser gravado unicamente no país onde se produziu o bem ou se prestou o serviço, com precedência do país ao qual se destina o bem, se consome ou se utiliza. Nessa hipótese, o fornecedor da mercadoria recolherá o imposto no momento do envio do bem para consumidor situado em outro Estado, utilizando-se da alíquota interna. Com isso, os impostos pagos no Estado de origem acabam incorporando o preço da mercadoria ou serviço, independentemente do seu destino, sem interrupção na cadeia de operações do produtor ao consumidor final.

Torna-se, assim, irrelevante que o produto se transfira de um Estado a outro, na medida em que a tributação será a mesma aplicada aos produtos internos, havendo verdadeira integração e unidade de mercado. Nas palavras de J. K. Nakayama[3], “a tributação na origem pressupõe a uniformização dos critérios de imposição na base de cálculo e da alíquota”.

Nessa hipótese, contudo, o Estado de destino deverá acolher a sistemática de créditos do imposto, de forma a garantir a não-cumulatividade da incidência tributária, desonerando as operações de comercialização e industrialização de mercadorias. Verifica-se, pois, que é forma complexa de tributação, exigindo um rigoroso controle interno sobre os benefícios e incentivos fiscais.

Já a tributação no destino caracteriza-se pela exoneração total das operações de exportação de bens e serviços e pela cobrança do imposto na importação. A aplicação dessa sistemática justifica-se no fato da justa concorrência de circulação de bens e prestação de serviços em mercados que tenham estrutura tributária distintas.

Nessa hipótese, é necessária a existência de um mecanismo de compensação efetivo, capaz de garantir a devolução dos valores já recolhidos quando da exportação de mercadorias e serviços e a tributação, em igualdade de condições com as mercadorias e serviços prestados no mercado interno, quando da importação.

Vê-se, portanto, que para a aplicação do princípio de tributação no destino, não é necessária a integração econômica dos mercados, uma vez que os bens e serviços importados concorrem com os bens e serviços nacionais em igualdade de condições, com a mesma competitividade, não havendo prevalência dos bens e serviços provenientes de outros Estados. Segundo Carlos Sosa Jovellanos[4],

A limitação do critério do destino é do não funcionamento válido sem que se possa reembolsar exatamente o montante de impostos que os produtos exportados pagaram nas etapas anteriores aos efeitos de as saídas se realizarem sem a incidência dos tributos internos indiretos. Será necessário poder aplicar, pelo lado do país importador, um tributo compensatório que represente exatamente o valor dos impostos suportados pelos produtos nacionais.

Tendo em vista que o Estado importador aplica a tributação interna sobre os bens e serviços importados, o quantum de tributo inserido no preço final do produto é repassado ao consumidor final, que acaba arcando com o ônus tributário.

Embora essa sistemática de tributação tenha como objetivo primordial garantir que os bens e serviços importados concorram em igualdade de condições com os bens e serviços nacionais, a discrepância do tratamento tributário entre produtos importados por mercados cuja estrutura tributária seja diversa pode ser enorme. Determinado produto importado por determinado país poderá competir com os demais produtos internos em igualdade de condições, sem, contudo, ser capaz de concorrer com seus similares no mercado internacional, por suportar uma carga tributária diversa daquela incidente em seu país de origem.

Diante disso, resta claro que a tributação no destino acaba favorecendo o comércio nacional e não o internacional, na medida em que não há qualquer vantagem que justifique a importação de mercadorias e serviços. E não poderia ser de outra forma, já que o princípio da tributação no destino surgiu dos tratados realizados entre países que não se comunicavam, que buscavam incrementar suas exportações e não possuíam nenhuma afeição comunitária.

No caso dos países integrantes do Mercosul, a tributação das operações realizadas entre eles se dá pela utilização do princípio da tributação no destino, na medida em que tratam-se de mercados não integrados e dotados de barreiras fiscais.

Já a tributação na origem fortalece a integração de mercados, por ensejar o desaparecimento das barreiras fiscais, gerando uma aproximação das estruturas tributárias. Segundo Marcelo Jabour,

O mercado comum em sua forma ideal permite que as mercadorias saiam do país de origem tributadas mediante a aplicação do imposto sobre o consumo considerando-se a base de cálculo e a alíquota vigentes no país do remetente.

Esse é o caso das operações realizadas dentro do Brasil, que são tributadas na origem (ICMS). O mercado interno brasileiro é integrado política, econômica, financeira e culturalmente, permitindo a aplicação do princípio da tributação na origem, por não existir quaisquer barreiras fiscais. Conforme preleciona Misabel de Abreu Machado Derzi,

Se já somos um gigantesco mercado interno, profundamente integrado em povo, serviços, mercadorias e produtos que, entre nós, circulam livremente, sem barreiras interestaduais políticas, jurídicas ou econômicas, é preciso manter o que já temos, sem riscos de desagregação, e apenas somarmos a esse mercado interno os demais países do MERCOSUL. Para isso, é importante, nas operações entre diferentes estados da Federação, mantermos a tributação na origem (atenuando ou eliminando os seus efeitos econômicos perversos), única forma adequada a uma verdadeira comunidade, por isso mesmo chamada de tributação comunitária (ou de origem).

No nosso caso, para garantir que não haja prejuízo para os Estados importadores, há os mecanismos das alíquotas interestaduais, que são sempre menores àquelas praticadas internamente. Nesse sentido, observa-se o disposto contido no art. 155, § 2º, IV, da CF/88:

Resolução do Senado Federal, de iniciativa do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros, estabelecerá as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação;(...)

Com isso, fica garantido o acerto de contas entre Estados importadores e exportadores, não sendo necessária a adoção de fundos de compensação ou qualquer outro acerto.

Todavia, embora a sistemática de tributação adotada pelo Brasil seja bastante desenvolvida, ainda é necessário sanar alguns vícios que maculam a exigência de um imposto sobre o consumo, através de uma sistemática justa e ideal. Nesse sentido, confira-se a lição de Misabel Abreu Machado Derzi:

O caminho, que começamos a trilhar, na busca de um imposto de consumo ideal e neutro, está longe de terminar. As isenções freqüentes e as alíquotas interestaduais diferenciadas quebram também a neutralidade do imposto, reforçando a necessidade de se repensar o ICMS em um contexto mais amplo. São vícios grandes das normas em vigor:
a) desencadear créditos sistemáticos estruturais;
b) propiciar a evasão fiscal;
c) não compensar adequadamente os Estados mais pobres da Federação, que continuam a financiar o ICMS, pagos aos mais ricos.[5]

Já no caso das prestações de serviços, assim como no caso do Brasil, a legislação da União Européia adotou um critério misto, conjugando hipóteses em que se considera o local onde o serviço foi realizado e um critério subjetivo que constitui a regra geral, qual seja, o recolhimento do tributo no domicílio de quem está executando os serviços, caracterizando o princípio da tributação na origem.


