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quinta-feira, 9 de maio de 2013

Debate constitucional IPI sobre importação de veículo tem repercussão geral



O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral na discussão sobre a incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na importação de veículo automotor por pessoa natural e para uso próprio. O assunto é abordado no Recurso Extraordinário 723.651.

Na origem, o processo refere-se a Mandado de Segurança impetrado contra ato da Alfândega da Receita Federal no porto de São Francisco do Sul (SC), para que se abstivesse de cobrar o tributo sobre um automóvel importado, ano 1964, adquirido pelo recorrente, como colecionador de veículos. Em primeira instância, ele obteve sentença favorável, mas posteriormente o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) decidiu pela incidência do imposto, por entender que é irrelevante a destinação final do produto. Essa decisão é agora contestada no Supremo, por meio do Recurso Extraordinário.

Questões tributárias
Ao exigir o recolhimento do tributo para desembaraço aduaneiro do veículo importado, a autoridade alfandegária apoiou-se nos artigo 153, inciso IV, da Constituição Federal, que trata da competência da União para instituir o tributo. Também foi mencionado o artigo 46, parágrafo único, do Código Tributário Nacional (Lei 5.172/1966), que prevê a incidência do IPI quando do desembaraço aduaneiro de produto industrializado importado.

O importador do veículo alega, entretanto, que a exigência conflita com o princípio da não cumulatividade tributária, o que violaria o artigo 153, parágrafo 3º, inciso II, da CF. Ele invoca, além disso, precedentes da Segunda Turma do Supremo nos quais se concluiu pela inconstitucionalidade da incidência do IPI em casos assemelhados — recursos de Agravo Regimental nos REs 255.090, 501.773 e 255.682, entre outros.

A União, por sua vez, contestou a existência de repercussão geral e a suposta afronta direta à Constituição. No mérito, sustenta ausência de pronunciamento do STF sobre o tema, com eficácia vinculante. Isso porque as decisões até agora emanadas do Supremo foram tomadas pelas turmas em grau de recurso. Ressalta também a necessidade de a matéria ser discutida também sob o ângulo das definições do fato gerador e do contribuinte do imposto pelo Código Tributário Nacional.

Defesa da repercussão
Ao manifestar-se no sentido de reconhecer a repercussão geral da matéria suscitada, o relator do RE, ministro Marco Aurélio, salientou que o assunto “é passível de repetir-se em inúmeros processos”. Ele lembrou que os precedentes da corte foram formalizados na apreciação de Agravos Regimentais e que, na discussão de um deles, no RE 550.170, ressaltou que o tema exigia um pronunciamento do Plenário do STF.

Ele observou que o artigo 46 do CTN “tem recebido interpretação linear, além do que o tema é objeto, também, da Lei 4.502/64 (dispõe sobre o Imposto de Consumo) e do Decreto-Lei 34/1966 (dispõe sobre a nova denominação do Imposto de Consumo)". O entendimento do relator foi seguido por maioria no Plenário Virtual da Corte, para que o mérito da questão seja julgado pela corte.

Na discussão, o ministro Luiz Fux terminou vencido. Não se manifestaram os ministros Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Rosa Weber. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

Revista Consultor Jurídico, 8 de maio de 2013

Município deve respeitar competência para instituir tributos



Por Luiz Gustavo A. S. Bichara e Francisco Carlos Rosas Giardina

O Município do Rio de Janeiro, na medida em que se avizinham eventos de grande repercussão para a cidade e o país, começa a buscar fontes de recursos que façam frente aos grandes investimentos e, igualmente, que cubram as inúmeras desonerações fiscais contidas na Lei Municipal 5.230, de 25 de novembro de 2010.

A despeito do nobre objetivo de angariar receitas, o Município do Rio de Janeiro, evidentemente, não pode extrapolar da sua competência constitucional para instituir tributos. Um exemplo gritante do equívoco cometido é a recente Instrução Normativa SMF 20, de 9 de abril de 2013 (DOMRJ 10/4/2013) que, a pretexto de aclarar alguns pontos sobre o ISS devido por empresas de planos de saúde, passou a considerar as seguradoras especializadas em saúde como contribuintes do ISS.

A previsão, contudo, é evidentemente ilegal.

