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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO NO CENÁRIO INTERNACIONAL

Lançamento por homologação é sucesso internacional

Artigo produzido no âmbito das pesquisas desenvolvidas no NEF/Direito GV. As opiniões emitidas são de responsabilidade exclusiva de seus autores.

O Direito Tributário brasileiro vigente encontra-se fundamentado em uma legislação espalhada em diversos dispositivos legais e infralegais, de hierarquias variadas, e muitas vezes conflitantes entre si. Não bastasse esse emaranhado legislativo, o contribuinte brasileiro é ainda disputado por três competências fiscais, posto que União, estados e municípios brigam por sua parcela da arrecadação, sendo certo que nem sempre coordenam as respectivas exigências que fazem de seus administrados.
Em um cenário fiscal como este, desponta a problemática do Lançamento por Homologação, técnica de arrecadação na qual o contribuinte possui a obrigação de calcular e recolher antecipadamente o valor do tributo devido, sem prévio exame por parte da administração tributária.
Se já no campo da dogmática jurídica são abundantes os questionamentos que gravitam em torno do Lançamento Tributário, gênero que engloba a espécie “Por Homologação”, a sua operacionalização por parte dos contribuintes brasileiros demanda conhecimentos técnicos da legislação e das obrigações acessórias, despertando no cidadão brasileiro o sentimento de que sujeitar-se a tal técnica de arrecadação representa um fardo muito oneroso. O cidadão brasileiro acredita que, sendo o fisco o detentor da expertise tributária, caberia a ele realizar tal tarefa, e ao contribuinte apenas a obrigação de pagar o seu tributo.
Não bastasse a resistência que o brasileiro já manifesta contra essa técnica de arrecadação, o cenário fiscal nacional também cria uma série de empecilhos à sua boa operacionalização, tais como: (i) excesso de legislação; (ii) excesso de obrigações acessórias com elevadas multas em caso de descumprimento; (iii) insegurança jurídica pela incerteza da homologação do tributo pago e possibilidade de retroação de leis consideradas interpretativas e; (iv) complexidade e falta de transparência na legislação e na regulação desses tributos.
Diante dessas dificuldades, é natural que o brasileiro acredite que essa técnica de arrecadação encontra obstáculos à sua plena eficácia e eficiência, constituindo inegável entrave à conquista de um sistema tributário simples e transparente, preferindo por vezes lançamentos de ofício ou por declaração.
Ocorre que a experiência internacional nos aponta para uma tendência diversa, com exemplos de reformas tributárias bem sucedidas que migraram de técnicas de tributação similares aos nossos Lançamentos de Ofício ou por Declaração, para técnicas “Self-Assessment[1]. Pesquisa realizada pela PricewaterhouseCoopers em parceria com o Banco Mundial[2] aponta que a adoção do “Self-assessment” tem representado uma maneira muito eficiente de se alcançar melhores níveis de arrecadação, com o crescimento do percentual de cumprimento voluntário das obrigações fiscais.[3]
A Austrália desponta como um dos países de sucesso em sua recente reforma fiscal, que migrou de uma técnica de arrecadação “Full Income Tax Assessment[4] para o “Self-assessment”, tendo apresentado significativas melhoras na arrecadação de seu tributo equivalente ao nosso Imposto de Renda.
Neste ponto, cabe nos perguntarmos: O que diferencia a Austrália do Brasil? A resposta para tal questionamento, ao contrário do que poderia sugerir uma análise superficial, não está na modificação puramente legislativa. A reforma fiscal australiana é um exemplo de sucesso pelo fato de ter apostado em mudanças institucionais e não em mudanças meramente legislativas.
O fisco australiano empreendeu uma verdadeira força tarefa para auxiliar o contribuinte na atividade arrecadatória, de tal forma que ocorreu no país uma transição de paradigma de atuação da administração fiscal, que migrou do “Paradigma do Crime”[5] para o “Paradigma dos Serviços”[6].
Significa dizer que houve uma modificação na maneira como o fisco lidava com seus contribuintes, deixando de lado a imagem de agente opressor e assumindo o papel de um parceiro da arrecadação. Buscou-se o estímulo ao cumprimento voluntário das obrigações fiscais por parte dos contribuintes, investindo-se menos em políticas severas de punição e mais no desenvolvimento de uma moral tributária. Nada obstante, o fisco australiano conscientizou os seus contribuintes de que o compartilhamento da responsabilidade pela arrecadação seria uma forma de diminuir a sua discricionariedade, bem como as chances para a corrupção. O contribuinte australiano, além de consciente dos benefícios de tal técnica de arrecadação, encontrou um cenário fiscal que viabilizou a utilização do “Self-assessment”.
As conclusões que podemos retirar do exemplo de sucesso da reforma fiscal australiana são: (i) o problema brasileiro não reside na técnica de tributação. O Lançamento por Homologação, ao contrário do que sugere o sentimento coletivo dos contribuintes brasileiros, não representa uma técnica de arrecadação ultrapassada e fadada ao fracasso. Em realidade, o compartilhamento da responsabilidade na arrecadação dá ao contribuinte maior controle na determinação de suas obrigações, representando verdadeiro exercício de sua cidadania; (ii) o que distancia a Austrália do Brasil é a maneira como as autoridades fiscais lidam com os seus contribuintes e; (iii) tanto o “Self-assessment” australiano quanto o Lançamento por Homologação brasileiro possuem a mesma raiz: a confiança. Sem ela, por mais que um Sistema Tributário realize reformas ou adaptações, ele nunca atingirá a sua plena eficácia.
O diferencial da Austrália foi justamente confiar e cooperar com os seus contribuintes, ao contrário do que continua fazendo o fisco brasileiro.