7- Tributação sobre o consumo na União Européia




O IVA europeu é um imposto geral sobre o consumo, que incide sobre as transmissões de bens ou prestações de serviços efetuadas a título oneroso, por um sujeito passivo e relacionada com o exercício de uma atividade econômica. É um imposto plurifásico e não-cumulativo, sendo a dedução dos créditos imediata e de natureza financeira.

Nas operações realizadas com terceiros países, não integrantes da União Européia, aplica-se o princípio da tributação no destino. Assim, sujeitam-se à tributação as importações de bens, enquanto as exportações são exoneradas, garantindo ao Estado-exportador a restituição dos impostos suportados.

A partir de 1993, os países integrantes da União Européia passaram a adotar um regime transitório para as operações intracomunitárias de circulação de bens, até que se possa adotar exclusivamente o princípio da tributação na origem. Esse regime, proposto pela Diretiva 91/680/CCE, adotava a tributação na origem para algumas operações e a tributação no destino para outras.

Embora o referido regime tivesse prazo de duração determinado, qual seja, até o final de 1996, a sistemática prevista no regime transitório encontra-se em vigor até os dias de hoje, não tendo a União Européia conseguido instituir a tributação na origem para todas as operações intracomunitárias.

De acordo com o regime transitório, a tributação de cada operação será feita da seguinte forma:

1) Operações intracomunitárias realizadas com consumidor final: tributação na origem, submetendo-se à legislação desse país;

2) Operações realizadas com países não pertencentes à União Européia: tributação no destino, com a total desoneração da exportação, como forma de incrementar o mercado interno. Os impostos que incidirão no destino se assemelham àqueles aplicados nas operações internas realizadas nos países de destino;

3) Operações intracomunitárias realizadas pelo Estado e demais pessoas jurídicas de direito público: tributação no destino;

4) Operações intracomunitárias realizadas por sujeitos passivos isentos: tributação no destino;

5) Operações intracomunitárias de aquisição de veículo de transporte novo: tributação no destino;

6) Operações com vendas à distância (exemplo: Internet): tributação no destino;

7) Operações intracomunitárias efetuadas entre sujeitos passivos do IVA: tributação na origem;

8) Operações de prestação de serviços: tributação no local onde se localiza a sede da atividade do sujeito passivo, seu estabelecimento ou seu domicílio, em observância ao princípio da tributação na origem;

9) Operações de prestação de serviços através das quais facilmente se verifique o local real da prestação: tributação no destino;

10) Operações de prestação de serviços realizadas com imóvel: tributação no destino, ou seja, no local no qual se localiza o imóvel;

11) Operações de prestação de serviços de transporte: tributação no destino;

12) Operações de prestação de serviços materialmente executados no destino como trabalhos de peritagem de bens corpóreos, serviços de caráter artístico, científico, desportivo, recreativo, de ensino e similares: tributação no destino;

13) Operações de prestação de serviços intermediários, com caráter empresarial, como cessão de direitos de autor, serviços de publicidade, serviços de consultores, engenheiros, advogados, economistas, contabilistas, gabinetes de estudo, tratamento de dados e fornecimento de informações, operações bancárias, colocação de pessoal à disposição, locação de bens móveis corpóreos, serviços de telecomunicações: tributação no destino;

14) Operações de transporte intracomunitário de bens e prestações acessórias: tributação na origem (tem como exceção a hipótese do adquirente ser sujeito passivo do IVA, quando se dá a tributação no destino);

15) Operações de prestação de serviços realizadas por intermediários do negócio, que atuem em nome e por conta de terceiro: tributação na origem.

Como já ressaltado, embora a pretensão dos países membros da União Européia seja estender a tributação na origem pelo IVA para todas as operações realizadas, essa sistemática ainda não foi inteiramente consolidada.

Através dessa sistemática, os Estados-exportadores tributarão as operações à alíquota praticada internamente em seu território, sendo este o valor a ser deduzido pelo importador, num contexto de alíquotas uniformes e um sistema de compensação, pelas chamadas câmaras compensatórias. Nas palavras de Misabel de Abreu Machado Derzi[6], ao citar Schemmel,

As propostas da Comissão para a adoção do princípio do Estado de origem prevêem a necessidade de pagamentos de compensação posteriores do Estado preponderantemente exportador ao Estado preponderantemente importador. Os pagamentos não devem correr, todavia, de um Estado a outro, segundo o ponto de vista da Comissão. Antes devem todos os Estados se reportar a um Fundo de Compensação. Estados-membros, que são importadores líquidos, obteriam pagamentos do Fundo de Compensação e Estados-membros, que, como a República Federal Alemã, são exportadores líquidos, fariam pagamentos ao Fundo de Compensação.

O Conselho da União Européia, no entanto, rejeitou a instituição de mecanismos de compensação, em virtude da não concordância dos Estados por não confiarem na capacidade de cobrança e devolução pelos Estados membros.






7- IVA: O lugar da tributação




A legislação pertinente ao IVA traz considerações importantes concernentes ao tributo.

Há uma falsa impressão de que a tributação, no caso dessa espécie tributária, ocorre no local onde a mercadoria será consumida. Só que, pela análise das disposições do tributo, a tributação ocorre na origem, exceção feita às operações internacionais — seguindo a tendência mundial de não se exportar tributos, desonerando conseqüentemente as exportações —, e àquelas realizadas com os estados que não integram a comunidade européia.

A legislação espanhola e italiana demonstram, claramente, qual o tratamento dado às operações de trânsito de mercadorias e serviços entre os países integrantes da comunidade européia e aqueles que não integram esse círculo. Enquanto no Brasil tributa-se as operações relativas à circulação de mercadorias, transporte interestadual e intermunicipal e comunicações, permanecendo com os municípios a titularidade para instituir tributos sobre os demais serviços, nos países europeus é elencado como sujeito passivo daquele tributo a pessoa que produz, comercializa ou presta serviços, incluindo atividades extrativas, agrícolas e as de profissões liberais ou equiparadas. É o que se observa, verbi gratia, na legislação de Itália e Espanha:

Imposta sul Valore Aggiunto (IVA)
TITOLO I - artt. 1-20Disposizioni generali

Art. 1 - Operazioni imponibili
L'imposta sul valore aggiunto si applica sulle cessioni di beni e le prestazioni di servizi effettuate nel territorio dello Stato nell'esercizio di imprese o nell'esercizio di arti e professioni e sulle importazioni da chiunque effettuate.
(DPR 26.10.1972, n. 633/ www.portaleaziende.it)


Impuesto sobre el Valor Añadido.

