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segunda-feira, 29 de agosto de 2016

ICMS - Não-cumulatividade

Efeitos da isenção e da não incidência do ICMS
Kiyoshi Harada*


Artigo - Estadual - 2016/0512
O princípio da não cumulatividade do ICMS não é absoluto como, aliás, nada é absoluto no mundo do Direito. Ele sofre flexibilizações ante a isenção e a não incidência expressa consoante veremos a seguir.
O inciso II, do § 2º, doart. 155 da CFprescreve:
"§2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(...)
II - a isenção ou não incidência, salvo determinação em contrário da legislação:
a) não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes;
b) acarretará a anulação do crédito relativo às operações anteriores";
Antes de mais nada convém conceituar essas categorias jurídicas referidas no inciso II.
A isenção, como dispensa do pagamento do tributo devido, segundo proclamação da doutrina clássica, apesar do disposto no inciso I, doart. 175 do CTNe da aceitação desse conceito pelo STF, vem sendo duramente criticada pelos defensores da moderna teoria do Direito Tributário, segunda a qual a norma jurídica definidora da isenção implica,ipso facto, restrição da norma jurídica definidora do fato gerador da obrigação tributária. Em outras palavras, as situações abstratamente descritas na hipótese de isenção são aquelas que estão excluídas das situações abstratas descritas na hipótese de incidência tributária.
A não incidência pura é o fato de o objeto não estar abrangido pelo campo de tributação delimitado pela norma jurídica definidora da hipótese de incidência tributária. A não incidência legalmente qualificada equivale excluir determinadas situações descritas do campo de tributação abrangido pela norma que define o fato gerador da obrigação tributária. Dito de outra forma, a não incidência expressa significa exclusão, por expressa determinação legal, de determinadas situações do campo abrangido pela norma definidora da hipótese de incidência tributária. Coincide, pois, com a isenção em sua conceituação dada pelos doutrinadores modernos.
Do exposto, resulta que a isenção e a não incidência surtem o mesmo efeito, isto é, não há surgimento da obrigação tributária excluída de antemão pela norma isentiva ou pela norma de não incidência. Nas duas hipóteses não há ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. Daí o mesmo tratamento dado pelaConstituição Federala ambas as categorias jurídicas.
Na isenção e na não incidência o direito a crédito do ICMS depende do que dispuser a legislação tributária. Não cabe ao contribuinte ou responsável tributário pleitear o direito de crédito contra a lei de cada Estado, invocando o princípio da não cumulatividade, que sofreu restrições de natureza constitucional, como se verifica da transcrição retro do inciso II.
Uma isenção ou uma não incidência expressa, em se tratando de modalidade de imposto não cumulativo de incidência plurifásica, só surtirá benefício ao contribuinte se outorgada no início ou no final da etapa de circulação. Se conferida no meio desse ciclo de comercialização, por exemplo, na terceira etapa, haverá um efeito contrário ao esperado pela isenção. O contribuinte da etapa seguinte não fará jus ao crédito do imposto que simplesmente deixou de ser destacado na nota fiscal e ainda terá que "estornar" os créditos referentes a todas as etapas que