Não é recente a pretensão de alguns municípios pretenderem cobrar ISS sobre a atividade securitária. Ocorre que o Decreto-Lei 406/68 e, atualmente, a Lei Complementar 116/2003 não têm qualquer item que autorize a referida tributação. Nem mesmo cabe cogitar de uma intermediação de negócios. O seguro não é um serviço para fins de tributação.

Um problema mais delicado relacionado ao assunto se refere à atividade de planos de saúde. Isso porque, em que pese esteja ele elencado como hipótese de incidência do ISS, o plano de saúde não é, salvo exceções, um serviço em seu sentido técnico. A operação envolve obrigações de dar (indenizar por um evento ocorrido), quer seja pelo sistema de reembolso, quer seja um pagamento direto ao prestador do serviço, esse sempre que se dá por conta e ordem do beneficiário do plano.

Não por outro motivo é que o tema será, em breve, analisado pelo Supremo Tribunal Federal pelo regime de repercussão geral, mais especificamente no Recurso Extraordinário 651.703/PR, relator o Ministro Luiz Fux.

Ousando ainda mais, portanto, na medida em que nem mesmo o plano de saúde se revela como um serviço, o Município do Rio de Janeiro fez editar a aludida Instrução Normativa SMF 20/2013, tributando o seguro-saúde pelo ISS, providência que não se sustenta por uma série de razões.

A Lei Federal 10.185/2001 instituiu as seguradoras especializadas em saúde e estabeleceu, em seu artigo 2º, que, para efeito da Lei 9.656/98 e da Lei 9.961/2000, o seguro-saúde se enquadra como plano privado de assistência à saúde e a sociedade seguradora especializada em saúde como operadora de plano de assistência à saúde.

Essa constatação já é decisiva e resolve a questão. Contrariamente ao que entende o Município do Rio de Janeiro, a Lei 10.185/2001 tão somente submeteu o seguro-saúde ao regime próprio dos planos de saúde para fins regulatórios e de fiscalização da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Concluir que, daí, se possam dar efeitos tributários dessa magnitude é um passo demasiadamente largo.

Com efeito, uma vez que o seguro-saúde objetiva dar cobertura aos riscos de assistência médica e hospitalar, conforme o que se estabeleceu desde o Decreto-Lei 73/66, é apenas lógico deva o seguro-saúde estar sob o manto da mesma agência regulatória que as demais operadoras de planos de saúde. Não é razoável que, para o seguro-saúde, tenhamos a Superintendência Nacional de Seguros Privados (SUSEP) e, para os planos de saúde, a ANS. A normatização do setor deve ser uniforme.

É impertinente tirar dessa premissa, portanto, que o seguro-saúde seja idêntico ao plano de saúde. A Lei Complementar 116/2003 não coloca o seguro, seja ele qual for, como sujeito ao ISS. Aliás, se o fizesse, seria inconstitucional. A seguradora indeniza sinistros, não havendo prestação de serviços qualquer.

O Município do Rio de Janeiro, inclusive, se põe em contradição com suas próprias decisões. O próprio Coordenador da Coordenadoria de Revisão e Julgamento Tributários, em processo administrativo envolvendo uma seguradora de saúde, teve a oportunidade de decidir que “uma empresa seguradora quando administra sinistros acobertados por seus próprios contratos de seguros, não administra negócio de terceiro, administra o próprio negócio. Por outro lado, por se tratar de operação de seguro, o imposto incidente não é o ISS, mas o IOF, mercê do artigo 153, V, da Constituição Federal.”.

A administração pública deve ter coerência nas suas atitudes. O princípio da confiança anda lado a lado com a moralidade. A atividade empresarial não pode ficar à mercê de interpretações desencontradas ou de entendimentos dos administradores de ocasião.

Não é ocioso lembrar, que o seguro é tema sujeito à normatização federal apenas. Outros entes federativos que não a União Federal não têm competência alguma para criar regras que impactem no seguro.

O seguro está sujeito ao recolhimento do IOF, tributo federal, que grava o prêmio pago pelos segurados. Os municípios não podem pretender cobrar ISS de uma grandeza já tributada por um tributo federal.

Importante salientar que outras prefeituras, mais apegadas à legalidade, como o Município de São Paulo, expressamente declararam que o seguro-saúde não está submetido ao ISS, na medida que “as sociedades seguradoras, inclusive as Seguradoras Especializadas em Saúde, estão fora do campo de incidência do ISS e sujeitas a imposto de competência da União, conforme disposto no artigo 153, V da Constituição Federal.” (Solução de Consulta SF/DEJUG 74, de 21 de agosto de 2007).