TÍTULO PRELIMINAR.
NATURALEZA Y ÁMBITO DE APLICACIÓN.

Artículo 1. Naturaleza del impuesto.
El Impuesto sobre el Valor Añadido es un tributo de naturaleza indirecta que recae sobre el consumo y grava, en la forma y condiciones previstas en esta Ley, las siguientes operaciones:
a) Las entregas de bienes y prestaciones de servicios efectuadas por empresarios o profesionales.
b) Las adquisiciones intracomunitarias de bienes.
c) Las importaciones de bienes.
(Ley 37/1992, de 28 de diciembre/www.associaciones.org)


O IVA grava as transações econômicas, e está destinado a ser suportado pelos consumidores finais. Entende-se por consumidor final qualquer pessoa física ou jurídica que não realize atividades econômicas. Isto significa que as pessoas físicas ou jurídicas que realizem atividades econômicas, além de pagar IVA em suas compras, cobram o IVA em suas vendas, salvo nos casos que se tenha concedido alguma isenção, de forma que, ao término do período trimestral apurem a diferença entre os valores cobrados e aqueles recebidos. Se a diferença é positiva, a Fazenda Pública recebe o numerário correspondente. Caso contrário, é assegurada a devolução do IVA pago à maior.

Tal procedimento é semelhante ao nosso princípio da não-cumulatividade; porém, com significativas diferenças. Enquanto no Brasil os débitos compensam-se com os créditos do imposto, com as restrições constitucionais (isenção e não-incidência), esta possibilidade não foi contemplada, no caso do IVA.

A 6ª Diretiva delimita o campo de atuação da legislação do IVA:

TÍTULO III
APLICAÇÃO TERRITORIAL

Art. 5º. Para efeito de aplicação da presente diretiva, o “Território da Comunidade” corresponde ao âmbito de aplicação do Tratado, tal como é definido, relativamente a cada Estado-membro, no art. 299 do referido tratado.

Já o art. 30 e seguintes tratam das operações tributáveis, como veremos, oportunamente, ao analisar os dispositivos legais.

Apenas para adequado conhecimento das diretrizes da 6ª Diretiva, no concernente ao âmbito de aplicação da legislação e ao local de ocorrência do fato gerador, colacionaram-se as disposições da legislação espanhola e italiana. Esta última, além de trazer o conceito de aplicação territorial da legislação, conceitua as diversas atividades que constituirão fato gerador (fatto specie) da obrigação tributária:

Impuesto sobre el Valor Añadido.

TÍTULO PRELIMINAR.
NATURALEZA Y ÁMBITO DE APLICACIÓN.

(...)
Artículo 3. Territorialidad.
1. El ámbito espacial de aplicación del impuesto es el territorio español, determinado según las previsiones del apartado siguiente, incluyendo en él las islas adyacentes, el mar territorial hasta el límite de 12 millas náuticas, definido en el artículo 3 de la Ley 10/1977, de 4 de enero, y el espacio aéreo correspondiente a dicho ámbito.

2. A los efectos de esta Ley, se entenderá por:
Estado miembro, Territorio de un Estado miembro o interior del país, el ámbito de aplicación del Tratado constitutivo de la Comunidad Económica Europea definido en el mismo, para cada Estado miembro, con las siguientes exclusiones:
En la República Federal de Alemania, la isla de Helgoland y el territorio de Büusingen; en el Reino de España, Ceuta y Melilla y en la República Italiana, Livigno, Campione d'Italia y las aguas nacionales del lago de Lugano, en cuanto territorios no comprendidos en la Unión Aduanera.
En el Reino de España, Canarias; en la República Francesa, los Departamentos de ultramar y en la República Helénica, Monte Athos, en cuanto territorios excluidos de la armonización de los impuestos sobre el volumen de negocios.
Comunidad y territorio de la Comunidad, el conjunto de los territorios que constituyen el interior del país para cada Estado miembro, según el número anterior.
Territorio tercero y país tercero, cualquier territorio distinto de los definidos como interior del país en el número 1) anterior.

3. A efectos de este impuesto, las operaciones efectuadas con el Principado de Mónaco y con la isla de Man tendrán la misma consideración que las efectuadas, respectivamente, con Francia, y el Reino Unido de Gran Bretaña e Irlanda del Norte.


Imposta sul Valore Aggiunto (IVA)
TITOLO I - artt. 1-20Disposizioni generali

Art. 7 - Territorialità dell'imposta
[1] Agli effetti del presente decreto:
a) per "Stato" o "territorio dello Stato" si intende il territorio della Repubblica italiana, con esclusione dei comuni di Livigno e di Campione d'Italia e delle acque italiane del lago di Lugano;

b) per "Comunità" o "territorio della Comunità" si intende il territorio corrispondente al campo di applicazione del Trattato istitutivo della Comunità economica europea con le seguenti esclusioni, oltre quella indicata nella lettera a):
1) per la Repubblica ellenica, il Monte Athos;
2) per la Repubblica federale di Germania, l'isola di Helgoland ed il territorio di Busingen;
3) per la Repubblica francese, i Dipartimenti d'oltremare;
4) per il Regno di Spagna, Ceuta, Melilla e le isole Canarie;

c) il Principato di Monaco e l'isola di Man si intendono compresi nel territorio rispettivamente della Repubblica francese e del Regno Unito di Gran Bretagna e Irlanda del Nord.