antecederam a isenção ou a não incidência. E esse "estorno" é automático, decorrendo da simples não escrituração do crédito na entrada da mercadoria isenta. Melhor explicando, o imposto que deixou de ser destacado na operação isenta, no caso, na terceira etapa do ciclo de comercialização, corresponde àquele que vinha se acumulando desde a primeira operação de circulação de mercadoria até a operação de saída isenta. Não fosse a regra constitucional que determina a anulação do "crédito relativo às operações anteriores" o contribuinte da etapa subsequente à da isenção (quarta etapa) teria direito ao crédito pertinentes às duas primeiras etapas, só deixando de fazer jus ao crédito da operação isenta, no caso, da terceira etapa.
Por isso, escrevendo à luz da ordem constitucional antecedente em que não havia a restrição ao princípio da não cumulatividade afirmávamos:
"Todavia, as dificuldades não cessaram em razão da má compreensão do instituto da isenção, inserido dentro do mecanismo de tributo não cumulativo, o qual exige um tratamento diverso daquele dispensado tradicionalmente. Na verdade, quase todas as isenções não atingiram os objetivos colimados. Se a incidência acarreta o fenômeno da repercussão do imposto, a isenção, ignorando a sistemática do ICM, acarreta repercussão ao inverso, isto é, o suposto beneficiado pela isenção acaba levando um prejuízo econômico, suportando uma carga fiscal maior do que se devido fosse o imposto. É o caso, por exemplo, do Decreto nº 52.604, de 7/1/1971, que lastreado em Convênio firmado, em 15 de dezembro de 1970, na cidade do Rio de Janeiro, concedeu isenção nas saídas de matérias-primas com destino a estabelecimentos de fabricantes, para serem utilizadas na industrialização de rações animais, concentrados e suplementos. Tal isenção veio prejudicar as indústrias de óleos vegetais, que eram e são as tradicionais fornecedoras de matérias-primas (farelos, tortas de soja, de amendoim, de milho etc.). Esses industriais de óleos vegetais em decorrência da isenção se viram obrigadas a estornar in totum o crédito decorrente da aquisição de produtos primários in natura (soja, amendoim, milho etc.), muito embora, parte da industrialização resultasse em produtos tributados (óleos de soja, de amendoim, de milho etc.), sob pena de arcarem com pesadíssimas multas. Passaram-se mais de dois anos até que as autoridades fazendárias se convenceram da inutilidade de tal isenção, aliás, perturbadora do mercado de óleos vegetais, e firmaram um novo Convênio, na cidade do Rio de Janeiro, em 7 de fevereiro de 1973, dispensando-se a exigência do estorno do crédito fiscal relativo às mercadorias entradas para a fabricação de produtos que integrassem rações animais e concentrados. Desta forma, após tantas experiências frustradas, completou-se o ciclo necessário de isenções para o pleno atingimento da finalidade visada, qual seja, o incentivo à agricultura em geral, e, em especial, à avicultura, obtendo-se o barateamento daqueles produtos utilizados no meio rural." (1)
Atualmente, não se pode discutir a exigência de estorno do crédito do ICMS na hipótese de isenção e da não incidência, porque aConstituiçãofez a ressalva quanto ao princípio da não cumulatividade do imposto nestas duas hipóteses.
Notas
(1) Cf. nosso ICM: Direito a Crédito na Isenção e no Diferimento. São Paulo: Resenha Tributária, 1979, p. 35-36.