Por fim, cabe atentar ao fato de que essa pretensão do Município do Rio de Janeiro vem plasmada em uma simples instrução normativa, inclusive com incidência imediata. Mesmo que lhe fosse admitido instituir tributos — e, por evidente, não o é — a referida norma deveria ter observado o princípio da anterioridade. Em verdade, mesmo se houvesse lei nesse sentido com a observância da anterioridade, isso pouco importa, a previsão seria inconstitucional de toda forma.

Afora esses aspectos de índole tributária, é necessário evidenciar que o seguro ocupa uma função da mais alta relevância para o país. O Município do Rio de Janeiro deveria estar preocupado em atrair investimentos, mantendo, em seu território, atividades econômicas relevantes, sob pena de termos novamente o esvaziamento da Cidade e do Estado que infelizmente se verificou na década de 90. Aquelas seguradoras que apostaram no Estado e no Município são agora punidas, ainda que de forma indireta.

A administração pública precisa se mostrar coerente com as suas posturas e com os encargos que lhe são confiados pelo texto constitucional. É mais do que o momento de se agir com a mais absoluta seriedade e respeito com os agentes econômicos.

A atividade securitária está assentada em critérios de mutualismo. Se há a quebra desse equilíbrio, todos perdem, uma vez que os interesses em jogo são diretamente do grupo segurado e, indiretamente, da própria sociedade e do Estado.

Luiz Gustavo A. S. Bichara é advogado tributarista, sócio do escritório Bichara, Barata, Costa & Rocha Advogados, vice-presidente da Comissão de Estudos Tributários da OAB/RJ, diretor da Associação Brasileira de Direito Financeiro e membro do general council da Intenational Fiscal Association.

Francisco Carlos Rosas Giardina é advogado no escritório Bichara, Barata & Costa Advogados.

Revista Consultor Jurídico, 9 de maio de 2013

Decreto 7.892/2013 dá transparência ao SRP



Por Tatiana Alvarenga Gouvêa e Jéssica Acocella

Em 23 de janeiro de 2013, foi editado o Decreto Federal 7.892, revogando expressamente o Decreto Federal 3.931/2001, que regulamentara, até então, o Sistema de Registro de Preços previsto no artigo 15 e parágrafos da Lei 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos da Administração Pública).

A importância da nova norma decorre principalmente do esforço que pode ser notado no sentido de restar enfim suprida, em alguma medida, as omissões, obscuridades e contradições apresentadas na regulamentação anterior, que dificultavam, no tocante a algumas questões centrais, a adequada compreensão do administrador público sobretudo no que diz respeito à regularidade do procedimento que deve ser por ele conduzido durante a vigência da ata de registro de preços (consistindo esta no instrumento vinculativo e obrigacional por meio do qual registram-se os preços, fornecedores, órgãos participantes e condições a serem praticadas em eventuais e futuras contratações).

Nesse sentido, como um primeiro resultado a ser comemorado, o recente Decreto tende tanto a propiciar uma atuação mais uniforme da administração Pública no que diz respeito às suas contratações administrativas – universo dentro do qual o sistema de registro de preços já representa um significativo percentual do volume total das compras da União – como, por via de consequência, a conferir maior segurança jurídica ao mercado fornecedor, que, em regra, embute nas propostas ofertadas à administração os mais diversificados riscos do negócio.

Se, por um lado, o Decreto 7.892/2013 manteve os principais conceitos pertinentes ao SRP — definido como o conjunto de procedimentos para registro formal de preços relativos à prestação de serviços e aquisição de bens, para contratações futuras e eventuais — bem como as hipóteses em que pode (ou deve) o gestor público adotá-lo, por outro, inovou em alguns aspectos pertinentes sobretudo ao procedimento licitatório e à vigência da Ata de registro de preços.

Principais inovações introduzidas pelo Decreto Federal 7.892/2013
1) Obrigatoriedade de divulgação da intenção de registrar preço (artigo 4º)

Estabelece o artigo 4º do decreto em análise que: Fica instituído o procedimento de Intenção de Registro de Preços - IRP, a ser operacionalizado por módulo do Sistema de Administração e Serviços Gerais - SIASG, que deverá ser utilizado pelos órgãos e entidades integrantes do Sistema de Serviços Gerais - SISG, para registro e divulgação dos itens a serem licitados e para a realização dos atos previstos nos incisos II e V do caput do artigo 5º e dos atos previstos no inciso II e caput do artigo 6º.