Os seguintes incisos trazem explícito o local a ser considerado como o da efetiva negociação de prestação de serviços ou compra e venda de mercadorias:

Imposta sul Valore Aggiunto (IVA)
TITOLO I - artt. 1-20Disposizioni generali
(...)
[2] Le cessioni di beni si considerano effettuate nel territorio dello Stato se hanno per oggetto beni immobili ovvero beni mobili nazionali, comunitari o vincolati al regime della temporanea importazione, esistenti nel territorio dello stesso ovvero beni mobili spediti da altro Stato membro, installati, montati o assiemati nel territorio dello Stato dal fornitore o per suo conto. Si considerano altresì effettuate nel territorio dello Stato le cessioni di beni nei confronti di passeggeri nel corso di un trasporto intracomunitario a mezzo di navi, aeromobili o treni, se il trasporto ha inizio nel territorio dello Stato; si considera intracomunitario il trasporto con luogo di partenza e di arrivo siti in Stati membri diversi e luogo di partenza quello di primo punto di imbarco dei passeggeri, luogo di arrivo quello dell'ultimo punto di sbarco.

[3] Le prestazioni di servizi si considerano effettuate nel territorio dello Stato quando sono rese da soggetti che hanno il domicilio nel territorio stesso o da soggetti ivi residenti che non abbiano stabilito il domicilio all'estero, nonché quando sono rese da stabili organizzazioni in Italia di soggetti domiciliati e residenti all'estero; non si considerano effettuate nel territorio dello Stato quando sono rese da stabili organizzazioni all'estero di soggetti domiciliati o residenti in Italia. Per i soggetti diversi dalle persone fisiche, agli effetti del presente articolo, si considera domicilio il luogo in cui si trova la sede legale e residenza quello in cui si trova la sede effettiva.

[4] In deroga al secondo e al terzo comma:
a) le prestazioni di servizi relativi a beni immobili, comprese le perizie, le prestazioni di agenzia e le prestazioni inerenti alla preparazione e al coordinamento dell'esecuzione dei lavori immobiliari, si considerano effettuate nel territorio dello Stato quando l'immobile è situato nel territorio stesso;
b) le prestazioni di servizi, comprese le perizie, relative a beni mobili materiali e le prestazioni di servizi culturali, scientifici, artistici, didattici, sportivi, ricreativi e simili, nonché le operazioni di carico, scarico, manutenzione e simili, accessorie ai trasporti di beni, si considerano effettuate nel territorio dello Stato quando sono eseguite nel territorio stesso;
c) le prestazioni di trasporto si considerano effettuate nel territorio dello Stato in proporzione alla distanza ivi percorsa;
d) le prestazioni derivanti da contratti di locazione anche finanziaria, noleggio e simili di beni mobili materiali diversi dai mezzi di trasporto, le prestazioni di servizi indicate al numero 2) del secondo comma dell'articolo 3, le prestazioni pubblicitarie, di consulenza e assistenza tecnica o legale, comprese quelle di formazione e di addestramento del personale, le prestazioni di servizi di telecomunicazione, di elaborazione e fornitura di dati e simili, le operazioni bancarie, finanziarie e assicurative e le prestazioni relative a prestiti di personale, nonché le prestazioni di intermediazione inerenti alle suddette prestazioni o operazioni e quelle inerenti all'obbligo di non esercitarle, nonché le cessioni di contratti relativi alle prestazioni di sportivi professionisti, si considerano effettuate nel territorio dello Stato quando sono rese a soggetti domiciliati nel territorio stesso o a soggetti ivi residenti che non hanno stabilito il domicilio all'estero e quando sono rese a stabili organizzazioni in Italia di soggetti domiciliati o residenti all'estero, a meno che non siano utilizzate fuori dalla Comunità economica europea;

e) le prestazioni di servizi e le operazioni di cui alla lettera precedente rese a soggetti domiciliati o residenti in altri Stati membri della Comunità Economica Europea, si considerano effettuate nel territorio dello Stato quando il destinatario non è soggetto passivo dell'imposta nello Stato in cui ha il domicilio o la residenza;

f) le operazioni di cui alla lettera d), escluse le prestazioni di servizi di telecomunicazione, le prestazioni di consulenza e assistenza tecnica o legale, ivi comprese quelle di formazione e di addestramento del personale, di elaborazione e fornitura di dati e simili, rese a soggetti domiciliati e residenti fuori della Comunità Economica Europea nonché quelle derivanti da contratti di locazione, anche finanziaria, noleggio e simili di mezzi di trasporto rese da soggetti domiciliati o residenti fuori della Comunità stessa ovvero domiciliati o residenti nei territori esclusi a norma del primo comma , lettera a), ovvero da stabili organizzazioni operanti in detti territori, si considerano effettuate nel territorio dello Stato quando sono ivi utilizzate; queste ultime prestazioni, se rese da soggetti domiciliati o residenti in Italia, si considerano effettuate nel territorio dello Stato quando sono utilizzate in Italia o in altro Stato membro della Comunità stessa;

f bis) Le prestazioni di servizi di telecomunicazione rese a soggetti domiciliati o residenti fuori dal territorio del Comunità da soggetti domiciliati o residenti fuori dalla Comunità stessa, ovvero domiciliati o residenti nei territori esclusi a norma del primo comma, lettera a), si considerano effettuate nel territorio dello Stato stesso o quando, realizzandosi la prestazione tramite cessione di schede prepagate o di altri mezzi tecnici preordinati all'utilizzazione del servizio, la loro distribuzione avviene, direttamente o a mezzo di commissari, rappresentanti, o altri intermediari, nel territorio dello Stato.

[6] Non si considerano effettuate nel territorio dello Stato le cessioni all'esportazione, le operazioni assimilate a cessioni all'esportazione e i servizi internazionali o connessi agli scambi internazionali di cui ai successivi artt. 8, 8 bis e 9.


8- O IVA e sua correlação com o caso brasileiro




No Brasil, as normas vinculadas ao elemento territorial do ICMS guardam relação com as disposições do IVA.

O local da prestação é tratado pela Lei Complementar como o elemento espacial, ou seja, onde ocorre o fato gerador do imposto.

A definição adequada do local da operação é essencial, particularmente para evitar conflitos de competência, definindo para qual Estado é devido o tributo, em ocorrendo situações que possam gerar uma certa confusão em relação ao agente ativo (neste aspecto, concernente “a quem” recolher o tributo).

A LC nº 87/1996 seguiu o ordenamento instituído pelo Convênio ICMS nº 66/1988, elencando os locais da operação ou da prestação, para fins de cobrança do ICMS e definição do estabelecimento responsável, de conformidade com o tipo de operação realizada (art. 11, caput, LC nº 87/1996; art. 27, caput, Convênio ICMS nº 66/1988).

Assim, tratando-se de mercadoria ou bem, o local da operação é (art. 11, I, LC nº 87/1996; art. 27, I, Convênio ICMS nº 66/1988):

a- o do estabelecimento onde ela se encontre, quando da ocorrência do fato gerador (art. 11, I, a, LC nº 87/1996; art. 27, I, a, Convênio ICMS nº 66/1988).