Leia em:http://www.decisoes.com.br/v29/index.php?fuseaction=home.mostra_artigos_boletins&id_conteudo=339640#ixzz4IkcULDch

terça-feira, 23 de agosto de 2016

Legalidade


texto 1


ISS - Notários

ISS e cartórios - Lei Complementar 116/03

(Plenum Data: 22/08/2016)
* Alexandre Pontieri
Advogado em São Paulo; Pós-Graduado em Direito Tributário pelo CPPG – Centro de
Pesquisas e Pós-Graduação da UniFMU, em São Paulo; Pós-Graduado em Direito Penal
pela ESMP-SP – Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo.

Em recente julgamento da ADIN 3089-2/DF, o Supremo Tribunal Federal decidiu pela constitucionalidade da cobrança de ISS – Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza sobre os serviços notariais e de registro público.
A base legal para esta cobrança está nos itens 21 e 21.01 (serviços de registros públicos, cartorários e notariais) da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº. 116, de 31 de julho de 2003 (clique aqui).
A ANOREG/BR – Associação dos Notários e Registradores do Brasil ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade questionando a cobrança do ISS – Imposto sobre Serviços de qualquer natureza instituída pela Lei Complementar nº. 116/03.
A ADIN 3089-2/DF foi julgada improcedente e foi considerada constitucional a cobrança do ISS sobre os serviços notariais e de registro público.
Apenas o Ministro Relator, Carlos Ayres Britto, entendeu que a referida cobrança é ilegal.
Os demais Ministros do Supremo Tribunal Federal votaram no sentido de que não há ilegalidade na incidência do ISS sobre as atividades notariais e de registro público.
Para o ministro Joaquim Barbosa, por exemplo, "nada impede a cobrança do ISS sobre uma atividade explorada economicamente por particular".
Os serviços notariais e de registro estão dispostos no art. 236 da Constituição Federal (clique aqui):
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. (Regulamentado pela Lei nº. 8.935, de 18/11/1994 - clique aqui)
§ 1º - Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2º - Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. (Regulamentado pela Lei nº. 10.169, de 29/12/2000 -clique aqui)
§ 3º - O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.
O entendimento da jurisprudência dos Tribunais seguia a linha de raciocínio da imunidade recíproca, disposta no art. 150, inciso VI, da Constituição Federal.
As decisões do STJ são anteriores à decisão da ADI 3089-2/DF do STF.
Vejamos:
"Mandado de segurança. ISS. Serviços Cartorários, notariais e de registro público. Natureza pública. ART. 236 DA CF/88. Imunidade recíproca. Emolumentos. Caráter de taxa. Não-incidência.
I - Os serviços cartorários, notariais e de registro público não sofrem a incidência do ISS, porquanto são essencialmente serviços públicos, prestados sob delegação de poder, a teor do art. 236 da CF/88, sendo que a referida tributação fere o princípio da imunidade recíproca, estampada no art. 150, inciso VI, da Carta Magna.
II - Ademais, incabível a cobrança do aludido tributo, sob pena de ocorrência de bitributação, eis que os emolumentos exigidos pelos cartórios servem como contraprestação dos serviços públicos prestados, caracterizando-se como taxa. Precedentes do STF: ADC nº 5 MC/DF, Rel. Min. Nelson Jobim , DJ de 19/9/03 e ADI nº 1.444/PR, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ de 11/4/03.
III - Precedente do STJ: REsp nº 612.780/RO, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 17/10/05.
IV - Recurso especial provido".
(REsp 1012491/GO, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 19.2.2008, DJ 26.3.2008 p. 1)
E ainda:
"Tributário. Mandado de segurança. ISS. serviços cartorários, notariais e de registro público. Natureza pública. Art. 236 da CF/88. Imunidade recíproca. Emolumentos. caráter de taxa.
Não-incidência. Art. 105, Inciso III, alínea "C", DA Carta Magna.
Falta de menção ao repositório oficial e de juntada de cópias autenticadas dos acórdãos paradigmas.
I - No que tange à alínea "c" do art. 105 da CF/88, a recorrente não observou o disposto no art. 255 do RISTJ, para fins de comprovação do dissídio suscitado. É que deixou de juntar certidões ou cópias autenticadas ou sob a declaração de autenticidade do próprio advogado, dos acórdãos paradigmas e tampouco citou o repositório oficial, autorizado ou credenciado em que este se encontra publicado. Aliás, nem mesmo a data de publicação do Diário da Justiça foi indicada.
II - Os serviços cartorários, notariais e de registro público não sofrem a incidência do ISS, porquanto são essencialmente serviços públicos, prestados sob delegação de poder, a teor do art. 236 da CF/88, sendo que a referida tributação fere o princípio da imunidade recíproca, estampada no art. 150, inciso VI, da Carta Magna.
III - Ademais, incabível a cobrança do aludido tributo, sob pena de ocorrência de bitributação, eis que os emolumentos exigidos pelos cartórios servem como contraprestação dos serviços públicos prestados, caracterizando-se como taxa. Precedentes do STF: ADC nº 5 MC/DF, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ de 19/9/03 e ADI nº 1.444/PR, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ de 11/4/03.
IV - Recurso especial conhecido parcialmente e, nesta parte, provido".
(REsp 612.780/RO, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 9.8.2005, DJ 17.10.2005 p. 180)
A Lei Complementar nº. 116, de 31 de julho de 2003, dispõe que o fato gerador do imposto é:
Art. 1o O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.
E ainda: o contribuinte do imposto é o prestador do serviço (Art. 5º). E a base de cálculo do imposto conforme disciplinado no artigo 7º é o preço do serviço.
________________
*Advogado