Assim, em sintonia com as alterações já introduzidas pelo Governo Federal na sua Rede Serpro (que consiste na rede de comunicação que provê a infraestrutura de TI necessária para realização dos procedimentos de compra eletrônica), em 22/08/2011, a nova regulamentação tornou obrigatório o cadastro da denominada “Intenção de Registro de Preços – IRP” no sistema eletrônico, que tem como finalidade principal conferir ampla publicidade à intenção da administração de realizar Pregão ou Concorrência para registro de preços, dando-se oportunidade para que outros órgãos e/ou entidades públicos possam manifestar o interesse em participar do certame e, futuramente, contratar o mesmo objeto.

A obrigatoriedade de que seja observado esse procedimento previamente à divulgação do instrumento convocatório acaba, portanto, por ampliar a cooperação entre os diversos entes da administração, bem como por reduzir os custos inerentes aos tradicionais processos de compras públicas, na medida em que concentra, em um único órgão, os custos operacionais, além de ampliar a economia de escala pela ampliação do quantitativo a ser obtido pelas diferentes administrações envolvidas.

O §1º do mesmo dispositivo autoriza, porém, que a divulgação da intenção de registro de preços seja dispensada nos casos de sua inviabilidade, desde que justificada pelo órgão licitante. Entende-se que tal fundamentação poderia residir, por exemplo, na especificidade do objeto a ser licitado, cujas características técnicas podem revelar-se peculiares à atividade desenvolvida pelo órgão licitante e gestor da ata.

2) Possibilidade de assinatura da ata de registro de preços por meio de certificação digital (artigo 5º, §1º)

O decreto passou a prever, conforme dispõe o §1º do artigo 5º, a possibilidade de assinatura, por certificação digital, da ata de registro de preços pelos licitantes registrados.

Esta inovação torna-se relevante na medida em que confere maior celeridade ao procedimento, tendo em vista a possibilidade de ser alto o quantitativo de licitantes que terão os respectivos preços registrados em ata, o que acaba por dificultar o recolhimento manual de todas as assinaturas necessárias para a validade do documento (sendo que, muitas vezes, encontram-se as empresas registradas nas mais distantes regiões do país), e, consequentemente, por retardar as futuras contratações. A nova regulamentação está, assim, em consonância com o princípio da eficiência administrativa.

Ressalve-se, porém, que o sistema Comprasnet, adotado pelo Governo Federal na operacionalização de suas compras eletrônicas, ainda não está preparado para adoção desse procedimento, de forma que resta apenas aguardar que sejam tomadas as providências necessárias pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), responsável pela edição de normas complementares ao decreto.

3) Dispensa da previsão de dotação orçamentária (artigo 7º, §2º)

O atual decreto passou a dispor, no §2º do artigo 7º, que:

§ 2º Na licitação para registro de preços não é necessário indicar a dotação orçamentária, que somente será exigida para a formalização do contrato ou outro instrumento hábil.

Esta nova previsão, na verdade, nada mais é do que decorrência lógica da própria sistemática do registro de preços, que não obriga a administração a contratar o objeto registrado, havendo um mero registro formal de preços para futuras e eventuais contratações.

Há que se ressalvar, porém, que essa possibilidade amplia ainda mais a incerteza dos potenciais fornecedores quanto à real efetivação das possíveis contratações, já que não se terá conhecimento prévio da existência ou não, futuramente, de disponibilidade orçamentária quando sobrevier a necessidade de fornecimento para a administração. Com isso, pode-se acabar acarretando o desestímulo à ampla participação e, assim, a diminuição da desejável concorrência.

Por essa razão, entende-se recomendável, sempre que possível, que o gestor público preveja antecipadamente a dotação orçamentária que arcará com as despesas de eventuais contratações, não obstante a faculdade conferida pela nova norma.