Circulação é a transferência da titularidade da mercadoria. Esta é a coisa colocada no comércio, circulando e gerando lucro a cada operação até o seu consumo final, quando deixa o ciclo econômico e se incorpora ao patrimônio de alguém, ou se perde, ou se gasta, ou se torna obsoleta, sem valor comercial. Logo, se A vende mercadoria para B, este passa a ser seu proprietário, consumindo-a ou promovendo nova circulação para C, que a adquire. Sempre com um objetivo econômico: o de auferir lucro em cada operação de circulação. O vendedor entrega a mercadoria e o comprador paga o seu valor em dinheiro.

Surge aqui uma questão: o fato gerador ocorre quando o comprador entrega ao vendedor a quantia concernente ao valor fixado para a mercadoria (venda a vista), caracterizando assim a relação de compra e venda tradicional, ou quando simplesmente a retira do estabelecimento alienante, com pagamento fixado em data futura (venda a prazo)?

Em primeiro lugar, considerando a evolução histórica das relações comerciais, o correto seria tributar a operação no momento em que ocorresse a efetiva transferência da propriedade da mercadoria. E esta somente se concretiza quando o comprador paga o preço fixado pelo vendedor. Enquanto não pago o preço (condição resolutiva), a mercadoria pertence ao alienante, até que se implemente a referida condição. Mas o aumento da complexidade das relações civis e comerciais fez com que a compra e o pagamento ocorressem em momentos distintos, desvinculando-se este último da operação que lhe deu origem e constituindo-se em uma obrigação e direito autônomos. Obrigação de pagar, para o comprador, e direito de receber, para o vendedor.

A própria legislação civilista pátria em vigor determina que o domínio das coisas móveis se transfere pela mera tradição, caracterizada esta como a simples entrega da coisa (art. 620 do Código Civil de 1916; art. 1.267 do Novo Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406, de 10.01.2002, em vigor a partir de 11.01.2003). Dessa forma, o comprador é investido na titularidade da coisa, mesmo que a liquidação de sua obrigação permaneça pendente, ou sequer venha a ocorrer (o que desafia a execução forçada do devedor, nos termos da legislação processual civil).

À primeira vista, podem parecer desnecessários tais comentários, vez que estas práticas já fazem parte do dia-a-dia dos comerciantes. Mas estas operações ensejam problemas de natureza variada, como a definição da data para emissão da nota fiscal respectiva, ou mesmo o reconhecimento da receita oriunda das vendas, sejam estas realizadas a vista ou a prazo. No primeiro caso, não haverá problemas de registro, vez que a receita será reconhecida de imediato, observando tanto o regime de caixa quanto o de competência. Nas vendas a prazo, as normas contábeis determinam que se reconheça a receita do período, registrando-a em conta de resultado para fins de apuração do lucro ou prejuízo do período, com contrapartida dos recebimentos futuros em conta de Clientes, no Ativo Circulante. Observa-se, pois, o regime da competência dos exercícios.

Em qualquer um desses casos, nada modifica a situação em relação à titularidade da mercadoria. Ademais, o referido vocábulo exprime, para efeitos de tributação, apenas a “qualidade de titular de alguma coisa, em virtude de título conferido, ou outorgado”, nas palavras de De Plácido e Silva (op. cit., 1993, vol. IV, p. 377). O que importa, para o Fisco, é a venda da mercadoria. O recebimento do numerário é um problema do alienante.

Carrazza (op. cit., 2002: 48), citando Misabel Derzi e Sacha Calmon[7], traz-nos preciosas lições concernentes ao tema:

Analisando a questão, Misabel Derzi e Sacha Calmon Navarro Coelho averbam, com a autoridade que os caracteriza: “(...) operação, circulação e mercadorias são conceitos profundamente interligados e complementares, que não podem ser analisados em separado, sem que o intérprete se dê conta de suas profundas interrelações. Não interessa para delimitação da hipótese tributária nem a operação que seja inábil à transferência do domínio (como locação, comodato, arrendamento mercantil, consignação mercantil etc.); nem tampouco o contrato de compra e venda em si, isoladamente, que embora perfeito, não transfere o domínio quer no Direito Civil, quer no Direito Comercial, sem a tradição; assim, a circulação de mercadoria é conceito complementar importante porque representa a tradição da coisa, execução de um contrato translativo, movimentação que faz a transferência do domínio e configura circulação jurídica, marcada pelo animus de alterar a titularidade”.

E continua o citado tributarista (op. cit., 2002: 48-49):

Assim, não cabe ICMS, quando simplesmente as mercadorias saem do estabelecimento comercial e a eles retornam, por não se ter concretizado, na compra e venda, a imprescindível tradição.

Deveras, só quando há transferência da titularidade das mercadorias (o domínio ou a posse indireta, como exteriorização da propriedade) é que o fato imponível do ICMS se verifica. Do contrário, inocorre a alteração da titularidade da res; verifica-se, apenas, a saída física das mercadorias. Juridicamente falando, é o mesmo que tivessem sido levadas do depósito do estabelecimento para a vitrina. Ninguém cogitaria, na hipótese, de ocorrência de operação mercantil, apta a ensejar a cobrança de ICMS.

(...)

Em suma, o dever de pagar ICMS só nasce com a mudança da titularidade do domínio ou da posse ostentatória da propriedade (posse autônoma, despida de título de domínio hábil) da mercadoria, que, como já escrevemos, é um bem móvel preordenado à prática de atos de comércio.