IPI - FATO GERADOR - MERCADORIA ROUBADA

FONTE: CONJUR


TRANSAÇÃO FRUSTRADA

Não incide IPI sobre mercadoria roubada antes de ser entegue ao comprador


A saída de mercadoria de estabelecimento comercial não configura fato gerador de IPI, pois não há operação mercantil quando as mercadorias são roubadas antes da entrega ao comprador. Esse foi o entendimento firmado pela 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.
No caso, uma empresa de tabaco ajuizou ação objetivando anular auto de infração lavrado por falta de lançamento do IPI relativo à saída de 1.200 caixas de cigarros de sua fábrica, destinadas à exportação, que, todavia, foram roubadas durante o transporte entre São Paulo e Mato Grosso.
A companhia defendeu que inexiste a incidência do IPI se, após a saída dos produtos industrializados destinados ao exterior, ocorrer fato que impeça a ultimação da operação que motivou a saída do produto industrializado, como o furto ou o roubo das mercadorias.
A ação foi inicialmente julgada improcedente pelo juiz de primeira instância, sob o fundamento de que, apesar de não ter sido consumada a exportação, ocorreu o fato gerador descrito na norma (artigo 46, inciso II, do Código Tributário Nacional), ou seja, tendo ocorrido a saída do estabelecimento, torna-se devida a cobrança do IPI.
A decisão de primeiro grau foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ e ES). Os desembargadores também entenderam que a saída da mercadoria do estabelecimento é o fato gerador do IPI e que somente se concretizada a exportação faria jus o contribuinte à imunidade, nos termos do artigo 153, parágrafo 3º, III, da Constituição.
A companhia, inconformada, interpôs Recurso Extraordinário ao STF e Recurso Especial ao STJ. No recurso especial, dentre outros argumentos, defendeu que a efetivação do negócio mercantil é pressuposto da base de cálculo do IPI, o que não ocorreu em razão do roubo das mercadorias.
Em decisão monocrática, o relator do caso, ministro Sérgio Kukina, deu provimento ao recurso especial da companhia. Ele fundamentou a decisão em julgados do STJ no sentido de que não se deve confundir o momento temporal da hipótese de incidência com o fato gerador do tributo, que consiste em operações que transfiram a propriedade ou posse de produtos industrializados. A mera saída do produto do estabelecimento industrial não é fato gerador do IPI, mas apenas o momento temporal da hipótese de incidência, fazendo-se necessária a efetivação da operação mercantil subsequente.
Via Agravo Interno, a Fazenda Nacional buscou a modificação da decisão do relator, defendendo que a simples saída do produto do estabelecimento industrial constitui fato gerador do IPI, de acordo com o Código Tributário Nacional.
Contudo, em sessão colegiada, os ministros da 1ª Turma confirmaram a decisão monocrática do relator. Novamente, os julgadores invocaram precedentes do STJ para votar pelo desprovimento do Agravo Interno da Fazenda Nacional. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
REsp 1.190.231

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Incentivo fiscal já concedido é ato jurídico perfeito e não pode ser reduzido