4) Orientação de que seja contratada uma única empresa para a execução de um mesmo serviço, mesmo quando possível o seu parcelamento em itens (artigo 8º)

O artigo 8º do Decreto 7.892/2013 manteve a previsão do decreto anterior no sentido de que “o órgão gerenciador poderá dividir a quantidade total do item em lotes, quando técnica e economicamente viável, para possibilitar maior competitividade.” Acrescentou, porém, um parágrafo (§ 2º) para estabelecer que deve a administração, no caso de serviços, evitar a contratação, em um mesmo órgão ou entidade, de mais de uma empresa para a execução de um mesmo serviço, em uma mesma localidade. O novo dispositivo veio em boa hora, estando em perfeita consonância com as necessidades que vêm sendo demonstradas crescentemente pela administração, sobretudo nas contratações de serviços de tecnologia da informação, que demandam, muitas vezes, a realização das suas várias etapas pela mesma empresa, seja para fins de responsabilização pelas falhas que venham a surgir ao longo de sua execução, como para a preservação da padronização técnica indispensável para a qualidade de atividades com tais características.

A permissão normativa mitiga, assim, o ônus de justificação do administrador, sobretudo frente aos órgãos de controle, quanto à indivisibilidade técnica do objeto em tais hipóteses.

5) Realização periódica de pesquisa de mercado para comprovação da vantajosidade dos preços registrados (artigo 9º, XI)

Dentre todo o conteúdo que deve ser estabelecido no edital de licitação para registro de preços, foi acrescentada a obrigatoriedade de que seja prevista a “realização periódica de pesquisa de mercado para comprovação da vantajosidade”. Mais uma vez, pode-se considerar a nova disposição como decorrência lógica da sistemática do SRP, tendo em vista que a existência de ata com preços registrados não impede a realização de nova licitação para a contratação do mesmo objeto.

Nesse sentido, pode-se concluir que a periodicidade dessa avaliação poderia corresponder, por exemplo, aos momentos que antecedem cada contratação, de forma que o correspondente instrumento seja firmado tão somente após constatada a economicidade dos preços registrados em comparação com os preços correntes de mercado. Ressalte-se, porém, que estamos desconsiderando, aqui, a possibilidade de negociação com os próprios licitantes registrados para redução dos respectivos preços, tema que será tratado mais à frente.

6) Formação de cadastro de reserva (artigo 10 c/c artigo 11, I)

A nova previsão, disposta no art. 10 do decreto, no sentido de que “Após o encerramento da etapa competitiva, os licitantes poderão reduzir seus preços ao valor da proposta do licitante mais bem classificado”, alterou consideravelmente a redação anterior contida no decreto revogado, que restringia o registro apenas àqueles fornecedores que fossem necessários para que, em função das propostas apresentadas, fosse atingida a quantidade total estimada para o item ou lote.

Na mesma linha dispõe, ainda, o inciso I do artigo 11 do Decreto 7.892/2013, nos seguintes termos: “Artigo 11. Após a homologação da licitação, o registro de preços observará, entre outras, as seguintes condições: I - será incluído, na respectiva ata, o registro dos licitantes que aceitarem cotar os bens ou serviços com preços iguais ao do licitante vencedor na sequência da classificação do certame”.

Esta inovação revela-se mais adequada aos interesses da administração na medida em que, ao ampliar o universo de empresas que podem ser registradas, confere uma maior garantia de que a ata, bem como a vantajosidade do melhor preço ofertado serão preservados, ainda que o licitante inicialmente melhor classificado se recuse a atender a uma futura demanda da administração. Basta, nessa hipótese, recorrer-se aos demais fornecedores registrados (cujos requisitos de habilitação, destaque-se, deverão ser igualmente verificados), na ordem de classificação, compondo-se uma espécie de cadastro de reserva.

Pode-se indagar, apenas, como deve o administrador conduzir este procedimento até que o sistema Comprasnet seja a ele adaptado, tendo em vista que, até o momento, possibilita tão somente que seja declarado vencedor do certame bem como adjudicado o objeto a um único licitante.

7) Vedação ao acréscimo de quantitativo da Ata (artigo 12, §1º)

Em sentido oposto à redação dúbia e controvertida contida no revogado decreto — o qual, de forma não muita clara, possibilitava a realização de alterações na ata com observância das disposições contidas no artigo 65 da Lei 8.666/93 (que regula, na verdade, as alterações passíveis de serem inseridas nos contratos administrativos) —, o recente decreto veda quaisquer acréscimos aos quantitativos fixados de antemão no instrumento convocatório. Ou seja, esgotado o quantitativo total previsto na ata e surgindo nova necessidade de contratação pela administração, deverá ser providenciada a realização de outro procedimento concorrencial, seja instaurando-se uma licitação convencional, seja por meio do próprio registro de preços.