É precisamente em função disso que a LC nº 87/1996 menciona que considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular (art. 12, I) — neste último caso, com as ressalvas doutrinárias já expostas —, independentemente da implementação do pagamento do preço, complementando assim as regras previstas na alínea a do inciso I do art. 11, em comento;

b- o local onde ela se encontre, mormente nos casos em que a fiscalização aponta mercadorias desacompanhadas de nota fiscal ou quando acompanhadas de documentação inidônea (art. 11, I, b, LC nº 87/1996; art. 27, I, c, Convênio ICMS nº 66/1988). Tal situação é muito comum nos casos em que o transportador mantém, em seu depósito, mercadoria de propriedade do contratante desacompanhada de nota fiscal, enquanto aguarda a remessa do documento competente. Comparecendo o agente da fiscalização estadual ao estabelecimento do transportador, se aquele não acatar as explicações deste, pode lavrar auto de infração e imposição de multa, nos termos da legislação aplicável;

c- o do estabelecimento que transfira a propriedade ou o título que a represente, de mercadoria por ele adquirida no País e que por ele não tenha transitado (art. 11, I, c, LC nº 87/1996; art. 27, § 5º, Convênio ICMS nº 66/1988), salvo no caso de mercadoria recebida em regime de depósito de contribuinte de Estado que não o do depositário (art. 11, § 1º, LC nº 87/1996; art. 27, § 6º, Convênio ICMS nº 66/1988). Verbi gratia, A adquire mercadorias de B, determinando que este as remeta para C, adquirente final. O Convênio ICMS nº 66/1988 continha as expressões “e que se ache em poder de terceiros, sendo irrelevante o local onde se encontre” (art. 27, § 5º, última parte), sendo estas suprimidas pela LC nº 87/1996. E com razão. Afinal, se a Constituição legou à lei complementar (art. 155, § 2º, XII, d) a tarefa de definir o local da prestação, este deve estar definido na lei competente;

d- se a mercadoria ou bem for importado do exterior, o local da operação ou da prestação é o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física ou o do domicílio do adquirente, quando não estabelecido (art. 11, I, d e e, LC nº 87/1996; art. 27, I, d, Convênio ICMS nº 66/1988). A LC nº 87/1996 suprimiu a menção à destinação dos bens importados (se destinados a consumo ou ativo fixo do estabelecimento), que existia na redação do revogado Convênio ICMS nº 66/1988. Depreende-se que todas as operações de importação dos bens e mercadorias sofrerão a incidência do tributo, quando da entrada destes no estabelecimento, não importando se este for do adquirente ou do destinatário;

e- o art. 11, I, f da LC nº 87/1996 definia que, nos casos de arrematação de mercadoria importada do exterior ou apreendida, o local da prestação seria aquele onde fosse realizada a licitação (art. 27, I, d, Convênio ICMS nº 66/1988). Com as alterações promovidas pela LC nº 114/2002, o local da operação ou da prestação, para fins de cobrança do imposto, passou a ser “aquele onde seja realizada a licitação, no caso de arrematação de mercadoria ou bem importados do exterior e apreendidos ou abandonados”. Incorporou-se ao texto legal os vocábulos “bem” e “abandonados” (particípio passado do verbo abandonar). Assim, se a Lei anterior definia que apenas as mercadorias que se enquadrassem naquelas situações elencadas estariam submetidas à incidência do ICMS, com as alterações promovidas pela LC nº 114/2002, os bens também sofrerão a incidência do ICMS, quando arrematados em hasta pública;

f- tratando-se de aquisição de energia elétrica e petróleo e seus derivados, quando não destinados à industrialização ou à comercialização, o local para cobrança é o do Estado onde estiver localizado o adquirente. Assim, se A, localizado em Minas Gerais, vende combustíveis para consumo de B, localizado em São Paulo, o ICMS pertencerá a este último. Entretanto, se o objetivo da operação for diverso, o imposto será devido ao Estado onde se localiza o vendedor (art. 11, I, g, LC nº 87/1996);

g- nos casos em que o ouro não for considerado ativo financeiro ou instrumento cambial, sendo tratado, pois, como mera mercadoria, o ICMS será devido ao Estado onde foi extraído (art. 11, I, h, LC nº 87/1996; art. 27, I, g, Convênio ICMS nº 66/1988). Caso contrário, deve ter sua origem identificada (art. 11, § 2º, LC nº 87/1996; art. 27, § 7º, Convênio ICMS nº 66/1988);

h- o local do desembarque do produto, na hipótese de captura de peixes, crustáceos e moluscos (art. 11, I, i, LC nº 87/1996; art. 27, I, f, Convênio ICMS nº 66/1988).

Já no tocante à prestação de serviços de transporte, a LC nº 87/1996 definiu como local para pagamento do ICMS aquele onde houver iniciado a prestação ou onde se encontre o transportador quando apanhado em situação irregular de falta de documentação fiscal ou documentação inidônea (art. 11, II, a e b, LC nº 87/1996; art. 27, II, b, Convênio ICMS nº 66/1988). Em contraposição, o revogado Convênio ICMS nº 66/1988 não contemplava, como local da prestação, o de localização do transportador faltoso com a legislação tributária.

Na alínea c do mesmo inciso ficou definido que o local da operação ou prestação para efeito de cobrança do ICMS será o do estabelecimento destinatário do serviço de transporte, “na hipótese do inciso XIII do art. 12 e para os efeitos do § 3º do art. 13”. Trata-se da cobrança de diferencial de alíquotas em prestações de transporte interestaduais. Veja-se, pois, o que determinam os dispositivos legais mencionados:

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
(...)
XIII - da utilização, por contribuinte, de serviço cuja prestação se tenha iniciado em outro Estado e não esteja vinculada a operação ou prestação subseqüente.

Art. 13. A base de cálculo do imposto é:
(...)
IX - na hipótese do inciso XIII do art. 12, o valor da prestação no Estado de origem.
(...)
§ 3º No caso do inciso IX, o imposto a pagar será o valor resultante da aplicação do percentual equivalente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual, sobre o valor ali previsto.

Assim, contribuinte localizado em Minas Gerais contrata serviços de transporte em São Paulo, para entrega de bens que não serão empregados em seu processo produtivo. A base de cálculo será o valor da prestação em São Paulo, cabendo ao Estado originário o recolhimento do tributo e ao Estado destinatário o diferencial de alíquota. É o que se entende da leitura conjugada dos dispositivos legais.

As alíneas do inciso III arrolam os locais da prestação onerosa dos serviços de comunicação, contemplando, inicialmente, o local da prestação (art. 11, III, a, LC nº 87/1996; art. 27, III, a, Convênio ICMS nº 66/1988); o do estabelecimento da concessionária ou permissionária que forneça ficha, cartão ou assemelhados, com que o serviço é pago (art. 11, III, b, LC nº 87/1996; art. 27, III, b, Convênio ICMS nº 66/1988); o do estabelecimento destinatário dos serviços, nas condições previstas no art. 12, XIII, da LC nº 87/1996, já comentado no parágrafo anterior (art. 11, III, c, LC nº 87/1996; art. 27, III, c, Convênio ICMS nº 66/1988); e, finalmente, onde seja cobrado o serviço, nos demais casos (art. 11, III, d, LC nº 87/1996; art. 27, III, d, Convênio ICMS nº 66/1988).