FONTE: CONJUR

CONTAS À VISTA

Incentivo fiscal já concedido é ato jurídico perfeito e não pode ser reduzido


Imaginemos a seguinte situação: um estado concede incentivos fiscais a uma empresa, o que lhe dá o direito de pagar o ICMS com redução de 40% do que seria devido. Esse benefício foi concedido por prazo certo, correspondente a dez anos, e sob condições que foram e permanecem sendo cumpridas pela empresa. É possível o estado reduzir o percentual desse incentivo fiscal durante esse período?
Isso vem ocorrendo em vários estados brasileiros a partir do Convênio Confaz 42. Esse convênio admitiu que os estados aprovassem leis visando constituir Fundos de Equilíbrio Fiscal compostos de redução de, no mínimo,10% dos incentivos fiscais concedidos. Isso pode ocorrer pela redução “na marra” do que havia sido concedido, ou pela “doação” desse montante de forma “espontânea” pelas empresas. Notícias dão conta de que Pernambuco, Bahia e Ceará já aprovaram leis nesse sentido. Projetos de lei tramitam no Rio de Janeiro, Paraíba, Rio Grande do Norte e Alagoas.
O texto do convênio é um emaranhado de erros, para dizer o mínimo, pois embrulha conceitos básicos de Direito Financeiro, acarreta majoração de carga tributária e cria a mais ampla insegurança e desconfiança no meio empresarial acerca do respeito aos contratos firmados com o poder público e relativamente às normas jurídicas aprovadas. Trata-se de mais uma confusão federativa do Confaz, que ocorre no seio da falência financeira dos estados por causa de má gestão.
Inegavelmente, trata-se de um procedimento inconstitucional, pois viola o artigo 5º, XXXVI da Carta de 1988, que determina o respeito ao ato jurídico perfeito feito entre o estado e a empresa beneficiária dos incentivos fiscais.
Ato jurídico perfeito, consoante a legislação pátria, é aquele “já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou” (parágrafo 1º, artigo 6º, Lei 4657/42), o que é amparado pela norma constitucional constante do artigo 5º, XXXVI, que estabelece o direito fundamental de respeito ao ato jurídico perfeito, à irretroatividade dos efeitos das leis e ao direito adquirido. Tendo os incentivos fiscais sido concedidos segundo a lei vigente à época, alteração normativa não pode alcançá-los, pois se constituem em atos jurídicos perfeitos.
É claro que se tiverem sido descumpridas as condições da concessão, ou se o prazo do benefício findou, a situação se modifica. Porém, caso nada disso tenha ocorrido, o ato jurídico perfeito deve prevalecer sobre a nova lei, até que seus efeitos se esgotem, obedecido o prazo estabelecido.
É milenar o debate sobre a validade das leis no tempo, conhecido no mundo jurídico como teoria da irretroatividade das leis. Rubens Limongi França, em obra clássica sobre o tema[1], expõe sua compreensão em diversas civilizações, atravessando os séculos até a contemporaneidade. Trata-se de um debate que se encontra presente no cotidiano das pessoas, que necessitam saber qual norma vigora em determinado período — o que atinge em especial as normas financeiras e tributárias, pois a produção normativa nessas áreas é avassaladora, quase sempre visando o aumento da receita pública.
Clóvis Bevilacqua escreve com precisão acerca da matéria: “O princípio da não retroatividade das normas legislativas, que tem sido um dos pontos mais obscurecidos pela discussão jurídica, afirma simplesmente, não que a lei se referirá, exclusivamente, aos atos futuros, o que equivaleria apenas a mostrar o acordo existente entre a lógica e a legislação, mas que as consequências dos atos realizados no domínio da lei anterior não devem ser atraídas para o império da lei nova, exceto se estiverem em oposição manifesta aos princípios e regras estabelecidas pela nova ordem jurídica[2].É necessário assegurar que os atos feitos sob o império da lei anterior não sejam atingidos pela nova lei. Aqui se encontra o desdobramento do ato jurídico perfeito com a irretroatividade das leis. O ato jurídico perfeito geradireito adquirido, cujos efeitos não podem ser atingidos por lei nova; logo, essa lei nova, não pode ter nem efeito retroativo nem efeito imediato sobre as relações jurídicas continuadas, com prazo certo de vigência. Tais normas podem ser aplicadas às novas relações jurídicas, mas não às preexistentes.