De fato, permitir o acréscimo da quantidade estimada inicialmente representaria violação ao limite determinado no §1º do artigo 65 da Lei 8.666/93. Isso porque possibilitar o aumento do quantitativo previsto tanto em ata quanto nos diversos contratos que lhe sucedem significaria nada mais do que a extrapolação, em muito, do limite legal estabelecido nos percentuais de 50% ou 25%, conforme o caso, do valor inicialmente contratado pela administração.

Consequentemente, dar-se-ia margem para a atuação de administradores de má-fé que, tão logo concluído o procedimento licitatório, providenciam o aumento imediato de quantitativo em benefício da empresa a ser contratada e com a qual já estavam conluiados desde o início e que, por essa razão, pôde disputar com as demais empresas em condições mais vantajosas, ofertando preços inferiores pela sabida ampliação posterior da economia de escala.

O novo dispositivo, portanto, não traz qualquer prejuízo à Administração na medida em que haja, como realmente deve haver, um mínimo de planejamento por parte do gestor público no tocante às suas aquisições. Para mitigar essa dificuldade que pode se revelar na prática, porém, é recomendável que aos valores estimados seja sempre acrescido um quantitativo adicional que sirva como margem de erro, de forma que se possa aproveitar ao máximo (e dentro dos limites legais) o potencial do registro de preços em termos de economia de tempo e recursos públicos.

8) Possibilidade de alteração qualitativa do objeto licitado por meio do SRP (artigo 12, § 3º)

Por outro lado, o §3º do mesmo artigo autoriza a alteração qualitativa do objeto da licitação, fazendo expressa referência ao disposto no artigo 65 da Lei 8.666/93, que autoriza, a esse respeito, a alteração unilateral pela administração quando houver modificação do projeto ou das especificações para melhor adequação técnica aos seus objetivos.

De fato, previsão em sentido contrário engessaria excessivamente a administração, que, muitas vezes, se sujeita a fatores imprevisíveis que podem vir a impactar de forma significativa sobre as condições de execução do objeto inicialmente cogitado.

Há que se atentar, porém, para o entendimento consolidado do TCU no sentido de que os limites previstos nos §§1º e 2º do artigo 65 da Lei de Licitações também se estendem às alterações qualitativas, conforme a interpretação exposta de forma paradigmática pela Corte na Decisão 215/1999 – Plenário. Razão não há, portanto, para afastar essa orientação no que se refere especificamente às alterações qualitativas da ata de registro de preços, aplicando-se, igualmente, os limites de 25% e 50%, conforme o caso.[1]

9) Negociação dos preços registrados (artigo 17)

Também nesse ponto o novo Decreto esclareceu a obscuridade contida na regulamentação anterior. Conjugando-se o disposto nos artigos 17, 18 e 19 do Decreto 7.892/2013 contata-se a possibilidade — ou, até mesmo, o dever — de o administrador negociar com todos os licitantes registrados a redução dos respectivos preços na hipótese de virem a tornar-se superiores aos praticados no mercado por motivo superveniente.

Ou seja, apurados os custos de mercado correntes, cumprirá à administração convocar todos os fornecedores a reduzirem seus preços, de forma que, inevitavelmente, acabará por ter seu registro cancelado aquele que se recusar a adequá-lo. Outra alternativa não há como subsistir em face dos princípios licitatórios da economicidade e da proposta mais vantajosa.

Para tanto, vislumbra-se o aditivo à ata como o instrumento adequado para a formalização da alteração do preço e, eventualmente, do novo cadastro de licitantes registrados que restará formado. Consequentemente, os contratos que venham a ser celebrados posteriormente serão baseados nos novos valores, que não repercutirão, porém, a nosso entender, nos contratos já celebrados, que continuarão regidos pelas respectivas cláusulas de reequilíbrio econômico-financeiro.

Relembre-se que, havendo a recusa de todos os licitantes registrados nessa hipótese, e considerando-se a obrigação estabelecida pelo novo decreto no sentido de que a administração deve comprovar periodicamente a vantajosidade dos preços registrados, impõe-se lhe que providencie, nessa hipótese, novo procedimento de contratação.