A LC nº 102/2000 acrescentou uma subalínea c-1 à alínea c do inciso III, art. 11, da LC nº 87/1996, considerando como local da prestação “o do estabelecimento ou domicílio do tomador do serviço, quando prestado por meio de satélite”. Tal dispositivo veio para contemplar operações não previstas na lei anterior, observando assim o princípio da tipicidade tributária.

Ainda no quesito concernente às prestações onerosas de comunicação, a LC nº 102/2000 acrescentou o § 6º ao art. 11 da LC nº 87/1996, que, em suma, determina a divisão do ICMS entre os Estados em que se localizarem o tomador e o prestador do serviço, desde que este seja não medido, “envolva localidades situadas em diferentes unidades de Federação e cujo preço seja cobrado por períodos definidos”.

Quanto aos serviços “não onerosos”, vide as considerações exaradas no subitem 10.1.1, letra d, retro.

No art. 11, IV, da LC nº 87/1996, substituiu-se a expressão “estabelecimento encomendante”, prevista na redação do art. 27, II, do Convênio ICMS nº 66/1988, para “estabelecimento ou domicílio do destinatário”. Tal mudança aplica-se naqueles casos em que ocorre intermediação na operação. A contrata B (no exterior) para cumprir ordem de C. Este é o tomador e destinatário final do bem. Pela redação da LC nº 87/1996, o local da prestação para fins de pagamento do ICMS seria, no exemplo dado e à luz da lei, o estabelecimento ou o domicílio de C.

Os §§ 3º e 5º do art. 11 da LC nº 87/1996 trazem definições sobre estabelecimento e condições referentes à posterior saída de mercadorias remetidas para depósito fechado. Assim, o § 3º determina que para efeito da LC nº 87/1996, considera-se como estabelecimento o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias (redação semelhante à do art. 27, § 3º, do Convênio ICMS nº 66/1988).

Ocorrendo a impossibilidade de determinação do estabelecimento, considera-se como tal o local em que tenha sido efetuada a operação ou prestação, encontrada a mercadoria ou constatada a prestação (art. 11, § 3º, I, LC nº 87/1996; art. 27, § 2º, Convênio ICMS nº 87/1996). A última situação não estava configurada no revogado Convênio.

Para fins de tributação, a LC nº 87/1996 identifica como autônomo cada estabelecimento do mesmo titular, o veículo usado no comércio ambulante e na captura de pescado, respondendo pelo crédito tributário todos os estabelecimentos do mesmo titular (art. 11, § 3º, II, III e IV, LC nº 87/1996; art. 27, § 3º, Convênio ICMS nº 87/1996), seguindo as diretrizes do Decreto-lei nº 406/1968 (art. 6º, § 2º).

Quando a mercadoria for remetida para armazém geral ou para depósito fechado do próprio contribuinte, no mesmo Estado, a posterior saída considerar-se-á ocorrida no estabelecimento do depositante, salvo se para retornar ao estabelecimento remetente (art. 11, § 5º, I, LC nº 87/1996; art. 27, § 4º, Convênio ICMS nº 87/1996). Isso significa que o ICMS devido no estabelecimento matriz, em relação às mercadorias transferidas, é repassado para o depósito, que compensará o tributo com a saída posterior, se for ali mesmo efetuada.

Oportunamente, deve-se destacar que o princípio da autonomia dos estabelecimentos para fins de tributação pelo ICMS vigora em nosso ordenamento desde o Decreto-lei nº 406[8], de 31.12.1968, cujo § 2º do art. 6º determinava que “Os Estados poderão considerar como contribuinte autônomo cada estabelecimento comercial, industrial ou produtor, permanente ou temporário, do contribuinte, inclusive veículos utilizados por este no comércio ambulante”.

Apresenta-se, a seguir, quadro resumo dos dispositivos estudados.

LC 87/1996
Convênio ICMS 66/1988
Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:
I - tratando-se de mercadoria ou bem:
a) o do estabelecimento onde se encontre, no momento da ocorrência do fato gerador;
b) onde se encontre, quando em situação irregular pela falta de documentação fiscal ou quando acompanhado de documentação inidônea, como dispuser a legislação tributária;
c) o do estabelecimento que transfira a propriedade, ou o título que a represente, de mercadoria por ele adquirida no País e que por ele não tenha transitado;
c-1) o do estabelecimento ou domicílio do tomador do serviço, quando prestado por meio de satélite;
(Alínea acrescentada pela LC 102/2000.)
d) importado do exterior, o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física;
e) importado do exterior, o do domicílio do adquirente, quando não estabelecido;
f) aquele onde seja realizada a licitação, no caso de arrematação de mercadoria importada do exterior e apreendida;
f) aquele onde seja realizada a licitação, no caso de arrematação de mercadoria ou bem importados do exterior e apreendidos ou abandonados;
(Nova redação dada pela Lei Complementar nº 114/2002.)
g) o do Estado onde estiver localizado o adquirente, inclusive consumidor final, nas operações interestaduais com energia elétrica e petróleo, lubrificantes e combustíveis dele derivados, quando não destinados à industrialização ou à comercialização;
h) o do Estado de onde o ouro tenha sido extraído, quando não considerado como ativo financeiro ou instrumento cambial;
i) o de desembarque do produto, na hipótese de captura de peixes, crustáceos e moluscos;
II - tratando-se de prestação de serviço de transporte:
a) onde tenha início a prestação;
b) onde se encontre o transportador, quando em situação irregular pela falta de documentação fiscal ou quando acompanhada de documentação inidônea, como dispuser a legislação tributária;
c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese do inciso XIII do art. 12 e para os efeitos do § 3º do art. 13;
III - tratando-se de prestação onerosa de serviço de comunicação:
a) o da prestação do serviço de radiodifusão sonora e de som e imagem, assim entendido o da geração, emissão, transmissão e retransmissão, repetição, ampliação e recepção;
b) o do estabelecimento da concessionária ou da permissionária que forneça ficha, cartão, ou assemelhados com que o serviço é pago;
c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese e para os efeitos do inciso XIII do art. 12;
d) onde seja cobrado o serviço, nos demais casos;
IV - tratando-se de serviços prestados ou iniciados no exterior, o do estabelecimento ou do domicílio do destinatário.
§ 1º O disposto na alínea c do inciso I não se aplica às mercadorias recebidas em regime de depósito de contribuinte de Estado que não o do depositário.
§ 2º Para os efeitos da alínea h do inciso I, o ouro, quando definido como ativo financeiro ou instrumento cambial, deve ter sua origem identificada.
§ 3º Para efeito desta Lei Complementar, estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias, observado, ainda, o seguinte:
I - na impossibilidade de determinação do estabelecimento, considera-se como tal o local em que tenha sido efetuada a operação ou prestação, encontrada a mercadoria ou constatada a prestação;
II - é autônomo cada estabelecimento do mesmo titular;
III - considera-se também estabelecimento autônomo o veículo usado no comércio ambulante e na captura de pescado;
IV - respondem pelo crédito tributário todos os estabelecimentos do mesmo titular.
§ 4º (VETADO)
§ 5º Quando a mercadoria for remetida para armazém geral ou para depósito fechado do próprio contribuinte, no mesmo Estado, a posterior saída considerar-se-á ocorrida no estabelecimento do depositante, salvo se para retornar ao estabelecimento remetente.
§ 6o Na hipótese do inciso III do caput deste artigo, tratando-se de serviços não medidos, que envolvam localidades situadas em diferentes unidades da Federação e cujo preço seja cobrado por períodos definidos, o imposto devido será recolhido em partes iguais para as unidades da Federação onde estiverem localizados o prestador e o tomador.
(Parágrafo acrescentado pela LC 102/2000.)