Na verdade, a discussão sobre ato jurídico perfeito é um desdobramento dasegurança jurídica, que é um dos valores supremos do Estado Democrático de Direito, e em nossa Constituição consta desde seu preâmbulo, quando afirma que os representantes do povo brasileiros, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte, a escreveram visando assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.
Além dessa declaração de princípios, consta no artigo 5º, caput, a garantia da inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, declinando o exercício desses direitos nos mais de 70 incisos em que se desdobra esse artigo.
Não fosse suficiente o rol acima mencionado, o parágrafo 2º do artigo 5º ainda consagra uma fórmula aberta que integra outros direitos e garantias decorrentes do regime e dos princípios adotados pela Constituição, o que é conectado ao caput do artigo 150, ao abrir a seção destinada às limitações ao poder de tributar, mencionando outra fórmula integradora, assim redigida: “Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios...”. Dessa forma, todos os que habitam o território brasileiro, sejam brasileiros ou não, têm consagrada a segurança jurídica no âmbito das relações jusfinanceiras. Essa construção jurídica já foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI 939, em que foi declarada inconstitucional uma emenda constitucional que instituía um imposto denominado Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras (IPMF).
No Estado Democrático de Direito, tratar de segurança jurídica implica em falar de três diferentes funções que cumpre o Direito. A função da certeza, a da estabilidade e a da confiabilidade.
Heleno Torres esclarece esses conceitos, ao mencionar que a certeza é atendida pela legalidade e suas variantes formais e materiais, e, dentre outros aspectos, na “determinação dos critérios para efetividade material dos direitos e garantias fundamentais em matéria tributária”. Estabilidade, para o referido autor, é a função da segurança jurídica que “confere previsibilidade a partir da hierarquia e relações de coordenação e subordinação entre competências, princípios e regras jurídicas, previsibilidade e estabilidade das relações”. E a confiabilidade diz respeito "à confiança dos sujeitos na normalidade do sistema, na estabilidade controlada das relações e expectativas de direitos e obrigações e na garantia de concretização de direitos e liberdades fundamentais na aplicação das leis tributárias"[3].
Assim, é sobre esse substrato de certeza, estabilidade e confiabilidade que deve repousar o Princípio da Segurança Jurídica em um Estado Democrático de Direito, inclusive e em especial nas áreas financeira e tributária. Misabel Derzi menciona que o legislador trabalha no presente, voltado precipuamente para o futuro, motivo pelo qual as normas possuem um efeito prospectivo, e não retroativo. “O legislador está comprometido com o futuro, daí que enuncia, linguisticamente, as normas por meio de conceitos abstratos, mais ou menos determinados, mais ou menos tipificados e em princípios e cláusulas mais ou menos abertos”[4].