[1] A técnica de tributação Self-assessment designa, em sentido amplo, que o contribuinte é o responsável pelo cálculo e lançamento de seu tributo, sem prévio exame por parte da Autoridade Fiscal, tal como ocorre com o Lançamento por Homologação brasileiro.
[2] Paying Taxes 2011. Pesquisa realizada pela PricewaterhouseCoopers em parceria com o Banco Mundial. Disponível em http://www.pwc.com/gx/en/paying-taxes/pdf/paying-taxes-2011.pdf, com último acesso em 17/11/2013.
[3] Conforme trecho extraído da Pesquisa: “Voluntary Compliance and self-assessment have become a popular way to efficiently administer a country´s tax system. Taxpayers are expected and trusted to determine their own liability under the law and pay the correct amount. With high rates of voluntary compliance, administrative costs are much lower, and so is the burden of compliance actions.”
[4] Técnica que corresponderia ao nosso Lançamento por Declaração
[5] Paradigma de Atuação no qual o Fisco considera o contribuinte como potencial sonegador, em consonância com o pensamento econômico-utilitarista e investe seus esforços em aumento do rigor da fiscalização.
[6] Paradigma de Atuação no qual o Fisco abandona a imagem de agente opressor e torna-se verdadeiro parceiro do contribuinte auxiliando-o na arrecadação, investindo em formas de aumentar o cumprimento voluntário das obrigações fiscais, tais como relacionar o pagamento dos tributos ao retorno de serviços e desenvolvendo uma verdadeira moral tributária.

Disponível em: www.conjur.com.br

STJ causa quiprocó com interpretação equivocada de leasing

 