10) Limitação às adesões de outros órgãos e entidades denominados “carona” (artigo 22, §4º)

Estamos aqui diante de uma das inovações mais relevantes introduzidas pelo atual decreto. Enquanto o Decreto 3.931/2001 estabelecia tão somente que as contratações adicionais efetuadas pelo “carona” não poderiam exceder, por órgão ou entidade aderente, a cem por cento dos quantitativos registrados na Ata de Registro de Preços (permitindo, portanto, a ampliação desmedida do quantitativo a ser fornecido pelo licitante registrado, em violação ao princípio da economia de escala), a nova norma limita o total de adesões “ao quíntuplo do quantitativo de cada item registrado na ata de registro de preços para o órgão gerenciador e órgãos participantes, independente do número de órgãos não participantes que aderirem.”

Vale observar que essa alteração está em perfeita consonância com a orientação já emanada pelo Tribunal de Contas da União em 2007, no acórdão 1.487 – Plenário, em que, apesar de ter afirmado a viabilidade jurídica da figura do “carona”, determinou ao MPOG que adotasse as medidas necessárias para reavaliar as regras então existentes para esse procedimento, estabelecendo-se limites mais rigorosos para a adesão. Para o tribunal, a ausência de limite total de adesões, existindo apenas restrição por órgão ou entidade, desvirtuava a finalidade do sistema, dando ensejo, inclusive, à sua adoção de má-fé por potenciais fornecedores, que, muitas vezes, enxergam na ata uma oportunidade de multiplicação de negócios a preços mais vantajosos por não ser considerada, inicialmente, a economia de escala obtida ao final.

Entendemos, porém, que a redação contida nesse dispositivo dá abertura para que a Administração, fundamentadamente, fixe no seu instrumento convocatório percentual diverso do quíntuplo do total inicialmente estimado, desde que esse quantitativo não seja excedido. Tal redução pode ser justificada, por exemplo, com base na alegação de que o fornecimento do objeto em questão, em razão de suas específicas características, pode restar comprometido caso haja uma excessiva ampliação de órgãos contratantes do mesmo bem ou serviço.

11) Restrição às adesões realizadas pelos órgãos e entidades da Administração Pública federal (artigo 22, §8º)

Ainda no tocante às adesões de registro de preços, estabelece o decreto em análise que os órgãos e entidades da administração pública federal não poderão aderir a ata gerenciada por órgão ou entidade municipal, distrital ou estadual.

Consideramos ser, realmente, o mais correto o entendimento que está por trás dessa nova disposição, tendo em vista que a adesão a ata de outro órgão da mesma esfera federativa (isto é, no âmbito da União) assegura a idoneidade e o rigor do procedimento que lhe deu origem, pautado na legislação federal vigente.

12) Incidência do decreto revogado sobre as atas celebradas ainda sob sua vigência (artigo 25)

Por fim, importante mencionar que, não obstante a revogação expressa do Decreto 3.931/2001, as atas decorrentes de certames realizados sob sua vigência continuam a ser reguladas pela antiga norma, como decorrência do princípio do tempus regit actum. Como exemplo, podemos citar, nessas hipóteses, a prevalência da regra anterior no que se refere às limitações até então aplicáveis sobre o carona, de forma que às atas anteriores ao atual decreto não será aplicado o limite do quíntuplo.

Diante de todo exposto, podemos concluir que o sistema de registro de preços, instrumento que, após 12 anos de existência, tem sido ampla e crescentemente utilizado pela Administração Pública tendo em vista os seus mais diversos benefícios em termos de eficiência administrativa, adquire, com a nova norma, contornos mais precisos e claros, contribuindo para a melhor e mais uniforme gestão administrativa das contratações públicas.

Como consequência, ganha-se em transparência na condução dos procedimentos envolvidos e, com isso, reduz-se também o risco de distorção — pelas formas mais criativas, como tem revelado a prática — desse relevante instrumento como ferramenta de favorecimento escuso dos interesses do mercado fornecedor.

[1] A esse respeito, vale conferir, porém, a decisão proferida pelo TCU no âmbito do Acórdão 448/2011, que excepcionou a observância do limite legal, autorizando o aumento do quantitativo previsto inicialmente no Contrato para além dos 25% previstos no art. 65 da lei, tendo em vista as circunstâncias peculiares do caso concreto.

Tatiana Alvarenga Gouvêa é advogada, gerente no Departamento Jurídico de Licitações do BNDES

Jéssica Acocella é advogada, coordenadora no Departamento Jurídico de Licitações do BNDES, mestranda em Direito Público na UERJ

Revista Consultor Jurídico, 9 de maio de 2013