O Supremo Tribunal Federal já julgou esse assunto de forma magistral na ADI 493-DF, no qual foi relator o ministro Moreira Alves, cuja ementa ficou assim lavrada: “Se a lei alcançar os efeitos futuros de contratos celebrados anteriormente a ela, será essa lei retroativa (retroatividade mínima) porque vai interferir na causa, que é um ato ou fato ocorrido no passado. O disposto no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal se aplica a toda e qualquer lei infraconstitucional, sem qualquer distinção entre lei de direito público e lei de direito privado, ou entre lei de ordem pública e lei dispositiva. Precedentes do STF”.
Esse é o sentido da norma constitucional, consoante preleciona o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal: “Mesmo na interpretação da vontade constitucional originária, a irretroatividade há de ser a regra, e a retroatividade a exceção. Sempre que for possível, incumbe ao exegeta aplicar o direito positivo, de qualquer nível, sem afetar situações jurídicas já definitivamente constituídas. E mais: não há retroatividade tácita. Um preceito constitucional pode retroagir, mas deverá haver texto expresso nesse sentido”[5].
Enfim, o estado não pode reduzir o valor dos incentivos fiscais anteriormente concedidos, pois deve honrar o compromisso formalizado pelo prazo de sua vigência, sob pena de inconstitucionalidade. Seguindo o exemplo acima, a empresa contou com aquele percentual de 40% de redução de ICMS ao fazer seu projeto econômico, e qualquer modificação nesse percentual, de modo a torná-lo mais oneroso, acarretará umdesequilíbrio financeiro que poderá até mesmo inviabilizar o empreendimento.
Afinal, tais incentivos fiscais foram concedidos por razões de política econômica daquele estado, que abriu mão de percentual de sua própria receita direta, seja para evitar que uma determinada empresa (ou segmento econômico) mudasse sua planta industrial para outro estado, ou para suaatração, ou ainda para estimular determinado setor econômico dentro de suas fronteiras. A esse estado é vedado alterar esse percentual no curso do prazo concedido. Pode fazê-lo ao término do prazo, ou em eventuais renovações. Essa vedação alcança os atos do estado, independentemente de quem seja o governador atual, se de apoio ou de oposição àquele que inicialmente concedeu o incentivo fiscal agora atacado.
É irrelevante se tal benefício foi concedido de forma regular, com aprovação do Confaz, ou sem aprovação desse órgão. A relação aqui abordada é bilateral, e não federativa/plurilateral. Majorar o que foi concedido viola oato jurídico perfeito anteriormente celebrado entre a empresa e o estado, cria um ônus fiscal sem amparo constitucional e rompe com a segurança jurídica, princípio do Estado Democrático de Direito.
O argumento jusfinanceiro de ser para criação de um Fundo de Equilíbrio Fiscal não afasta nenhuma das gravíssimas irregularidades acima apontadas. Aliás, as agrava, pois se trata de uma “nuvem de fumaça jurídica” visando driblar as claríssimas inconstitucionalidades relatadas.
Enfim, também em razão da crise econômica, trata-se de momento errado para aumentar a carga tributária, ainda mais quando feito de forma abusivamente inconstitucional.
As empresas e as associações empresariais — sindicatos, federações e confederações — devem tomar a frente desse problema e enfrentá-lo diretamente, pois, caso contrário, serão obrigadas ao pagamento desse “pedágio do incentivo fiscal”. Para usar uma expressão da minha terra, a qual meu sócio Ricardo Mello sempre repete: os estados estão buscando umabeirada dos incentivos fiscais anteriormente concedidos. Um troco. O fato é que alguns estados já começam a cobrar essa beira, esse pedágio ou trocodos incentivos fiscais já concedidos.
A hora de agir é agora. Não dá para esperar acontecer.