O professor de Língua Portuguesa Cláudio Moreno, na edição de 23 de novembro de 2013 do jornal Zero Hora, de Porto Alegre, em sua prestigiosa coluna quinzenal Prazer das Palavras, ensinou que o termo quiproquó deriva da expressão latina quid pro quo, que significa literalmente “uma coisa por outra”.
O interessante ministério do mestre gaúcho fez trazer à lembrança o fato de que, cerca de um ano atrás, em 29 de novembro de 2012, quando os então componentes da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça julgaram Recurso Especial qualificado como repetitivo e representativo da controvérsia — ainda não transitado em julgado —, houve o cometimento de um equívoco que pode ser considerado um verdadeiro quiproquó, porquanto fundamentaram na lavratura do respeitável acórdão que o núcleo da operação de leasing financeiro é a concessão e aprovação do financiamento. Eis seu texto:
“12. Recurso Especial parcialmente provido para definir que: (...) a partir da LC 116/03, é aquele onde o serviço é efetivamente prestado, onde a relação é perfectibilizada, assim entendido o local onde se comprove haver unidade econômica ou profissional da instituição financeira com poderes decisórios suficientes à concessão e aprovação do financiamento — núcleo da operação de leasing financeiro e fato gerador do tributo.”
Pode-se ler, nos fundamentos dessa deliberação, que tal raciocínio teve como vertente o entendimento do Supremo Tribunal Federal, manifestado em 2009, no julgamento dos RE 547.245/Itajaí (SC) e 592.905/Caçador (SC), onde definiu que há serviço prestado e por isso existe incidência do ISS na operação de leasing.
É que, na ocasião, afirmou o ministro Eros Grau, relator do caso, em seu voto favorável aos municípios e desfavorável aos bancos: “Daí que a questão é, na verdade, singela. Feita a distinção entre as três modalidades de arrendamento mercantil e observado que no leasing operacional há locação, ao passo que no leasing financeiro e no chamado lease-back há prestação de serviços, inclusive para o disposto no artigo 156, III, da Constituição, dou provimento ao recurso.”
E, no seu voto de revisor, o ministro Joaquim Barbosa ponderou e esclareceu melhor: “O arrendamento mercantil, na modalidade operacional, não se reduz a um contrato de aluguel meramente qualificado pela opção de compra. De modo semelhante, o leasing financeiro não é, pura e simplesmente, operação de financiamento apta a intermediar a cessão do direito de uso de um bem (aluguel). Neste ponto é importante explicitar que parte do objeto de arrendamento mercantil pode abranger a aquisição, por parte do arrendador, de bem escolhido pelo arrendatário e para sua utilização’. A definição, utilizada pelo Banco Central do Brasil, é seguida pela constatação de que o leasing é uma operação com características legais próprias, não se constituindo operação de financiamento (www.bcb.gov.br).”
Pois bem. Comparando-se as duas respeitáveis deliberações em pauta, a do STF com a do STJ, constata-se que este último laborou em lamentável equívoco de interpretação do instituto mundial chamado leasing, caracterizando o quid pro quo — uma coisa por outra — judicial, pois confundiu duas situações absolutamente distintas: operação financeira com operação de financiamento, por ser ululante que o leasing é uma operação financeira — o bem é comprado em nome da arrendadora mercantil e o arrendatário fica apenas com sua posse até acontecer uma operação de compra e venda para a transferência da propriedade — e não uma operação de financiamento — cuja característica intrínseca, segundo o site do Banco Central do Brasil, é o bem ser comprado em nome do financiado).
Sucede, porém, que a questão fulcral a preocupar nada tem a ver com a filigrana jurídica — o quid pro quo — que envolve a tormentosa definição do local onde deve ser recolhido o imposto gerado pela operação de arrendamento mercantil, mas com o tributo que nela passará a incidir após o trânsito em julgado do recurso repetitivo representativo da controvérsia, que deixará de ser o ISS e passará a ser o IOF.
Com efeito, resta claríssimo que, se vier a ser mantido em caráter definitivo o entendimento segundo o qual “o fato gerador do ISS na operação de leasing é a concessão e aprovação do financiamento”, as duas consequências inevitáveis serão:
1. o sujeito ativo do tributo gerado pelas operações de leasing não era e não mais será um ente municipal — nem mesmo o paraíso fiscal, onde toda arrendadora mercantil fincou sede virtual para reduzir sua carga tributária —, mas a União, pois o artigo 2°, I, a, do Decreto 6.306/2007, estabelece que incide o IOF nas operações de crédito realizadas por instituições financeiras;
2. como se sabe que tais organizações nunca recolheram o IOF nas suas operações de leasing, os auditores da Receita Federal, por dever de ofício — e para não serem alvos de processos pelo MPF e TCU — , terão de buscar no Banco Central as informações a respeito de todas operações de “concessão e aprovação de financiamentos de arrendamento mercantil“ havidas nos últimos 5 exercícios e nos meses de 2013 ainda não findo — período da decadência — e realizar os lançamentos para constituição de créditos em favor da União Federal.
Para uma avaliação simples e perfunctória de a quanto poderá chegar o prejuízo das arrendadoras mercantis, se vier a acontecer essa hipotética autuação federal, buscou-se saber, no site da ABEL (Associação Brasileira das Empresas de Leasing), o vulto dos negócios de suas afiliadas sob tal modalidade. Ali foram encontrados estes dados anuais: em 2008, aconteceram 4.276.708 contratações, no valor de R$ 106.668.639.000,00; em 2009, aconteceram 4.811.314 contratações, no valor de R$ 110.330.811.000,00; em 2010, aconteceram 4.277.735 contratações, no valor de R$ 86.318.634.000,00; em 2011, aconteceram 3.318.193 contratações, no valor de R$ 62.368.707.000; e, em 2012, aconteceram 2.320.938 contratações, no valor de R$ 41.275.892.000,00. Não foram vistos os dados do ano em curso.
Somando-se apenas os cinco exercícios cheios — sem 2013 —, verificou-se que as 16.018.588 operações de leasing contratadas no território nacional atingiram o montante de cerca de R$ 245 bilhões. Assim, a média mensal foi de 266 mil operações — cerca de 9 mil por dia — e de R$ 4 bilhões por mês — ou R$ 136 milhões por dia. Dividindo-se o valor das operações diárias pelo número delas, observou-se uma média de R$ 15.000,00 por operação, nos 5.564 municípios brasileiros, o que deu pouco menos de 2 operações por dia em cada um deles.
Considerando-se que a alíquota do IOF para operações de crédito é de 0,38%, a conclusão é a de que as empresas de arrendamento mercantil, caso autuadas pela Receita Federal, terão de recolher ao Tesouro Nacional a expressiva soma de R$ 9.318.271.194,00, fora as multas (75%) e a taxa Selic, acréscimos que sem nenhuma dúvida elevarão tal débito para mais de R$ 20 bilhões.
Diante desta aritmética constatação, não há dúvida de que as instituições financeiras afetadas pelo quiproquó terão de se mobilizar para evitar o trânsito em julgado do acórdão provisoriamente proclamado no recurso especial representativo da controvérsia na forma como foi redigido, pois lhes será muito menor o prejuízo se tiverem de recolher o ISS aos pouco menos de 100 municípios que, estima-se, lhes estão a cobrar judicialmente cerca de R$ 2 bilhões de ISS do que os certos R$ 20 bilhões de IOF que a implacável fiscalização da União Federal não lhes poderá perdoar, pena de prevaricação.
Entretanto, ainda resta uma excelente saída jurisdicional para as arrendadoras mercantis, qual seja, a de que as altas cortes de Brasília venham a afirmar que existe uma abissal diferença entre concessão e aprovação de financiamento e operação de crédito, a primeira gerando o ISS e a segunda, o IOF.
A conferir.