CAPÍTULO V
Da Localização da Operação e da Prestação
Art. 27 O local da operação ou da prestação, para os efeitos de cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:
I - tratando-se de mercadoria:
a) o do estabelecimento onde se encontre, no momento da ocorrência do fato gerador;
b) o do estabelecimento em que se realize cada atividade de produção, extração, industrialização ou comercialização, na hipótese de atividades integradas;
c) onde se encontre, quando em situação fiscal irregular, como dispuser a legislação tributária;
d) o do estabelecimento destinatário ou, na falta deste, o do domicílio do adquirente, quando importada do exterior, ainda que se trate de bens destinados a consumo ou a ativo fixo do estabelecimento;
e) aquele onde seja realizada a licitação, no caso de arrematação de mercadoria importada do exterior e apreendida;
f) o de desembarque do produto, na hipótese de captura de peixes, crustáceos e moluscos;
g) o do Estado de onde o ouro tenha sido extraído, em relação à operação em que deixe de ser considerado como ativo financeiro ou instrumento cambial;
II - tratando-se de prestação de serviço de transporte:
a) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese e para os efeitos do inciso III do art. 2º;
b) onde tenha início a prestação, nos demais casos.
III - tratando-se de prestação de serviço de comunicação:
a) o da prestação do serviço de radiodifusão sonora e de televisão, assim entendido o da geração, emissão, transmissão e retransmissão, repetição, ampliação e recepção;
b) o do estabelecimento da concessionária ou permissionário que forneça ficha, cartão ou assemelhados necessários à prestação do serviço;
c) o do estabelecimento destinatário do serviço, na hipótese e para os efeitos do inciso III do artigo 2º;
d) onde seja cobrado o serviço, nos demais casos.
IV - tratando-se de serviços prestados ou iniciados no exterior, o do estabelecimento encomendante.
§ 1º Estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, onde pessoas físicas ou jurídicas exercem suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontram armazenadas mercadorias, ainda que o local pertença a terceiros.
§ 2º Na impossibilidade de determinação do estabelecimento, nos termos do parágrafo anterior, considera-se como tal, para os efeitos destas normas, o local em que tenha sido efetuada a operação ou prestação ou encontrada a mercadoria.
§ 3º Considera-se como estabelecimento autônomo, em relação ao estabelecimento beneficiador, industrial, comercial ou cooperativo, ainda que do mesmo titular, cada local de produção agropecuária ou extrativa vegetal ou mineral, de geração, inclusive de energia, de captura pesqueira, situado na mesma área ou em áreas diversas do referido estabelecimento.
§ 4º Quando a mercadoria for remetida para armazém-geral ou para depósito fechado do próprio contribuinte, no mesmo Estado, a posterior saída considerar-se-á ocorrida no estabelecimento do depositante, salvo se para retornar ao estabelecimento remetente.
§ 5º Considera-se, também, local da operação o do estabelecimento que transfira a propriedade, ou o título que a represente, de mercadoria que por ele não tenha transitado e que se ache em poder de terceiros, sendo irrelevante o local onde se encontre.
§ 6º O disposto no parágrafo anterior não se aplica às mercadorias recebidas de contribuintes de Estado diverso do depositário, mantidas em regime de depósito.
§ 7º Para efeito do disposto na alínea "g" do inciso I, o ouro, quando definido como ativo financeiro ou instrumento cambial, deve ter sua origem identificada.
§ 8º Para os fins destas normas, a plataforma continental, o mar territorial e a zona econômica exclusiva integram o território do Estado e do Município que lhes é confrontante.
Acrescido o § 9º pelo Conv. ICMS 108/89, efeitos a partir de 01.05.90.
§ 9º Em relação ao trigo importado sob regime de monopólio do Banco do Brasil S.A., considera-se local da operação o Estado para o qual se destine.










[1] Visão Global da fiscalidade no Mercosul: tributação do consumo e da renda. In MARTINS, Ives Gandra da Silva. Direito Tributário no Mercosul. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 33.
[2] A Necessidade da instituição do IVA no Sistema Constitucional Tributário Brasileiro.
[3] Reforma Tributária – Mercosul e União Européia. Curitiba: Juruá Editora, 2003, p. 81.
[4] Simerias y asimetrias de los impuestos generales al consumo en el Mercosur. In PROENÇA, Alencar Mello; BIOCCA, Stella Maris. V Encontro Internacional de Direito da América do Sul: a integração rumo ao século XXI. Pelotas: EDUCAT, 1996 p. 294.
[5] Texto de justificativa do substitutivo da reforma tributária do Estado de Minas Gerais.
[6] A Necessidade da instituição do IVA no Sistema Constitucional Tributário Brasileiro. P. 25.
24DERZI, Misabel Machado e COELHO, Sacha Calmon Navarro – A hipótese de incidência do ICMS: Irrelevância dos contratos de compra e venda, sem tradição ou entrega das mercadorias. In Direito Tributário Aplicado – Estudos e Pareceres. Belo Horizonte: Del Rey, 1997, p. 168.
[8] Entendemos que o Decreto-lei nº 406/1968 foi revogado pela LC nº 87/1996, naquilo que concerne ao ICMS.