[1] Rubens Limongi França, Direito Intertemporal Brasileiro – Doutrina da Irretroatividade das Leis e do Direito Adquirido, 2ª. ed. SP: Ed. Revista dos Tribunais, 1968.
[2] Clovis Bevilacqua, Teoria Geral do Direito Civil, 2ª ed. RJ: Ed. Rio, 1980, pág. 25.
[3] Heleno Taveira Torres. Direito Constitucional Tributário e Segurança Jurídica. SP: Editora Revista dos Tribunais, 2011, págs. 22 e 23.
[4] Misabel Abreu Machado Derzi, Modificações da Jurisprudência no Direito Tributário. SP: Ed. Noeses, 2009, pág. 415.
[5] Luís Roberto Barroso, Em algum lugar do passado: Segurança Jurídica, Direito Intertemporal e o Novo Código Civil. In: Constituição e Segurança Jurídica – Direito Adquirido, Ato Jurídico Perfeito e Coisa Julgada. Cármen Lúcia Antunes Rocha (Coord.). BH: Ed. Fórum, 2009, 2ª ed., pág. 145.

quinta-feira, 4 de agosto de 2016

DECISÃO TCE PRESCRIÇÃO REPARAÇÃO ERÁRIO - BOA FUNDAMENTAÇÃO

DECISÃO TCE PRESCRIÇÃO REPARAÇÃO ERÁRIO - BOA FUNDAMENTAÇÃO

PIS E COFINS SOBRE BONIFICAÇÕES

Não incidem PIS e Cofins em bonificações pagas por notas de crédito, diz Carf


Fonte: CONJUR

Quando uma empresa recebe recursos financeiros do exterior a título de bonificação, por meio de notas de crédito, esses valores não podem ser classificados como receita e, portanto, não compõem a base de cálculo do PIS e da Cofins.
Assim entendeu o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) ao derrubar auto de infração do Fisco contra uma empresa brasileira que recebeu R$ 168 milhões da matriz na Finlândia para ajustar preços de transferência nas compras de programas de computador e de produtos.
A Receita Federal queria receber cerca de R$ 33 milhões, aplicando PIS e Cofins nos valores recebidos, por entender que não se tratava de redução de custos, e sim de um acréscimo no patrimônio da contribuinte.
A empresa foi autuada, mas recorreu ao Carf sob o argumento de que as notas de crédito tinham o objetivo de ajustar o preço que havia repassado nas importações — como matriz e filial chegam a preços de aquisição diferentes, seguindo a legislação de cada país, a saída foi chegar ao chamado “preço parâmetro”, mais justo para as duas partes.
A 2ª Turma da 4ª Câmara do Carf avaliou que ambos os lados concordaram em contrato que a diferença seria devolvida por meio de notas de crédito. O conselheiro Carlos Augusto Daniel Neto, relator do caso, declarou que esse repasse não pode ser visto nem como venda de bens ou prestação de serviços nem como receitas da atividade ou objeto principal da empresa, mas simples meios financeiros de tornar concretos os ajustes de preços. “O regime de preços de transferência é decorrência de lei, e não da vontade dos contratantes”, afirmou.
Segundo ele, bonificações com vinculação comprovada “têm  sempre  natureza jurídica de desconto, e como tal devem ser tratadas pelo Direito, seja Privado seja Tributário”. O entendimento venceu por maioria de votos.
Para o tributarista Fábio Calcini, sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes e ex-integrante do Carf, “trata-se de relevante decisão ao reconhecer que pagamentos realizados para ajustes no preço (custo de aquisição) a fim de cumprir regras de preço de transferência, não configuram receita”. “Mais do que isso, reconhece a decisão que este ajuste seria uma bonificação, caracterizada com um redutor de custo de aquisição, da mesma forma que um desconto incondicional”, afirma o advogado.
Clique aqui para ler a decisão.
Processo 16561.720170/2013­11 

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Auditor que não cumpre formalidade de autuação comete improbidade

MARGEM PARA PROPINA

Auditor que não cumpre formalidade de autuação comete improbidade

Funcionário público que não cumpre formalidades do auto de infração para ter a chance de modificá-lo posteriormente, caso receba propina, comete ato de improbidade administrativa. Com esse entendimento, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve a condenação de um ex-auditor do trabalho que exigiu propina para não multar uma empresa de União da Vitória (PR) com funcionários irregulares.
Entre as penalidades mantidas pela 4ª Turma estão a perda da função pública, já determinada em processo interno do próprio Ministério do Trabalho, e a suspensão dos direitos políticos por cinco anos.
O caso aconteceu em 2004. Após constatar a existência de empregados sem a carteira de trabalho assinada em uma marcenaria, o então auditor pediu R$ 25 mil para não lavrar o auto de infração. Mesmo depois de o dono recusar-se a pagar, as ameaças continuaram até o fato chegar ao conhecimento da polícia.
Em 2012, o Ministério Público Federal moveu a Ação Civil Pública pedindo a condenação do ex-servidor por improbidade administrativa. Segundo o MPF, a prática de exigir propina fazia parte da rotina do acusado. Já o ex-auditor sustentou não haver provas contra ele.
No primeiro grau, o ex-funcionário público também foi condenado ao pagamento de multa equivalente a 100 vezes a remuneração percebida e ainda ficou proibido de contratar com o Poder Público pelo prazo de três anos. Ele recorreu ao tribunal buscando reformar a decisão.
O relator do caso, juiz federal Loraci Flores de Lima, convocado para atuar no TRF-4, negou o apelo. Segundo ele, além dos depoimentos verossímeis de diversas testemunhas, há registros telefônicos que comprovam as investidas do mesmo.
Em seu voto, Lima citou trecho da sentença que aponta que o ex-auditor deixou de lado a forma do auto de infração ao não proceder notificar formalmente o dono da marcenaria. Com isso, o juiz federal destacou ter ficado claro que o abandono das formalidades tinha o intuito de possibilitar a não autuação do ofendido caso ele pagasse a propina. Além disso, o relator afirmou que as declarações feitas pelo dono e as demais provas são suficientes para o comprovar o crime. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-4.
Processo 5001481-48.2012.4.04.7014